Artistas árabes boicotam Emirados após acordo com Israel

Artistas árabes boicotam Emirados após acordo com Israel

No dia 13 de agosto, os Emirados Árabes Unidos anunciaram a normalização de suas relações com Israel no âmbito de um acordo negociado com os Estados Unidos

Hiba Aslan, da AFP

Refugiados palestinos pisam em imagens do príncipe herdeiro de Abu Dhabi, Mohamed bin Zayed Al Nahyan, do presidente americano, Donald Trump, e do premiê israelense, Benjamin Netanyahu, no Líbano, em 15 de agosto de 2020

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Artistas e intelectuais árabes vêm se desligando há semanas de eventos culturais e prêmios literários financiados pelos Emirados Árabes Unidos, uma forma de protestar contra o acordo para normalizar as relações com Israel e apoiar a causa palestina.

"Considerando que a arte não tem valor se não estiver intimamente relacionada a questões humanitárias e de justiça, estou cancelando minha participação em sua exposição", escreveu o fotógrafo palestino Mohamed Badarne à fundação artística de Sharjah, um dos sete emirados da federação.

No dia 13 de agosto, os Emirados Árabes Unidos anunciaram a normalização de suas relações com Israel no âmbito de um acordo negociado com os Estados Unidos para se tornar o primeiro país do Golfo e o terceiro árabe a estabelecer relações oficiais com o Estado hebreu, depois do Egito e da Jordânia.

Os palestinos denunciaram o pacto e reiteraram que a paz entre palestinos e israelenses deve ser uma etapa anterior a qualquer normalização, e não o contrário.

O ministro da Cultura palestino, Atef Abu Seif, exortou os intelectuais árabes a se posicionarem contra a decisão que "fortalece o inimigo" Israel.

Radicado em Berlim, Mohamed Badarne rapidamente decidiu se retirar da exposição em Sharjah. "Como um povo sob ocupação, temos que nos posicionar contra qualquer coisa que tenha a ver com a reconciliação do ocupante israelense", disse à AFP.

"Pecar"

Nas redes sociais, personalidades do mundo cultural de vários países árabes, como Argélia, Iraque, Omã ou Tunísia, criticaram a posição de Abu Dhabi. Até mesmo artistas dos Emirados levantaram suas vozes contra o acordo. 

"Um dia triste e catastrófico", disse a escritora Dhabiya Khamis quando o pacto foi anunciado. "Não à normalização entre Israel e os Emirados e os países árabes do Golfo! Israel é o inimigo de toda a nação árabe", enfatizou no Facebook.

Nos últimos anos, os Emirados têm investido somas colossais no setor cultural, principalmente com a inauguração, no final de 2017, de uma antena do museu parisiense do Louvre em Abu Dhabi.

Vários prêmios literários são financiados pelo país, como o Prêmio Chefe Zayed, em homenagem ao ex-presidente dos Emirados.

A romancista marroquina Zohra Ramij, concorrendo a este prêmio, anunciou que se retirava "em solidariedade ao povo palestino". O poeta marroquino Mohammed Bennis disse, por sua vez, que estava deixando o comitê organizador do prêmio.

"Seria um pecado ganhar um prêmio" dos Emirados, considerou o escritor palestino Ahmed Abu Salim, que desistiu de concorrer ao Prêmio Internacional de Ficção Árabe (IPAF).

"Sou um intelectual a favor da causa palestina, seja qual for o preço a pagar", disse ele à AFP. 

Apoiado pela fundação London Booker Prize, este prêmio é financiado pela Autoridade de Turismo e Cultura de Abu Dhabi.

Em uma carta, laureados e membros do júri pediram aos responsáveis do IPAF que rejeitassem o financiamento dos Emirados. Um dos signatários do texto, o intelectual palestino Khaled Hroub, disse à AFP que havia se retirado do júri.

Contactado pela AFP, o IPAF recusou-se a comentar o assunto.

Esses boicotes são "uma resposta natural e patriótica dos intelectuais árabes", estima Omar Barghouti, um dos líderes palestinos do movimento BDS (boicote, desinvestimento, sanções).

E quem quiser se beneficiar do acordo entre Israel e os Emirados, "verá suas empresas (...) boicotadas", alertou. 

Este movimento, acusado de antissemitismo por Israel, clama por um boicote econômico, cultural e científico ao Estado hebreu, com vistas a acabar com a ocupação e colonização dos Territórios Palestinos. 

O poeta palestino Ali Mawassi afirma que, quando os Estados decidem normalizar suas relações, a população nem sempre concorda.

A maioria dos artistas egípcios e jordanianos "continua a se recusar a se associar a qualquer coisa que esteja ligada a Israel".

Mas, segundo o poeta, "há muitos artistas que se calam para aproveitar as oportunidades que o dinheiro dos Emirados traz".


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