Equipes do setor de teatro planejam retorno às atividades

Equipes do setor de teatro planejam retorno às atividades

Trabalho não parou completamente durante a pandemia de novo coronavírus

Carlos Correa e Caroline Grüne

Theatro São Pedro resistiu a diversas adversidades ao longo de sua história

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Inaugurado em 1858, o Theatro São Pedro já viu Porto Alegre e o mundo passarem por muita coisa, incluindo duas Guerras Mundiais. Viu também a cidade e o resto do planeta sofrerem, mas vencerem a epidemia da Gripe Espanhola no início do século passado. Viu e resistiu, como vai resistir mais uma vez enquanto testemunha a luta da música, do cinema, de bares e baladas e de outros espaços culturais contra o novo coronavírus.

As janelas fechadas e as luzes apagadas, no entanto, não significam que o trabalho parou. Da mesma forma como acontece em outros teatros da Capital, equipes planejam a retomada das atividades, ainda que sem um prazo determinado, mas que com uma boa dose de otimismo, poderia progressivamente começar a abrir as portas ao público entre julho e agosto.

"Quando vamos realizar um espetáculo com casa cheia, não faço a menor ideia. O que está se começando a falar é que, entre junho e agosto, se possa reabrir com alguma programação, claro dependendo dos decretos. Eu tenho essa esperança e vontade de que os teatros sejam reabertos ali por julho, agosto, seria muito bacana. A cidade precisa começar a ganhar vida", torce Fernando Zugno, coordenador de Artes Cênicas do Teatro Renascença e da Sala Álvaro Moreyra.

Um pouco mais cético, o presidente da Fundação Theatro São Pedro, Antonio Hohlfeldt, prefere esperar a chegada de um velho conhecido dos gaúchos para então opinar: "Não me arrisco a fazer previsão neste momento. Vamos chegar ainda no inverno e aqui, com essa umidade é horrível, não sabemos a consequência. Gostaria de poder pelo menos fechar o ano com algum espetáculo, senão dentro do Theatro, ao menos na Concha Acústica, quem sabe lá por ser ao ar livre".

Redução de público 

Quando houver a reabertura, algumas mudanças já estão pré-definidas, antes mesmo de eventuais decretos das autoridades. A principal delas, nos mesmos moldes do que deve ocorrer nos cinemas, é uma redução da capacidade dos teatros. Ainda se estuda de que forma algumas poltronas serão bloqueadas, mas a tendência é que para cada lugar ocupado, todos aqueles imediatamente aos lados, na frente e atrás, fiquem vagos.

Assim, assegura-se um mínimo de distanciamento na plateia. "Com certeza não vamos voltar como era antes", garante Zugno, descartando por completo a ocupação de todos os 285 lugares do Renascença.

Nas salas em que houver uma segunda sessão no mesmo dia, o tempo entre uma e outra deve aumentar em pelo menos uma hora, de modo a possibilitar um processo de higienização mais cuidadoso. Todos os locais também fazem as contas para custear a distribuição de máscaras, em paralelo a campanhas incentivando que cada espectador leve a sua. Mesmo com custo maior em função do processo de limpeza e de uma bilheteria menor decorrente de capacidade reduzida, um aumento no valor das entradas não deve acontecer a curto prazo, uma vez que, dada a crise econômica que se avizinha, isso só afastaria ainda mais o público, garantem os responsáveis pelos espaços culturais.

Cientes de que o primeiro momento pós-abertura será de movimento mais baixo e que as lotações completas não devem acontecer nos próximos meses, os teatros fazem planos para esse período de transição. E eles podem incluir o ambiente virtual. Na mesa do presidente da Fundação Theatro São Pedro, existe um projeto pronto que se baseia na transmissão online de espetáculos no interior do Theatro. A partir daí, as opções são variadas.

Em um primeiro passo, os espetáculos - que podem ser ao vivo ou gravados - seriam transmitidos pela internet de forma gratuita, desde que tenham patrocínio para pagar artistas e técnicos.

Outra possibilidade é a de que, na sequência, o espectador pague por uma espécie de assinatura para ter acesso às apresentações ao vivo. "É provável que o público ainda tenha desconfiança de retornar ao teatro, então nossa ideia é oferecer programações digitais, garantir espaço para os artistas e transmitir mediante pagamento digital, enquanto se retoma uma certa normalidade", explica Hohlfeldt.

Há também uma sensação de se correr atrás do tempo perdido. Desde o início da pandemia, só no Renascença e na Sala Álvaro Moreyra já foram adiados e/ou cancelados 16 espetáculos de teatro, 11 de música e outros 17 de dança, sem contar outros eventos como o Palco Giratório e o Prêmio Açorianos de Dança e Literatura, por exemplo.

Ainda que haja um prejuízo financeiro decorrente da ausência dos pagamentos por taxa de ocupação - a diária é de R$ 150 no caso do Renascença e R$ 120 na Álvaro Moreyra -, já existe um movimento para que sejam abonadas essas taxas neste período de transição. "Para nós, é mais importante ter a programação retomada do que os recursos em si", explica Zugno.

O que o coordenador de Artes Cênicas não abre mão, no entanto, é da realização do mais tradicional evento de teatro da Capital, o Porto Alegre em Cena. "Cancelar seria muito difícil, tenho uma responsabilidade com a cidade, já temos a verba. Minha maior preocupação seria, não realizando, não pagar milhares de artistas, técnicos, é uma rede gigantesca", diz Zugno.

Para evitar um eventual cancelamento, já existem planos B, C e até D. Previsto inicialmente para setembro, se não for possível a realização nesta data, o plano B prevê o adiamento, mas a realização ainda em 2020, com um formato diferente, de menor duração e com mais espaços contemplados ou o inverso. Nos planos C e D, o festival iria para 2021. De garantido mesmo, só a certeza de que o evento não será online.

"Não tenho essa vontade. Prefiro esperar dois meses e fazer um festival de verdade. Se tem muita gente que vai ter receio de frequentar espaços com convivência de outras pessoas, por outro lado vai ter uma grande parcela da população que vai estar louca para ir para a rua, encontrar os amigos, pela vida em convívio humano. Teatro a gente faz ali, a gente divide a mesma sala com o público. Vou até o final batalhar para fazer um festival que a gente possa se encontrar", prega Zugno.

Crise no setor 

Atrás das cortinas, a crise econômica atingiu em cheio a parcela do ambiente cultural menos conhecida do público, que são os técnicos e todos os demais trabalhadores que fazem os espetáculos acontecer. Enquanto, em última instância, os artistas têm a possibilidade de recorrer a lives ou experiências do tipo, aos técnicos nem este recurso serve, dada a pouca visibilidade.

"A cultura no estado está colapsada, tudo parou, isso abalou todo mundo, está todo mundo apavorado", afirma Fábio Cunha, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos e Diversões do RS (Sated/RS). De acordo com ele, não apenas todos os espetáculos estão parados, como também todo e qualquer tipo de evento que necessita dos profissionais.

"Antes, o técnico fazia formatura, show, evento. Agora não tem mais nada disso. E é uma característica da área técnica trabalhar com diária, com conteúdo. Então sem evento, não tem por onde receber".

Não por acaso, foi lançada uma série de campanhas no intuito de ajudar "a graxa". Uma delas, a #AjudeAGraxaRS, em parceria com a Secretaria Municipal de Cultura (SMC), arrecada doações que são entregues junto ao monumento do Laçador. Outra, a "Faça o Show Continuar", organizada pelo produtor cultural Thiago Piccoli, recebe doações online por meio de uma vakinha e, até o dia 9 de maio, havia arrecadado R$ 24,4 mil, que foram distribuídos entre 238 famílias cadastradas.

"A perspectiva agora, além de ajudar estas famílias que não têm outra fonte de renda, é unir a classe, conscientizar artistas e empresários sobre a precarização do mercado de trabalho, e reunir os trabalhadores em conversas para que se regularizem e cobrem seus direitos perante seus contratantes", afirma Piccoli.
 


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