"Vivemos um tempo em que perdemos muitas referências de orientação", diz Nobel da Literatura 2018

"Vivemos um tempo em que perdemos muitas referências de orientação", diz Nobel da Literatura 2018

Olga Tokarczuk participou da tradicional entrevista coletiva da 71ª Feira do Livro de Frankfurt

AE

Em relação ao papel da literatura diante dessa constante mudança, a polonesa reconheceu que os livros em geral são lentos para espelhar a realidade

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A 71ª Feira do Livro de Frankfurt abre oficialmente quinta, com a apresentação do país homenageado, a Noruega. Mas o clima já ferveu na manhã de terça, quando aconteceu a tradicional entrevista coletiva com o diretor da feira, Jurgen Boos. Ele esteve acompanhado de uma ilustre convidada: a escritora polonesa Olga Tokarczuk, prêmio Nobel de Literatura de 2018. Em seu discurso, ela destacou a dimensão política da escrita em tempos conturbados. "Eu estava em algum lugar sem nome entre Berlim e Bielefeld (noroeste da Alemanha), o que considero significativo porque esse lugar sem nome é uma boa metáfora para o mundo em que vivemos hoje: vivemos um tempo em que perdemos muitas referências de orientação", disse sobre o momento em que recebeu a notícia que seria a premiada pelo Nobel

Em relação ao papel da literatura diante dessa constante mudança, a polonesa reconheceu que os livros em geral são lentos para espelhar a realidade, o que coloca em dúvida, muitas vezes, sua eficácia. "Precisamos de tempo para expressar o que sentimos e o que nos rodeia. Às vezes, me questiono se é possível descrever esse mundo ou se estamos perdidos diante do desaparecimento de parâmetros de referência", comentou a autora. Para ela, ao final, a fé na obra literária prevalece, o que pode, segundo sua opinião, levar a escrita a um nível mais profundo de comunicação, se comparada a outras mídias.

"Na literatura - e penso especialmente no romance -, não se trata apenas de uma troca de informações, mas principalmente na transmissão de uma experiência vital, o que permite um encontro em um plano mais profundo.". Em relação à própria obra, Olga ressaltou sua fé em conseguir uma união das pessoas que sobressaia às "diferenças de orientação étnica, nacional ou sexual". E, quando comentou sobre seu país, a escritora reconheceu sua insatisfação com o resultado das eleições na Polônia, que deram a vitória ao partido atualmente no poder, mas acrescentou que a chegada ao parlamento da esquerda e dos Verdes lhe dá alguma esperança.

Olga foi precedida pelos discursos do diretor da feira, Boos, e do presidente da Associação Alemã de Livrarias, Heinrich Riethmüller. Ambos destacaram a importância do livro como forma de luta política. "Precisamos de autores que denunciem situações ruins, que exercem resistência e estejam dispostos a correr riscos. E precisamos de editores que colecionem esses conteúdos e encontrem formatos apropriados para eles", afirmou Boos.

 

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