Mães em meio à arte

Mães em meio à arte

Enquanto buscam o equilíbrio entre carreira e cuidado com os filhos, mães artistas transformam seu processo criativo a partir da maternidade

Camila Souza*

A artista visual Jocarla Gomes é mãe das gêmeas Maria Eduarda e Maria Cecília

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A chegada de um bebê marca um momento de mudanças. Em meio às alterações na rotina e novas preocupações que se inserem no cotidiano das mães, a área profissional se torna uma das mais afetadas. E para as artistas, a experiência de cuidar de um filho, ainda que traga desafios em dobro, pode dar um novo rumo para as produções. É o caso da ilustradora gaúcha Mauren Veras, 41 anos, mãe de Elvis, de 6 anos, e da Ramona, de 3. Os desenhos, antes feitos por diversão, ganharam a temática da maternidade durante a primeira gravidez, abrindo portas para o universo da ilustração. Em 2018, a artista fez um livro para o filho Elvis e publicou nas redes sociais. A obra intitulada “O Cocô Amigo”, que auxilia com bom humor as crianças em fase de desfralde, viralizou na Internet.

Depois disso, passou a estudar ainda mais as técnicas de ilustração. Ela conta que muitas vezes trabalha acompanhada das crianças e em horários “bem malucos”. “As mães artistas são afetadas pela impossibilidade de se dedicar tanto à profissão. Por outro lado, a gente desenvolve a habilidade de se organizar melhor”, destaca. Mauren também é autora de “A Cidade das Chupetas” (2020), que ajuda no processo de retirada da chupeta. Além das obras autorais, a cartunista recebe convites para ilustrar livros de outros autores e comenta que tem muitas ideias guardadas para as próximas produções. Os desenhos, que surgem das vivências com os filhos, conquistam o público infantil e são recomendados, inclusive, por psicólogos. “É fantástico. Tenho um retorno que alimenta muito a minha vontade de continuar fazendo isso”, afirma.

A ilustradora Mauren Veras é mãe de Elvis e Ramona | Foto: Arquivo Pessoal / CP

Quem também trouxe a maternidade para o universo artístico foi Jocarla Gomes, artista visual de 35 anos, moradora de São Paulo. Mãe das gêmeas Maria Eduarda e Maria Cecília, de 2 anos, suas criações integravam temas maternos desde o início da gestação. Quando voltou ao trabalho como artista educadora em uma exposição, se deparou com um desafio: a invisibilidade das mães no meio artístico. Para ela, as mulheres com filhos não conseguem ter uma participação ativa em eventos e cursos. “Me senti deslocada. Se você não frequenta esse meio, você não existe”, ressalta. Pensando nisso, criou, na mesma exposição, a visita “Puerpério”, própria para quem estava acompanhada dos filhos pequenos.

Entre as lições que aprendeu, Jocarla, que também é poeta e performer, encontrou o equilíbrio entre carreira e maternidade. “Precisamos achar estratégias de estar nesses lugares e com os nossos filhos, se não, fica uma romantização de que somos mães só em casa”, explica. Acredita que a arte é uma forma de expressar tudo o que sobrecarrega e a madrugada é o momento de produção artística, alternando entre criar, ouvir um choro, amamentar e voltar para o trabalho. “É tudo muito fragmentado”, comenta. E relembra de algumas lives que precisou fazer com as gêmeas junto. “Elas ocuparam o ateliê, foi uma loucura, mas era a possibilidade para estarem comigo”, diz. Jocarla também participa de projetos que conectam mães artistas no país, entre eles o Coletiva Mãe Artista.

A artista visual Luisa Callegari, 26 anos, também de São Paulo, já fazia trabalhos relacionados à maternidade antes mesmo de viver a experiência. Depois do nascimento da filha Aurora, 4 anos, a temática se tornou ainda mais presente. Por fazer criações em que o corpo é exposto, um dos desafios é ter obras censuradas por algoritmos em mostras virtuais, como o vídeo “Leite”, em que ela aparece amamentando a filha. “É um trabalho muito difícil de existir”, comenta. A artista participa de diversas exposições voltadas à maternidade, entre elas a “Me, We, Women”, do Museum of Motherhood (Flórida). Mas, de acordo com ela, as produções não ganham espaço em projetos que não são focados nesse tema. “É difícil colocar um trabalho que fale sobre maternidade dentro de uma exposição só de arte contemporânea”, explica. Junto com a curadora Bianca Bernardo, Luisa criou o puerperium.arte, que conta com uma exposição virtual de trabalhos relacionados à maternidade.

A artista visual Luisa Callegari é mãe de Aurora | Foto: João Rios / Divulgação / CP

Já a gaúcha Lola Carvalho, 45, buscou entender os sentimentos e transformações durante a gravidez através da escrita. Os textos, inicialmente publicados em um blog, alcançaram pessoas que a incentivaram a seguir compartilhando suas histórias. A escritora, mãe de Francisco, de 11 anos, e Caetano, de 6, reuniu suas experiências no livro “Mãe Sem Limite - relatos de uma mãe totalmente normal”. A partir do lançamento da obra, em 2019, surgiram convites para participar de coletâneas literárias e escrever colunas em sites sobre o tema. Em seus textos, busca encorajar as mulheres afirmando que a maternidade tem muitos desafios, mas que cada mãe consegue ser a melhor dentro das suas possibilidades. “A gente precisa se cobrar menos e se culpar menos, ter mais autocompaixão para lidar com esses desafios, porque todas nós estamos aprendendo”, afirma. Ser mãe e artista é uma experiência cheia de desafios. Transformando suas vivências em arte, estas artistas se tornam exemplos para mães que se sentem representadas e acolhidas em suas criações.

A escritora Lola Carvalho é mãe de Francisco e Caetano | Foto: Charles Dias / Divulgação / CP

*Sob supervisão do editor Marcos Santuario 


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