Para jogar luz na sombra da distância

Para jogar luz na sombra da distância

O novo disco de Maria Bethânia, ‘Noturno’, é lançado nesta sexta-feira no país

Luiz Gonzaga Lopes

Maria Bethânia revela: “Eu estou com saudade das pessoas, do contato com o público, de falar o que penso e o que sinto”

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Saudade é aquela palavra que Césaria Évora já evocou em canção (“Sodade”) e que Maria Bethânia também eternizou com seu encantar interpretante da composição de Vinicius de Moraes e Toquinho, “Saudade”. É palavra portuguesa com certeza, como Fernando Pessoa. Pois o maior modo da intérprete basilar da música brasileira tirar a saudade que sente do seu público do peito e ecoar por este Brasil é com um novo disco. Ele está entre nós, pensado nos mínimos detalhes. “Noturno”, com 12 faixas, será lançado hoje de forma física e plataformas digitais pela Biscoito Fino. “Eu estou com saudade das pessoas, do contato com o público, de falar o que penso e o que sinto”, revela Bethânia em entrevista por fone. 
Cada uma das 11 canções, menos poema, tem uma dedicatória certeira a um coletivo. A primeira faixa, “Bar de Noite” (Bidu Reis/Haroldo Barbosa), do repertório sessentista de Nora Ney, é dedicada a ela mesmo e seus recôncavos. “Para fazer cada interpretação de uma canção que escolho, eu penso algo dramatúrgico, da escola que venho, de Fauzi Arap e Flávio Império. As dedicatórias têm a ver com a saudade, com este isolamento que não acaba, com tantas impossibilidades e perdas e com a vontade de me conectar com o público”, sentencia. 
E a escolha das composições passou por este Noturno, por este jogo de luz e sombra, que flerta com a esperança, a fé, o amor, alegria, amizade, mas que fala da solidão, da tristeza, do abandono. Além dos compositores que já permeiam a sua obra, como Adriana Calcanhotto, Chico César e Roque Ferreira, alguns mais jovens se imantam ao magnetismo bethânico, com Zeca Velloso (sobrinho), Tim Bernardes (Terno) e Xande de Pilares. “Sou atraída pelas pessoas mais jovens, que estão começando a compor. O Zeca trouxe o exílio, o sertão. O Tim me apresentou o amor que sofre com a pandemia e o Xande, o dia a dia do carioca”, comenta. As músicas citadas são “Sopro do Fole” (Zeca), “Prudência” (Tim) e “Cria da Comunidade”, com participação de Xande (voz e cavaquinho). 
A fé que sempre acompanha Bethânia aparece mais translúcida em “Lapa Santa” (Paulo Dafilin/Roque Ferreira) e “De Onde eu Vim”. “Eu tenho uma fé muito forte. Me arrepio só de falar. Acho que sou um milagre. Com as dificuldades naturais que a vida impôs, eu consigo manter o meu ofício, com confiança para falar à mente e ao coração das pessoas. Meu espírito se alegra e não sossega”, ressalta. 
Das canções, Bethânia precisa destacar “2 de Junho”, de autoria de Adriana Calcanhotto, e que descreve a morte do menino Miguel em junho de 2020. “Do nono andar/ 59 segundos/ Antes de sua mãe voltar/ O destino de Ícaro/ O sangue de preto/ As asas de ar”. “É uma crônica muito dura, crua, com grande precisão poética, quase carne viva, ainda mais com o acréscimo das quatro guitarras de Pedro Sá.” 
Sobre a capa do disco que recebeu comentários por ser mais simples que as dezenas de anteriores, Bethânia rebate que capas de disco não se comentam. “Ela é tão simples, tão nobre, o nome do disco e minha assinatura.”. Dentro do encarte, estão bordados da Abelha Rainha. “Adoro mexer em coisas com a mão. Tenho talento para isso. Faço entalhes em madeira, joias, gosto de bordar e de cozinhar”, abre-se em tom confessional. Sobre os projetos atuais além do disco, diz que está estudando muito. “Tenho estudado para programas que estou apresentando para a Rádio Batuta, do Instituto Moreira Salles, com textos e canções minhas. É tudo feito solitariamente. Já tenho três programas prontos, faltam gravar três”, finaliza a Maricotinha, confessando estar com saudades dos amigos gaúchos, do público local tão devoto a ela. Ao que respondemos de pronto. A saudade é nossa. 


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