Veto à Lei Aldir Blanc causa apreensão

Veto à Lei Aldir Blanc causa apreensão

Lei emergencial de apoio à comunidade artística é alvo de críticas após alterações, no último dia 29, pelo Governo Federal

Vera Pinto

O setor cultural foi um dos primeiros a fechar e deve ser um dos últimos a ser reaberto; até lá, teatros como o Renascença permanecem vazios

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Após uma árdua articulação da cadeia artística, junto a autoridades e políticos para sua aprovação, a Lei Aldir Blanc foi sancionada na última segunda, pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, um dia antes do término do prazo. Mas o veto nas datas-limite de execução do projeto de lei 1075, chamado Lei de Emergência Cultural, e que vai ajudar artistas, produtores, técnicos e espaços culturais, pertencentes a um dos setores mais afetados pela pandemia do novo coronavírus, suscitou fortes críticas. Aprovado no Congresso Nacional no dia 26 de maio e uma semana depois, por unanimidade, no Senado, tem como uma de suas proposições, o repasse de R$ 600 aos profissionais do setor e de R$ 3 mil a R$ 10 mil a espaços culturais, micro e pequenas empresas culturais, cooperativas, instituições e organizações culturais comunitárias que tiveram suas atividades interrompidas devido às medidas de isolamento. Encabeçada pelas deputadas Jandira Feghali (PCdoB) e Benedita da Silva (PT), a lei auxiliará o trabalhador que atuou na área artística nos últimos dois anos e que teve, em 2018, rendimentos de até R$ 28,5 mil.
Para a líder do PSOL na Câmara dos Deputados, Fernanda Melchionna, a Lei Aldir Blanc é uma conquista dos artistas do nosso país, mas a alteração no prazo, originalmente de até 15 dias na liberação do montante de R$ 3 bilhões para que os estados e municípios realizem os editais previstos na lei é digna de crítica. Para o RS são previstos R$ 69 milhões e Porto Alegre, R$ 9,2 milhões, segundo a parlamentar. Mas Bolsonaro editou uma medida provisória definindo que esses prazos serão estabelecidos por regulamentação do governo, retirando o prazo de pagamento fixado e fixando a devolução, caso não sejam usados em até seis meses. “O que nos preocupa nesse veto é justamente a ausência da previsão imediata de liberação desses recursos. A cadeia produtiva das artes foi um dos primeiros setores a serem impactados pela pandemia ao ter o cancelamento dos seus espetáculos, artistas passando fome, equipamentos culturais históricos sendo fechados e indo à falência. A legislação, que foi construída a muitas mãos, e do qual sou uma das coautoras, ficou até o último dia para veto e sanção na mesa do presidente. Nós lutaremos pela derrubada desse veto e chamamos todos para que se mobilizem nessa derrubada", afirma.
ATORES - Presidente do Sated-RS, Fábio Cunha destaca que a posição da entidade é de luta ainda, não só em relação ao “pague já” como na luta com Estrado e Municípios. “Estamos propondo ao Estado, na regulamentação da lei, uma comissão estadual e comissões municipais, onde esteja todo mundo, incluindo conselho, colegiados e sociedade civil organizada. O RS tem 497 municípios, sendo que somente 33 estão no Sistema Nacional de Cultura, e muitos deles proíbem artista de rua e circo. Como agora, do nada, vão querer dizer pra nós que vão querer fazer a lei?”, questiona. O gestor comemora a vitória histórica da classe artística, que conseguiu, a muito custo e apesar das adversidades, a verba que há anos estava parada no Fundo Nacional de Cultura. Ele menciona que estão parados em virtude da pandemia grandes empresas de som, com 300 funcionários; circos – só em Porto Alegre são quatro lonas, cada uma empregando 200 funcionários; além do pessoal do sertanejo, dos CTG’s e de parques, como o Beto Carrero, que pressionaram para que a lei saísse. “Temos a preocupação de diálogo com a Secretaria de Cultura do Estado (Sedac), que está muito difícil, os colegiados não estão conseguindo conversar em relação à Lei Aldir Blanc”, declara. Quanto aos espaços, a serem contemplados, ele frisa que se enquadra apenas em espaços privados. “Espaço em terreno público não pode ganhar, cidades não podem reformar o coreto da praça, nem reformar o banheiro do teatro. Não é pra fazer campanha e nem reforma de equipamentos públicos”, conclui. 
MOBILIZAÇÃO - “Com certeza a sanção da lei é uma vitória e a questão do veto no prazo já era, de certa forma, previsto. A mobilização não deve parar, para que o pagamento seja efetivamente feito. É preciso que a lei seja estabelecida e o dinheiro vá para estados e municípios”, diz Daniela Strack, presidente da APTC-RS. O órgão vem trabalhando, em parceria com o Colegiado do Audiovisual e Iecine, para que a maior parte dos recursos seja usada como renda emergencial aos trabalhadores, que em sua maioria não se enquadraram nos requisitos do auxílio emergencial do governo federal. Neste sentido, destaca a importância de editais para a criação de produtos na pandemia, que contemplem também os que atuam nos bastidores e parte técnica.
Integrante da Articulação de Trabalhadores das Artes da Cena pela Democracia e Liberdade (Atac) e Fórum Permanente pela Cultura e Ói Nóis, Tânia Farias reconhece a trajetória da lei até aqui e o que isto significa. “Existe um grande mérito neste processo todo, todas as conquistas do passo-a-passo, construído democraticamente com tanto diálogo e negociação, que conseguiu juntar os diferentes em torno de um bem maior. Penso que temos muito a celebrar, no entanto, há uma preocupação quanto ao veto, que na minha percepção é algo grave, que deve nos deixar atentos e prontos para seguirmos na luta. Precisamos que a regulamentação aconteça muito rapidamente, senão a lei perde seu caráter emergencial. E mais do que o veto, há uma alteração no texto da lei. Quando se fala que a regulamentação será feita pelo Governo, tanto da ótica da forma como dos prazos, significa pra mim, em outras palavras, que estamos na mão do Governo (federal), que fará o que lhe for “bom”. A atriz do grupo Ói Nóis Aqui Traveiz cita a dificuldade de trabalhadores das artes, em todo o Brasil, que estão perdendo casas, com dificuldade na subsistência e sem recursos de qualquer lado. “O prazo era a garantia de que as coisas fossem garantidas de forma rápida. Temos que manter a mobilização mais forte do que nunca, porque pode o prazo se alongar a tal ponto, que não justificaria a própria lei”, conclui.
“Esta legislação, aprovada por acordo de lideranças, é resultado de uma construção coletiva e atenderá organizações, fazedores de cultura, profissionais e artistas, que atualmente têm suas atividades interrompidas pela pandemia. Nossa meta é a promoção - já em curso, por meio de pactuação junto à Famurs e Codic - de uma grande articulação junto aos 497 municípios gaúchos e sociedade civil, visando contemplar, muito especialmente, os invisíveis, excluídos das tradicionais políticas públicas de cultura”, manifestou-se a secretária de Cultura do Estado, Beatriz Araújo, bastante engajada na luta para que a Lei Emergencial fosse aprovada, em sucessivas articulações entre representantes dos artistas e parlamentares de diferentes níveis.
“A Lei Aldir Blanc chega em um momento crítico e será de extrema importância para o setor. A Secretaria Municipal da Cultura já está realizando reuniões com a equipe de coordenadores de forma a atender às normas da Lei, nos seus principais quesitos, que são: renda emergencial para trabalhadores da Cultura, recurso destinado para os espaços artísticos e a parte destinada a editais públicos. Temos muito trabalho pela frente para estarmos em alinhamento com as três esferas de governo: Federal, Estadual e Municipal”, manifestou-se a coordenadora de Projetos e Captação de Recursos da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre, Adriana Mentz Martins.

 


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