A criminalização da tentativa: necessidade ou excesso?

A criminalização da tentativa: necessidade ou excesso?

Por Guilherme Moraes e André Vasques, sócios-fundadores da Moraes Vasques Advogados Associados

Correio do Povo

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A Lei 14.197/2021 trouxe ao Código Penal Brasileiro os artigos 359-L e 359-M, ampliando a discussão sobre a criminalização da tentativa em crimes como a abolição violenta do Estado Democrático de Direito e o Golpe de Estado. Essa medida, que inova ao prever sanções para atos tentados, suscita debates sobre sua necessidade e os impactos no ordenamento jurídico brasileiro. No direito penal brasileiro, é regra punir crimes consumados, reservando exceções para atos preparatórios concretos. A inclusão da tentativa em crimes contra o Estado Democrático de Direito busca antecipar a proteção de bens jurídicos inestimáveis, como a democracia e a legitimidade dos Poderes. A justificativa é clara: esperar a consumação de tais crimes pode resultar em danos irreversíveis e impossibilidade de punições. Entretanto, a criminalização da tentativa apresenta desafios cruciais, como distinguir entre atos preparatórios e tentativas reais. E como garantir que essa antecipação não viole princípios como proporcionalidade, ampla defesa e liberdade de manifestação?

Embora a punição da tentativa tenha como objetivo prevenir ataques ao regime democrático, sua aplicação prática é complexa. Entre os principais desafios, estão a prova da tentativa, a sobrecarga do sistema judicial e a insegurança jurídica.

Ainda que compreensível, a criminalização da tentativa exige uma aplicação cuidadosa para não se transformar em um mecanismo de repressão desproporcional. Juízes, advogados e promotores devem atuar com prudência, assegurando que a prevenção de crimes não comprometa direitos individuais e pilares democráticos. O desafio é buscar o ponto de equilíbrio entre proteção e liberdade. Em um cenário de polarização crescente, é fundamental que a legislação proteja a democracia sem abrir precedentes para violações de direitos fundamentais.

É de notório conhecimento que os artigos 359-L e 359-M representam um avanço na proteção do Estado Democrático de Direito, mas demandam critérios objetivos para evitar excessos e garantir segurança jurídica. O debate contínuo sobre sua aplicação é essencial para preservar a democracia e os valores fundamentais do ordenamento jurídico. Concluímos, registrando a nossa convicção de que, somente com um sistema que alie prevenção e respeito aos direitos, será possível enfrentar as ameaças contemporâneas sem sacrificar os princípios que sustentam o Estado de Direito.


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