MP 1230/24: água com açúcar para paciente na UTI
Por Eugênio Hainzenreder Jr.*
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Ainda não é possível dimensionar as consequências econômicas da tragédia que assolou o Rio Grande do Sul. Em um cenário jamais imaginado, empresas pedem socorro ao governo federal no anseio de recuperar seus negócios e manter seus empregados. Uma triste e dura realidade que ainda não foi compreendida por muitos daqueles que vivem em Brasília e fazem questão de dar visibilidade apenas ao marketing político do “auxílio ao RS”, ao invés de proporcionar soluções que realmente auxiliem os empresários a se reerguerem, a fim de manter os postos de trabalho e a renda dos empregados.
Veja-se que a Lei 14.437/22 autoriza o poder executivo a instituir o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda para o enfrentamento das consequências sociais e econômicas de estado de calamidade pública. Por meio do referido programa, são disponibilizadas medidas importantes diante do estado de calamidade pública, como a instituição do pagamento do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego aos empregados — custeado pela União —, a redução proporcional da jornada de trabalho e do salário e, ainda, a possibilidade da suspensão temporária do contrato de trabalho. Trata-se de mecanismo efetivo para dar fôlego para que os empresários mantenham os empregos e para que os trabalhadores recebam o benefício emergencial diante da redução de jornada ou da suspensão do contrato. Foi o que aconteceu na pandemia. No entanto, até o momento, o Poder Executivo não regulamentou nenhuma destas medidas.
O que temos até agora são “remédios paliativos”, na linha do que foi publicado na última sexta-feira (07) por meio da Medida Provisória 1.230/24. Esta nova norma assinada pelo presidente Lula institui um “Apoio Financeiro” consistente em duas parcelas no valor de R$ 1.412,00 cada, nos meses de julho e agosto/24, que serão pagas diretamente aos trabalhadores com vínculo formal de emprego (CLT) e também aos estagiários das empresas que aderirem ao auxílio por meio do cadastro dos seus CNPJs. Não poderão se cadastrar no programa as empresas em débito com o sistema da seguridade social. Este benefício terá natureza de auxílio e será possibilitado apenas para as empresas cujos estabelecimentos se localizarem em áreas efetivamente atingidas pelas chuvas, conforme já definido geograficamente.
Em contrapartida, os empregadores que aderirem ao programa não poderão despedir os trabalhadores beneficiados por um período de dois meses subsequentes aos meses de pagamento do Apoio Financeiro, bem como terão que manter o valor equivalente à última remuneração mensal recebida nos dois meses de recebimento das parcelas e nos dois meses subsequentes. Além disso, as empresas deverão manter as obrigações trabalhistas e previdenciárias devidas aos empregados, com base no valor da última remuneração, bem como deverão apresentar declaração de redução do faturamento e da capacidade de operação do estabelecimento em decorrência dos eventos climáticos, que impossibilite o cumprimento de suas obrigações de pagamento da folha salarial. Serão elegíveis ao benefício também os empregados domésticos.
A nova MP é muito bem-vinda, porém representa alternativas muito aquém daquelas anunciadas na pandemia, que, como já referido, possibilitaram a suspensão dos contratos de trabalho com a garantia aos trabalhadores do recebimento do benefício emergencial suportado pelo governo. Repita-se que tais ferramentas já estão previstas em lei e, portanto, à disposição do governo, bastando a regulamentação pelo Poder Executivo.
Enfim, o novo “Apoio Financeiro” não é suficiente para as empresas e trabalhadores que perderam absolutamente tudo com as chuvas e não conseguem sequer operar. É como se o paciente grave, ao chegar numa emergência, fosse tratado apenas com água com açúcar em vez da profilaxia adequada. Milhares de negócios e empregos estão na UTI – e precisam ser tratados com a urgência devida, com condições para a reconstrução esperada. Assim como estão, as medidas não produzem efeitos ao caso que já é crônico.
*: Advogado Trabalhista e sócio-diretor do RMMG Advogados. Professor da PUCRS