Escritório de advocacia para mulheres completa três anos em Porto Alegre

Escritório de advocacia para mulheres completa três anos em Porto Alegre

Gabriela Souza atende causas femininas na capital gaúcha 

Lou Cardoso

Gabriela Souza comanda um escritório de advocacia para mulheres há três anos

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Como já dito há dois anos, ser mulher não é uma tarefa fácil. Ou melhor, nunca foi fácil. Mesmo no século 21, onde as mulheres já avançaram em muitas questões, ainda estamos longe de ter equidade de gênero. O machismo, misoginia e violências em suas diversas esferas são alguns dos obstáculos. E estes temas têm sido recorrentes na rotina do escritório Gabriela Souza - Advocacia para Mulheres que completa, neste domingo, três anos de atividades em Porto Alegre. 

A advogada Gabriela Souza faz questão de comemorar a trajetória profissional traçada até aqui, na qual também se reconheceu como empresária. "No início, a gente tinha a expectativa da mudança, hoje consigo ver a mudança. Vejo as primeiras mulheres que se divorciaram, que me pediram ajuda e medida protetiva. Chegaram fragilizadas e hoje vejo elas tirando férias, saindo. Elas cresceram até em centímetros. Então vejo que, realmente, faz muito sentido ter um escritório de advocacia para mulheres", contou. 

Gabriela alerta, contudo, que as mulheres ainda sentem medo do Direito. Ao contrário dos homens, que segundo ela, nasceram beneficiados pela herança cultural do patriarcado. "Eles nascem sabendo que todas as suas gerações masculinas tinham direito. Nós mulheres temos direitos há pouco mais de 200 anos no mundo. Nós éramos consideradas propriedades, isso causa uma marca social", avalia. 

Por isso, a advogada reforça a mensagem que acompanha o escritório: "Conhecimento jurídico empodera as mulheres". "Nos últimos 20 anos, os direitos das mulheres avançaram como não avançaram nos dois últimos séculos. A gente está em um começo de transformação, em um momento de conquistar direitos e não vamos retroceder. Eu acredito que, nos próximos 200 anos, é que vai chegar a equidade de gênero, vamos ter uma mudança ainda mais acentuada e positiva."  

Feminicídio aumenta no RS

A quarentena, em que se prevê o isolamento social como uma medida de prevenção contra o novo coronavírus, pode ser um período perigoso as mulheres. De acordo com o balanço divulgado pela Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, os crimes de feminicídios subiram 66,7% em abril em comparação com o mesmo mês do ano passado no Estado. Em 2019, seis mulheres foram assassinadas, enquanto que, este ano, o número foi de dez. 

Na live em que apresentou os dados criminais do Estado, o secretário de Segurança Pública e vice-governador do RS, Ranolfo Vieira Júnior, relatou que o aumento do número de feminicídio não está relacionado com o distanciamento social. Segundo ele, os números já estavam crescendo desde o último ano. "Nos meses de janeiro e fevereiro, quando não se falava em distanciamento social, foram os dois meses com grande avanço nesta prática criminosa", apontou.  Enquanto que em janeiro de 2019, foram registrados 3 feminicídios, este ano o número saltou para 10. Já em fevereiro do ano passado, ocorreu apenas 1, e em 2020, foram 5 mortes. 

Fonte: Secretaria de Segurança Pública 

Para a advogada, os números do aumento do feminicídio são apenas a ponta do iceberg. "As violências são uma escala. Começa com uma violência mais psicológica, uma violência verbal. A gente precisa entender que existe uma epidemia de violência doméstica e ela é potencializada. A gente precisa cuidar das nossas mulheres", alertou.

Gabriela acredita que as consequências que a pandemia trouxeram para o Brasil - dificuldades financeiras, perda do emprego, consumo de álcool - podem gerar estresse e, com isso, terminar em uma agressão. Por isso, a advogada reforça que as vítimas peçam ajuda. "Se você é vítima de violência na quarentena, você pode buscar ajuda sim. A Rede está trabalhando em home office, a delegacia da mulher está funcionando. Se você tiver um lugar para ir, solicite", disse. 

Apesar de defender as suas clientes de agressores e ex-companheiros abusivos, a advogada também virou alvo de ódio. Ela menciona que já recebeu ligações de ex-maridos, ameaças de mortes, xingamentos na internet e chegou a contratar um segurança particular, durante um mês, para poder sair de casa para trabalhar. "É muito dolorido. Isso é uma coisa que a estrutura patriarcal permite que isso aconteça comigo, porque não é com a Gabriela, é com a advogada que decidi ser. Se fosse um escritório para defender os direitos dos homens incomodaria tanto?", questionou. 

Vínculo online

O escritório de Gabriela, como outros serviços em Porto Alegre, está com as portas fechadas por conta da pandemia do coronavírus. Mesmo que tenha criado o lugar para ser um ambiente acolhedor, a advogada salientou que segue com os atendimentos via online. "Inicialmente eu fiquei muito triste. Como vou defender uma mulher que não está em um lugar seguro? Mas eu criei um outro vínculo. Agora com as videochamadas, eu vejo a casa, o quarto das crianças. Existe um outro tipo de acolhimento que, querendo ou não, eu consigo ver outras coisas. E assim tem sido feito." 

Para o futuro, Gabriela projeta que as novas gerações serão os verdadeiros beneficiados pelas lutas feministas da atualidade. "A gente está mudando essa cultura. Eu acredito que o conhecimento jurídico empodera e faz com que a mulher se sinta mais segura. Ver a mulher mudando, aprendendo, defendendo e falando para amigas, porque uma mulher que está num processo assim, é multiplicadora. Isso mostra que o Direito pode analisar estas crenças de gêneros." 

Câmara aprova lei sobre violência doméstica na pandemia  

Para prevenir e combater a violência doméstica no período da pandemia de Covid-19, quando vítimas têm maior dificuldade de realizar a denúncia em função do isolamento necessário, foi aprovado nessa quinta-feira o projeto de lei 1291/2020, de autoria da deputada federal Maria do Rosário (PT/RS). O projeto, assinado por 31 deputadas que compõem a Bancada Feminina na Câmara Federal, teve como relatora a deputada Flavia Morais e agora segue para o Senado.

O projeto dá caráter de serviço essencial às redes de atendimento, prevendo a proteção de mulheres, crianças e adolescentes e pessoas idosas, e   obrigando o atendimento presencial de todas as denúncias. Nos casos onde isso não for possível, deve ser assegurado atendimento on line, por telefone e aplicativos. Nos casos de tentativa de feminicídio, estupro e suspeita de violência sexual, o atendimento inclusive deverá ser domiciliar. 

Os registros feitos pelos números 180 (Mulheres) e 100 (Direitos Humanos e Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes) devem ser encaminhados em 24 horas os órgãos competentes, devendo ocorrer atuação integrada dos organismos de segurança, justiça e especializados.

Com base na Lei Maria da Penha, as Medidas Protetivas de Urgência poderão agora ser solicitadas online, sem a necessidade de comparecimento da mulher às delegacias. As medidas já em vigor terão a duração estendida pelo período em que vigorar a pandemia. 

Os casos de violência contra a mulher podem, e devem, ser comunicados pelos seguintes canais:
- Disque 180;
- Disque Denúncia 181;
- WhatsApp Polícia Civil: (51) 9.8444 - 0606;
- Denúncia Digital 181, disponível no site da SSP;
- Emergências pelo 190 da Brigada Militar.


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