Rigotto: "Lava Jato é um bem para o país, mesmo que com alguns exageros"

Rigotto: "Lava Jato é um bem para o país, mesmo que com alguns exageros"

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Foto: Mauro Schaefer


Por Marco Aurélio RuasO ex-governador Germano Rigotto, do PMDB, defende a operação Lava Jato e acredita que ela continuará sendo importante ferramenta de combate à corrupção. No entanto, destaca ser preciso atacar os problemas estruturais do país e para isso, entende como fundamental a reforma política e tributária. Rigotto diz que a cúpula de seu partido se afastou da base, se preocupando com cargos e favores.

Correio do Povo: Qual sua avaliação sobre o momento de crise na política brasileira?

Germano Rigotto: Primeiro a gente tem que saber que a operação Lava Jato é muito importante. Alguns falam na possibilidade de prejudicar a operação, de não ir pra frente, de boicote. Não existe possibilidade de isso ocorrer. Tem o poder judiciário que é totalmente independente, um Ministério Público independente e com poderes que não tinha, uma Polícia Federal que, por mais que possa mudar sua chefia, não vai impedir que agentes e delegados façam as investigações. Não há governo que tenha condições de impedir o trabalho da PF. E tem uma imprensa que se aperfeiçoou nesse processo de investigar. Então, há um quadro no qual esse processo de apuração vai continuar, doa a quem doer. De positivo, com todo o desencanto e revolta que ocasiona essa sucessão de denúncias, estamos vivendo um momento que significa a certeza de um país diferente ali na frente. Quem vai pra vida pública vai ter que vir com um outro estilo e não cometendo os erros que se cometeram ao longo desses anos. Agora, se não tiver mudanças estruturais, não vamos atacar os fatores que levaram a esse quadro. Eu começaria pela reforma política. O que precisamos? Uma mudança no sistema partidário, no sistema eleitoral, a proibição das coligações nas proporcionais, a questão da cláusula de barreira. Por exemplo, acho absurdo se falar, neste momento, em mudar o sistema eleitoral e se pensar no voto em lista. O voto em lista favorece a manutenção do status quo. Favorece que os atuais detentores de mandato permaneçam em seus mandatos. Eles vão estar no topo da lista organizada pelo partido. Sou totalmente contrário ao voto em lista e sou totalmente favorável a um sistema distrital, no qual se divide o Estado em distritos, os partidos indicam os candidatos e o mais votado é eleito. Isso vai significar um eleito mais comprometido com o eleitor e o eleitor acompanhando mais o que o eleito faz. Ao lado da reforma política, luto há tempo por reforma tributária. O sistema tributário também é fator de corrupção, a guerra fiscal é fator de corrupção. Tem que ter um sistema mais racional e eficiente, que impeça o crescimento da sonegação, da informalidade e da elisão fiscal - que é buscar o Judiciário para não pagar tributos. Quem paga a conta por esse sistema é o pequeno, o trabalhador de baixa renda que não tem como se proteger. A maior parte da carga tributária está embutida em produtos que recaem sobre o consumo. São reformas que, se o Congresso não fizer, vai crescer a busca por uma constituinte revisora exclusiva, pessoas, independentes do Congresso, eleitas para fazer essa revisão constitucional no prazo de um ano.

CP: Quais são as suas considerações sobre a operação Lava Jato?

Germano Rigotto: A Operação Lava Jato é um bem para o país, mesmo que com alguns exageros. Por exemplo, estão misturando propina gente que ganhou dinheiro por ter favorecido empresa, ganhou dinheiro apresentando medida provisória, defendeu o interesse de empresa junto ao governo federal, com quem recebeu contribuição que pode não ter entrado diretamente na sua conta de campanha, mas via diretório, e põe um ponto de interrogação se pode ser caixa dois. Havia um sistema de financiamento que permitia isso e leva a uma zona de sombra hoje, uma mistura do que é certo e errado. A Lava Jato está fazendo um bem pro país, mas vai ter que ter esse processo de depuração, de ver o que legal, o que não teve propina ou ganho indevido do candidato. No meu modo de ver, a operação não vai parar. Vai continuar.

CP: Qual é a possibilidade de a crise nacional atingir a política gaúcha?

Germano Rigotto: Não acredito. Acho que nós, no Rio Grande do Sul, temos uma forma de fazer política diferenciada. Por exemplo, meu partido tem um tipo de condução na política nacional que sempre combatemos. Fui pré-candidato à presidência da República pra combater isso, prejudicando até uma candidatura à reeleição para o governo do Estado. Porque nós não entendíamos que o PMDB, com o número de prefeitos, deputados estaduais, vereadores, deputados federais, senadores e governadores que tinha, podia ficar a reboque de outros partidos que não têm a estrutura e a capilarização do PMDB. Lutamos por uma candidatura própria e a cúpula se preocupava em cargos, espaços e favores no governo. Isso foi nos dois mandatos do FHC, nos dois do Lula e no governo Dilma. Isto apequenou e fragilizou o PMDB. Determinou que o PMDB ficasse com rótulos de fisiologismo, de clientelismo e outros piores. Nós lutamos contra isso todo o tempo.

CP: Qual sua avaliação sobre a atual condição do Estado?

Germano Rigotto: A recessão atingiu a arrecadação federal, dos estados e municípios fortemente. Sem contar que, a partir de 1997, tivemos dois fatores que, por exemplo, fizeram do Rio Grande do Sul um dos estados mais penalizados. Começamos a pagar a dívida com a União que não se pagava antes. E, também a partir daquele ano, tivemos perdas determinadas pela Lei Kandir. A União não cumpriu com o que tinham assumido, que era de repor 50% do que os estados perdiam com a desoneração das exportações. O RS, Estado com vocação exportadora, passou a ter muita dificuldade com as perdas que teve na arrecadação do ICMS a partir da Lei Kandir. E ciclicamente tiveram situação de PIB baixo devido à economia nacional. No meu período de governo teve duas grandes estiagens que derrubaram o PIB do Estado. Não vou discutir quais ações o governo está tomando porque desde que deixei o governo, me recusei a analisar a ação deste ou daquele governo. Acho que ex-governador não tem a responsabilidade de ficar dando palpites sobre ações de governos, só que eu quero dizer: o governo do Estado, obrigatoriamente, para manter os serviços essenciais funcionando e não entrar em colapso, tem que tomar medidas de ajuste fiscal reduzindo despesas e otimizando receitas.

CP: Qual é sua opinião sobre as reformas da Previdência e trabalhista propostas pelo governo federal?

Germano Rigotto: Aprovo a trabalhista. Acho que tem que acontecer uma flexibilização da legislação, mantendo direitos essenciais dos trabalhadores. Acho que a proposta que tramita no Congresso vai nessa direção, de manter os direitos fundamentais, mas de flexibilizar para que isso possa significar geração de emprego. Na Previdência, pode não ser a proposta exata a que está tramitando, mas todo mundo sabe que o mundo mudou. A expectativa de vida que a população tem hoje é muito maior que há 20 anos e as mudanças no sistema previdenciário têm que acontecer.

CP: Como descolar a imagem do PMDB gaúcho a do PMDB nacional?

Germano Rigotto: Ao longo dos anos o PMDB se enfraqueceu porque rifou a possibilidade de termos um projeto nacional. Ficou com o rótulo de fisiologismo e clientelismo devido a essa postura. A grande maioria do PMDB do Rio Grande do Sul, quase a totalidade, se posicionou e lutou contra isso. A cúpula se afastou da base e levou o PMDB ao desgaste. Não é de agora que lutamos contra isso. Não fomos vencedores ao longo desse tempo, mas não deixamos de denunciar o erro que se cometia e que pagamos um preço muito alto por isso até hoje. A posição do PMDB do Rio Grande do Sul tem sido de contestação. Isso já nos diferencia.

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