Robótica para cirurgias

Robótica para cirurgias

A ginecologista e obstetra Carla Peron conversa com o Correio do Povo

Taís Teixeira

"Em âmbito global, \[a cirurgia robótica\] atinge 4%. Nos EUA, alcança 30%, mas nos procedimentos de prostatectomia chega a 80%. No Brasil, o cenário é bastante variável. Nos grandes centros, a disponibilidade de sistemas robóticos vem crescendo rapidamente".

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Responsável pela análise clínica no desenvolvimento de instrumentos e sistema robótico para cirurgias minimamente invasivas, segurança e performance dos equipamentos, a ginecologista e obstetra Carla Peron, atualmente vice-presidente global de Pesquisa Clínica e Ciências Médicas da Medtronic, iniciou sua carreira no Brasil. Para ela, trazer dados que ilustrem a redução de riscos e a rápida recuperação com os procedimentos minimamente invasivos é uma forma de contribuir com a evolução do setor no mundo. Carla reside há 5 anos na Flórida e há dois anos tornou-se, além de vice-presidente de Pesquisa, a executiva responsável pela área médica de Inovações Cirúrgicas e de Robótica

O que é uma cirurgia minimamente invasiva? Para quais situações é indicada?

O termo é utilizado para definir a técnica cirúrgica realizada com pequenas incisões e instrumentos especiais, permitindo que o cirurgião acesse os órgãos e estruturas com menor agressão aos tecidos. Além disto, reduz o sangramento intraoperatório, o tempo de cicatrização e o risco de infecção. Os pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos por meio da técnica frequentemente apresentam recuperação mais rápida e menos dolorosa no pós-operatório. Como consequência, esses pacientes conseguem retornar às atividades do dia a dia mais rapidamente. Tanto nas cirurgias ginecológicas quanto nas urológicas, de forma geral, a recuperação do paciente na cirurgia aberta se dá entre 5 e 7 dias, já na minimamente invasiva, entre 2 e 3 dias. A cirurgia minimamente invasiva pode ser indicada para vários procedimentos cirúrgicos em ginecologia, urologia, cirurgia geral, entre outros. Atualmente, é aplicada por meio de técnicas laparoscópicas, com instrumentos rígidos manuseados diretamente pelas mãos do cirurgião ou por meio da robótica,com o cirurgião utilizando instrumentos de pulso do sistema robótico direto.

Por que usar robôs na execução desse procedimento? Quais vantagens têm sobre médicos humanos? Acredita que é tendência?

O uso de robôs na cirurgia minimamente invasiva ocorre há mais de 20 anos. Inicialmente, era realizada nos procedimentos urológicos como, por exemplo, nas intervenções de prostatectomia para o tratamento de câncer de próstata. Atualmente, abrange quase todas as especialidades cirúrgicas por propiciar uma melhor visualização durante a cirurgia e pelo uso dos instrumentos de pulso que permitem movimentos extremamente precisos.

Como esse tipo de procedimento favorece a saúde da mulher?

Por ser uma técnica menos invasiva, com menor risco de complicações, quando comparado à cirurgia tradicional aberta, o impacto na saúde da mulher está diretamente ligado à rápida recuperação. Além disso, com a saúde reabilitada mais rapidamente, elas logo conseguem retomar as atividades.

Para quais quadros de doença feminina é indicado?

A cirurgia minimamente invasiva, laparoscópica ou robótica, pode ser utilizada em muitos procedimentos ginecológicos utilizados para o tratamento de patologias benignas como endometriose e miomatose uterina, bem como para o tratamento de câncer de útero e ovário, entre outros. A indicação do uso de técnicas minimamente invasivas deve ser definida pelo cirurgião em colaboração com a paciente. Nesta escolha, múltiplos fatores são considerados, como o estado da paciente, a condição a ser tratada e disponibilidade de tecnologia utilizada nesses procedimentos.

Como está a expansão dessa tecnologia no mundo? E no Brasil?

Em âmbito global, atinge 4%. Nos EUA, alcança 30%, mas nos procedimentos de prostatectomia chega a 80%. No Brasil, o cenário é bastante variável. Nos grandes centros, a disponibilidade de sistemas robóticos vem crescendo rapidamente e alguns procedimentos, como a prostatectomia robótica, são oferecidos regularmente como a primeira opção em centros de saúde privados, dependendo do caso. Os procedimentos ginecológicos também ganham espaço na cirurgia robótica no Brasil, especificamente no tratamento de doenças que requerem a remoção do útero. Apesar de agregar claras vantagens para o cirurgião, ampliando a visualização das estruturas e órgãos e a alta precisão no uso de instrumentos de rotação, a cirurgia robótica vem sendo aplicada em casos específicos. Para isso, é considerado o estado do paciente e o balanço de custo/benefício da tecnologia.

Quando você começou a trabalhar com robótica? Há muitas mulheres atuando neste setor?

Minha parceria com a indústria no desenvolvimento de novos produtos direcionados à saúde feminina começou no início da carreira, ainda como residente, período em que tive a oportunidade de participar da execução do protocolo de pesquisa clínica mundial desenvolvido para avaliar a segurança e efetividade da vacina do HPV. Há 6 anos, tive a oportunidade de me unir a Medtronic no Brasil e há três anos assumi a liderança da equipe médica global nos EUA, responsável pela execução dos ensaios pré-clínicos e clínicos necessários para validar o uso seguro e eficaz do sistema de cirurgia robótica da empresa. Apesar de ser um setor de tecnologia predominantemente liderado por homens, o programa robótico na Medtronic tem uma alta representatividade feminina, com mulheres em posições estratégicas como finanças, pesquisa e desenvolvimento e regulatório, além da minha posição como líder médica. Claramente, estamos em um processo rápido de diversidade, ampliando a representação feminina em diferentes setores e níveis. Eu particularmente acredito que, no mercado corporativo, em 5 a 7 anos, a presença feminina será equiparada ao que vemos nos níveis básicos de ingresso nas universidades brasileiras, onde as mulheres já perfazem a maioria em muitos programas.

Considera importante o apoio das empresas no desenvolvimento feminino para vencer o preconceito que as mulheres sofrem no mercado corporativo?

Na Medtronic, esse é um tema que está entre as prioridades da empresa. A companhia é muito comprometida com pautas de equidade de gênero, LGBTQIA+, questões raciais e etc. Tanto que há comitês específicos para as respectivas causas, para que realmente haja um comprometimento na prática com os temas. Na questão de equidade de gênero, há o Medtronic Women’s Network (MWN), um comitê que trabalha na atração, desenvolvimento e retenção de talentos femininos. Dentro do MWN existe o programa de sponsor, o qual eu faço parte, para entender de forma mais exclusiva o perfil das colaboradoras interessadas no desenvolvimento profissional. Quando fui convidada para assumir a posição de vice-presidente, eu mesma me questionei se estava preparada para isto. Foi a própria Medtronic que me deu todo o apoio e me fez enxergar o tamanho do meu potencial. Hoje, eu participo do programa para ajudar outras mulheres. Se todas as empresas se comprometerem com a causa, certamente teremos mais forças para vencer o preconceito com as mulheres no mercado corporativo.


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