Como será depois da pandemia

Como será depois da pandemia

Tudo será como antes

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      Há quem adore dizer que depois de algum acontecimento extremo o mundo nunca mais será o mesmo. Nunca acerta. A humanidade é incorrigível. A mídia afirmou que depois do 11 de setembro de 2001 o mundo nunca mais seria o mesmo. Não demorou muito e tudo voltou a ser como sempre, até alguns controles de segurança em aeroportos foram sendo relaxados. Os europeus tiveram uma primeira onda do coronavírus apavorante. Mas passaram o verão como se não houvesse amanhã. Não combinaram com o vírus que a fatura estava liquidada. A segunda onda já deu as caras como se fosse uma enorme ressaca depois da orgia.

      O mundo bate recordes mundiais de contaminação segundo a Organização Mundial da Saúde. A Espanha decretou “estado de emergência sanitário” Cabe a pergunta brutal: a humanidade é burra? Ou só parte dela? Ou é vitalista? Quer viver a qualquer custo e, depois de algum tempo de restrição, com qualquer risco? Passeatas em Londres pedem o fim de medidas de isolamento. A exemplo do Guma, o vidente de Palomas, que só previa o previsível para não ter erro, eu prevejo o seguinte: depois da vacina tudo voltará a ser exatamente como antes da pandemia. A higiene constante das mãos desaparecerá. Nada mudará? As reuniões por aplicativo continuarão. Por que atravessar o Brasil para um encontro de trabalho que pode ser realizado virtualmente? Na universidade, as bancas de doutorado com examinadores de fora serão por aplicativo. O Zoom provou que não há razão para deslocamentos.

      O Brasil já vive em cima de pré-pós-pandemia. O vírus também aqui não foi alertado de que está com os dias contados. A perspectiva de que a vacina está chegando, junto com o verão, faz tirar a máscara ainda mais rápido. Alguns carregam a máscara no bolso ou na bolsa para se sentirem menos culpado. No fundo, a percepção é esta: tudo não passa de uma loteria viral. Uns vão pegar e outros não. Seja o que vírus quiser. O curioso é que a máscara não tem contraindicações. Que mal pode causar o uso da máscara? Deveria valer, no mínimo, o “se bem não faz, mal não faz”. Na rua tem cara sem máscara que bufa de orgulho para os medrosos mascarados como eu. Parece uma declaração de guerra.

      Para evitar restrições é simples: ter logo uma vacina, venha de onde vier, que o vírus não tem ideologia nem partido, descobrir um remédio mais eficaz do que a cloroquina ou abrir vagas em hospitais para todos que vierem a precisar seja qual for o número de infectados. Fácil, não? Depois da pandemia tudo será como antes no quartel de abrantes. Até o próximo vírus. Candoca, o discípulo, em Palomas, de Pangloss, aquele famoso personagem otimista de Voltaire, não esconde a sua autenticidade: “Por que deveria ser diferente? Primeiro a gente se borra de medo; depois, a gente recupera o tempo perdido, se não morrer”. A morte, esclarece, é só uma questão de tempo e de sorte.

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Frase do Noite, o iluminista obscuro, que ainda meio apagado e fechado na escuridão dos seus medos e precauções consideradas inúteis: “O cara que bufa na rua sem máscara rasga a bandeira: é cabo eleitoral do vírus. Precisa ser fiscalizado não pela Saúde, mas pelo TRE”.


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