Era uma vez na realeza britânica

Era uma vez na realeza britânica

Príncipes querem brincar de outra coisa

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Sim, era uma vez um príncipe inglês que perdeu a mãe quando criança. Ele cresceu traumatizado pela grande praga da sua classe: os paparazzi. Para ele, cada flash acende uma lembrança triste e uma dor não superada. Na adolescência, como todo jovem nessa fase, ficou rebelde e chegou a usar suástica numa balada de fazer sapo virar mago. O tempo passou, o príncipe cresceu, virou adulto, ficou mais bonito e apaixonou-se por uma linda plebeia norte-americana, afrodescendente, divorciada, mais velha do que ele, feminista, empoderada e de faca na bota. Os tabloides britânicos não a pouparam do racismo que os marca.

O príncipe órfão e a musa plebeia tiveram um filho. Não o apresentaram aos súditos, conforme a tradição, logo depois do nascimento. Não lhe deram um nome de acordo com a linhagem nobre. Batizaram-no com um nome esquisito de acordo com o imaginário da mãe do menino, ex-atriz de Hollywood, o que chocou um pouco a família real e inflamou a xenofobia dos jornais sensacionalistas locais. Quando tudo parecia mais calmo, o príncipe e sua amada anunciaram a grande bomba: não querem mais brincar de duque e duquesa nem de membros da realeza. Querem morar metade do tempo na América. A coroa da Rainha tremeu.

O reino passou a perguntar: o que eles querem fazer? Eles responderam: “Ganhar nosso próprio dinheiro”. Essa ideia pareceu bizarra a muita gente. Para que se dar esse trabalho? Nem todos estão preparados para entender um príncipe pós-moderno. Passado o susto, chegou a hora das coisas práticas: ganhar dinheiro como? O rígido protocolo real nem permite aos seus membros algo tão plebeu como trabalhar normalmente e ganhar dinheiro com o suor do próprio rosto. As casas de apostas, obsessão britânica, entraram em parafuso. O que eles vão fazer? Ela será novamente atriz? Ele será escritor? O que mesmo?

      Qualquer menino poderia dizer sem hesitar qual o sonho do príncipe traumatizado e de sua linda esposa? A cada época conforme o seu imaginário, a cada pessoa conforme a sua época. Elementar. O que poderia desejar mesmo um príncipe e sua deusa hipermoderna na era das redes sociais? Houve um tempo em que se sonhava ser astronauta? Muitos ainda sonham em jogar futebol. Já houve a época em que o máximo era ser roqueiro. No Brasil, muitos almejam ser ídolos sertanejos. Há, porém, um sonho globalizado, universal, unidimensional, acima de classes sociais, origens e trajetórias individuais, algo que une nobres e plebeus, herdeiros de tronos e destronados, ricos e pobres e até ídolos do futebol, do rock e da música sertaneja: ser digital influencer.

      Fim do mistério: o príncipe e sua consorte pediram demissão da realeza para reinar na internet como youtubers e influenciadores digitais. Não querem ter súditos, mas seguidores. Nada de faixas de apoio. Melhor ter banners de patrocinadores. Romanticamente o casal calculou tudo: a imagem de marca que possuem pode render muito. Sem contar que será muito mais divertido. E assim se entende quem tem realmente o poder no mundo atual. A coroa pertence ao rei das redes.


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