Fim do ano temerabilis

Fim do ano temerabilis

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 E se acabou! Quase. O ano de 2017 termina como começou: uma esculhambação. O fecho veio com a declaração de Roberto Carvalho Veloso, presidente da Associação dos Juízes Federais, sobre a moralidade de receber o indecoroso auxílio-moradia de mais de R$ 4 mil, privilégio que mortal não tem: “Não estamos com essa preocupação. Não é uma pauta nossa. Não estamos com essa pauta. Estamos pensando um pouco mais a frente. Precisamos resolver essa questão remuneratória”. Aquilo que o homem de capa preta vê como “um pouco mais a frente”, nós, o povinho maltratado, vemos como resquícios de tempos atrás.

Tem mais: um áudio atribuído ao juiz Glaucenir Oliveira, de Campos, Rio de Janeiro, que mandou prendeu o ex-governador Garotinho duas vezes, faz uma gravíssima acusação ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal: “Isso é um absurdo, entendeu? O Gilmar não tem mesmo vergonha na cara, infelizmente. Não adianta fazer campanha contra ele, porque ele sorri, ele é sarcástico. É desanimador, é uma desilusão, porque a gente trabalha sério, a gente é na verdade um soldado na linha de frente, a gente leva pedrada, leva tiro, enquanto o grande general do Poder Judiciário – que ele agora parece que é o dono do poder – mela o trabalho sério que a gente faz, com sarcasmo, com falta de vergonha. E, segundo os comentários que eu ouvi hoje – comentário sério, de gente lá de dentro – é que a mala foi grande”.

Glaucenir ficou conhecido por ter dado carteiraço numa guarda de trânsito que o flagrou cometendo infração. Neste Brasil de faz de conta, o presidente Michel Temer descreveu um paraíso na sua mensagem natalina. Só faltou garantir a existência do Papai Noel. Depois da licença poética do presidente da República, o seu ministro Carlos Marun aplicou ao país um choque de realidade. Segundo ele, liberar verbas em troca de votos não é chantagem. Marun é aquele mesmo que se tornou célebre defendendo o agora presidiário Eduardo Cunha e, depois desse estágio, promovido a membro da tropa de choque do atolado Temer, foi recompensado com cargo no primeiro escalão por sua fidelidade canina e sua capacidade de torcer os fatos tornando-os legais.

O otimista diz com certa ingenuidade: Paulo Maluf e José Maria Marin foram para cadeia. Bom sinal! Parceiros na ditadura militar, eles encheram as mãos e escaparam ilesos sob a proteção da censura. A justiça brasileira é tão lenta que só pegou Maluf aos 86 anos de idade. Justiça Rubinho Barrichello. Marin está conhecendo a celeridade da justiça dos Estados Unidos. Ele não foi tão rápido quanto seu parceiro Marco Polo del Nero, o presidente da CBF que fugiu da Suíça para o Brasil a tempo de se exilar em sua mansão tropical. O pessimista ressalva: Maluf não vai esquentar catre de cela. O ano termina. A Lava Jato agoniza. A moralidade saiu da pauta. O indulto de Natal de Temer foi tão generoso que escandalizou até o Papai Noel.

No apagar das luzes, mais um drible de Temer. Desta vez, nos ruralistas. Primeiro, para conseguir os votos da bancada do boi e escapar do impeachment, Temer mandou publicar portaria favorável ao trabalho escravo. Agora, livre da foice do impedimento, recuou. Melhor. Imagino o berro.

Feliz 2018!

Que todos os sonhos se realizem, especialmente o mais simples, mais antigo e mais compartilhado: o de um país melhor com eleições respeitadas, sem terceiro turno e sem nada a temer.

 

 

 

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