Previdência imprevidente

Previdência imprevidente

Carta de leitor

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“Caro Juremir: sou um leitor habitual de sua coluna e não teria nenhum problema em ser rotulado de neoliberal, o que eu acho que torna insuspeito o meu comentário. Se não estou enganado, uma ou duas colunas recentes suas no correio abordaram a questão da previdência complementar, em que vc cita exemplos de algumas pessoas que viram suas contribuições ao longo de sua vida ativa praticamente viraram pó, basicamente em razão de alegados riscos financeiros e inflação.

Uma experiência pessoal, na verdade a que eu estou enfrentando agora, me incentiva a comentar que o problema é ainda pior do que vc descreveu, mas em outro aspecto. O risco dos investimentos dos ativos acumulados realmente existe e dificilmente um plano de previdência privada poderia escapar deles, o mesmo valendo em relação à inflação. Infelizmente a maioria dos cidadãos não tem a informação necessária para entender plenamente o que está contratando.

Acho que não pode haver frustração maior do que vc ter que enfrentar uma doença degenerativa, ter concedida a aposentadoria pelo INSS, e ainda assim ser humilhado pela administração do plano de previdência privada por meio do calvário de documentos e obstáculos burocráticos que vão se sucedendo. Documentos, aliás, que eles próprios arbitram. Assim, oficialmente o banco não está lhe negando o pagamento, é vc que não entregou todos os documentos!

Só para vc ter uma ideia, o banco administrador do meu plano exigiu documento de comprovação de conta bancária. Detalhe: sou correntista do próprio banco! Seria como o Correio do Povo me exigir um comprovante de que eu sou assinante... do Correio do Povo! Nem preciso dizer a vc que este impasse vai parar no judiciário, já abarrotado. É uma disfuncionalidade institucional na qual o poder de mercado das instituições é inversamente proporcional à dignidade dispensada aos clientes. Não há judiciário em porte suficiente para dar solução. Ainda tenho condições de contratar advogado e enfrentar a situação. Infelizmente o Estado que vai me prestar o serviço é justamente aquele que vai faltar para os idosos mais pobres.

Note que não estou me colocando a favor da tutela do governo, especialmente a que é tradição no Brasil, focada no assistencialismo das instituições de defesa do consumidor, que tende a atender mais aos burocratas do que aos pobres. A intervenção inteligente é feita no atacado: educação, democracia, leis bem-feitas, responsabilização, concorrência nos mercados, prestação de contas dos agentes públicos (accountability), ou seja, aquilo que distingue as sociedades desenvolvidas, seja Suécia, EUA, França, Alemanha, Islândia, que diferem apenas no tom destes elementos institucionais. Por razões pessoais gostaria de lhe solicitar meu anonimato.”

O que comentar? Só consigo tentar me colocar no lugar desse leitor para, quem sabe, sentir um pouco da sua dor. Vivemos de perplexidades. O prometido quase nunca se encontra com o entregue. As esperanças ficam pelo caminho. Por aqui, promessa nunca é dívida. Enquanto isso Paulo Guedes capitaliza sua fortuna num paraíso fiscal.

 

 


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