Raoni merece o Nobel da paz

Raoni merece o Nobel da paz

Cacique simboliza a Amazônia em perigo

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Ninguém merece mais o Nobel da Paz do que o cacique Raoni.

Ele é a floresta, a Amazônia em chamas, o credor nunca compensado.

Se não levar, será uma injustiça.

Um Nobel é o mínimo que a Europa invasora pode dedicar a um indígena brasileiro.

Nunca se pagará a dívida com índios e negros.

Somos um país construído pela invasão de um território habitado, em cima da dizimação dos povos originários e com base no infame trabalho escravo.

Um Nobel para Raoni seria um pálido pedido de perdão.

E um grito em favor da Amazônia.

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Bandônion

Há no som de um bandônion uma tristeza tão lânguida e infinita que chega a parecer a melancolia que se apossa de nós quando pensamos nas auroras, nos crepúsculos, nos invernos mais longos que experimentamos e nessas madrugadas involuntárias, esses alvoreceres em que chegamos de viagem e ainda não estamos em casa. Sim, todos nós, ou quase, em algum momento, mesmo nestes tempos artificiais, ainda pensamos em auroras, crepúsculos, invernos e madrugadas de partida ou chegada. O articulista escreve sobre o presente e o futuro. O cronista, sobre o passado. A música de um bandônion é como um passado que se espicha para além do tempo.

      Como bom velho nostálgico, temo que a juventude se distraia e não vejo os mais tristes amanheceres nem escute os mais chorosos solos de um bandônion. Mas a juventude sempre nos engana. Quando pensamos que já não se interessa pelo que nos faz chorar, ela nos comove com suas releituras. A melancolia de um bandônion, assunto que volta e meia exploro aqui, pode ser metáfora da existência, semeadura e colheita, lamento por alguma perda, especialmente a irreparável perda da memória, não da memória como arquivo de vivências, mas da memória como vontade de ainda lembrar.

      Telmo Flor, diretor de redação do Correio do Povo, festejou, no último sábado, os seus 60 anos de idade. Somos amigos há 40 anos, desde os gloriosos tempos de faculdade de jornalismo na PUCRS, das discussões no Maza, bar na avenida Bento Gonçalves frequentado pelos estudantes, onde mudávamos o mundo a cada noite, das viagens no T1 ou no T4 até a Assis Brasil, das nossas primeiras aventuras jornalísticas, O Malcriado, jornal satírico que criamos dentro da universidade, e a Folha de Viamão, experiência séria capitaneada pela Ruvana de Carli. Quando estávamos no meio da confusão, Telmo tinha a palavra que resolvia, clareava, definia. Não é por acaso que se tornou o melhor diretor de redação que conheci em meus 35 anos de jornalismo. Ouvi Astor Piazzolla pensando naqueles tempos.

      David Coimbra, velho amigo da concorrência, era da nossa turma de faculdade, de bar e de ônibus. Morava no IAPI. O Ricardo Giusti, grande fotógrafo do Correio do Povo, fazia parte daquele imaginário. Juntos, sonhamos, tomamos alguns porres, estudamos, lemos “As veias abertas da América Latina”, de Eduardo Galeano, comparamos capitalismo e comunismo, opusemos Jean-Paul Sartre e Alberto Camus, revolucionários e revoltados, recebemos Flávio Tavares, de volta do exílio, na Famecos, entrevistamos Luís Carlos Prestes, dividimo-nos entre Leonel Brizola e Jango, começamos a botar os pés no chão, a descobrir as imposições da realidade e a sempre louvar a democracia. Tudo era descoberta, deslumbramento, cumplicidade.

      Escuto a suave tristeza de um bandônion. Sinto saudade desse tempo em que vivíamos para o futuro. Mas me sinto feliz pelo que nos tornamos. Continuamos a crer em justiça social, verdade, democracia e na importância do jornalismo como fiscal do poder. Estamos mais calejados, mas vivos.

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Até esta sexta-feira, 11, estão abertas as inscrições (no site do programa) para mestrado e doutorado em Comunicação na Famecos/PUCRS.

     


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