Feira do Livro em 2021 teve apagão de atividades com autores de literatura infantojuvenil

Feira do Livro em 2021 teve apagão de atividades com autores de literatura infantojuvenil

Entidades reivindicaram a realização das ações em manifestação

Lucas Tillwitz / Ufrgs

Protesto ocorreu em 7 de novembro, em frente ao espaço Floresta Encantada Petrobras

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Se a programação oficial da Feira do Livro de Porto Alegre em 2020 foi recheada de encontros com autores de literatura infantojuvenil, em 2021 a situação foi diferente ao longo do evento. Nos 18 dias de realização da feira, não houve qualquer painel presencial ou virtual destinado ao diálogo com autores de livros infantis e juvenis na programação oficial da edição, que encerra hoje, às 20h30min. Segundo informações disponíveis em publicações da feira em sua página no Facebook, ao menos 20 atividades do tipo ocorreram na edição passada do evento. A programação oficial naquele ano foi inclusive inaugurada por tais encontros, quando a autora de literatura para infâncias e juventudes Kiusam de Oliveira se reuniu virtualmente durante pouco mais de uma hora com alunos das sérias iniciais e intermediárias do Ensino Fundamental.

As conversas com escritores do ramo em 2020 refletiram a diversidade das obras de seus autores, promovendo debates sobre racismo, direitos humanos, acessibilidade literária, dentre outros temas. Na feira de 2021, não existiram atividades destinadas a jovens na programação oficial do evento. Já a programação oficial para crianças foi constituída por contações de histórias e peças de teatro no espaço Floresta Encantada Petrobras. A ausência dos encontros foi rechaçada pela Associação Gaúcha de Escritores (Ages) em nota à Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL), publicada em 29 de outubro na página da entidade no Facebook. No comunicado, afirmou que “ao ser divulgada a programação, a diretoria da Ages percebeu, um tanto surpresa, a ausência substancial de autores e de autoras cuja obra é específica para a infância e a adolescência, segmentos de público bastante importantes, ao se pensar a necessidade de um país mais leitor”.

Na nota, a Ages disse ainda que “o contexto socioeconômico prejudicial à cultura, resultado da pandemia do coronavírus, foi a principal causa para que a Feira tivesse poucos recursos, segundo a diretoria da CRL, tendo que esta edição da Feira ser organizada com certas limitações”. Em comunicado à Ages assinado pelo presidente da CRL, Isatir Botin Filho, a entidade reafirmou o impacto da pandemia sobre o evento, “que, como todo o setor cultural, passa por dificuldades financeiras extremas nos últimos dois anos devido à pandemia”. O informe disse ainda que a edição em curso da feira “teve protocolos sanitários estabelecidos nas vésperas de sua abertura”, e que não foi possível incluir antecipadamente em seu planejamento “tudo que gostaríamos”. “A boa notícia é que, na cerimônia de abertura deste ano, tivemos a sinalização para a renovação de patrocinadores e o retorno da Prefeitura de Porto Alegre como incentivadora financeira para que o evento aos poucos retorne ao seu formato ideal”, finalizou o comunicado.

Protesto

Em 7 de novembro, entidades ligadas ao setor de livros realizaram um protesto em frente ao espaço Floresta Encantada Petrobras, com a participação de escritores, ilustradores, mediadores de leitura e leitores. A manifestação teve como objetivo, segundo seus organizadores, destacar a importância da produção endereçada a crianças e jovens para a formação de leitores e reivindicar espaços de encontro entre leitores e autores do segmento em eventos literários. A manifestação foi organizada pela Ages, a Associação Rio-Grandense de Bibliotecários, o Fórum das Bibliotecas Escolares e os institutos Cirandar, Beabah e Reinações.

Segundo o presidente da Ages, Alexandre Brito, a ausência dos encontros representa uma involução da feira. “É um empobrecimento muito importante que ocorre quando a CRL decide, e isso é uma opção, por um recorte curatorial que exclui toda essa área”, afirma. “Nós fizemos uma manifestação crítica visando a construção da feira do ano que vem, de uma maneira propositiva, para que nós tenhamos uma próxima feira mais plural e que contemple todas as reflexões”, acrescentou.

“A gente reconhece as dificuldades imensas da realização desta Feira do Livro. Nós não desconhecemos isso. Porém, numa situação como essa de grande dificuldade, os sacrifícios precisam ser divididos entre todos, e não permitir que algumas áreas sofram mais o impacto da gravidade desse momento”, pondera Alexandre, quanto aos argumentos da CRL em relação à ausência das atividades. “Ainda mais levando em consideração que a literatura infantojuvenil é uma área responsável pela formação dos leitores de hoje e de amanhã”, conclui.

O escritor e professor Caio Riter participou de um encontro virtual com crianças e jovens na Feira de 2020. Na ocasião, o autor e educador compartilhou com o público suas experiências profissionais em meio à pandemia e seus processos de criação. Segundo ele, a decisão da CRL de não realizar os encontros com autores para infâncias e juventudes na edição de 2021, enquanto manteve as atividades com escritores para adultos, demonstra indiferença por parte da entidade em relação ao segmento. “Houve uma contenção de gastos que atingiu somente os encontros de autores de literatura infantojuvenil com seus leitores. O fato de a CRL ter se descuidado dessa programação mas não ter esquecido os eventos e atividades para o público adulto demonstra um certo desinteresse em relação à literatura infantojuvenil”, avalia Caio.

Para a escritora e patrona da Feira de 2011 Jane Tutikian, a ausência dos encontros é uma perda para todos - escritores, leitores e evento -, a qual deve ser revista em edições seguintes. “Essa atitude não prejudica somente os escritores. Ela prejudica as crianças e os jovens, que serão leitores na fase adulta. Logo, prejudica a própria feira. Diante disso, eu só posso achar que foi um equívoco lamentável, que eu espero que seja corrigido. E corrigido abrindo as portas da feira para as crianças e para os jovens que querem falar com seus autores.”


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