Sem paciência para Freixo

Sem paciência para Freixo

Nosso capitão da eterna luta de classes foi novamente às redes sociais, após ser bombardeado. Gastou linhas e mais linhas para justificar sua posição. Escreveu, entre outras groselhas, que é imoral um jovem adulto, com dinheiro, ser imunizado antes de um idoso ou profissional da saúde

Guilherme Baumhardt

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Marcelo Freixo luta. Pelo menos é o que ele diz. Nas entrevistas que concede, nas publicações em redes sociais, não são raras as vezes em que dispara um “vai ter luta!”. A mais recente batalha de Freixo, este lutador, é para barrar a iniciativa de clínicas privadas de oferecer a vacina contra o coronavírus. No último domingo ele publicou em uma rede social: “(...) não permitiremos que a imunização seja tratada como privilégio. Ela é direito de todos, tem que seguir critérios do SUS e ser feita gratuitamente, priorizando grupos de risco, não quem tem dinheiro para furar a fila”.

Freixo precisa se decidir. Ou ele é a favor da população na luta contra a Covid ou ele coloca sua ideologia acima da batalha contra a doença. Se o sistema privado for mais eficiente que o setor público e vislumbrar uma alternativa de oferecer antes aos brasileiros a vacina contra o coronavírus, que mal há nisso? Se pessoas puderem pagar – além dos impostos que já bancam o Sistema Único de Saúde – pela imunização, isso significa menos gente nas filas dos postos de saúde, significa uma pessoa a menos disputando a dose a ser oferecida pelo governo. Significa, em última análise, gente imunizada mais cedo. Só temos a ganhar.

Existem inúmeros exemplos capazes de colocar por terra a lógica torta do nosso combatente socialista. Poderíamos lembrar a vacina da gripe, que é oferecida nos dois sistemas, público e privado. Isso é ruim? Claro que não, pelas mesmas razões expostas acima.

Ou ainda: por que temos planos de saúde privados? Porque existe gente com poder financeiro e disposta a pagar por um tratamento médico que vai além do que é oferecido pelo Estado. Se não tivéssemos operadoras e hospitais particulares, tudo recairia sobre o SUS. Não é preciso ter mais do que dois neurônios para vislumbrar o caos em meio à pandemia, para ficar em um único exemplo.

Por fim, Freixo não se dá conta de que há um erro de estratégia política na sua narrativa. Se a vacina chegar antes em clínicas privadas, aumentará a pressão para que o poder público (leia-se, principalmente, o governo federal) disponibilize as doses nos postos de saúde. Mas esperar que Freixo faça esta leitura talvez seja pedir demais.
Nosso capitão da eterna luta de classes foi novamente às redes sociais, após ser bombardeado. Gastou linhas e mais linhas para justificar sua posição. Escreveu, entre outras groselhas, que é imoral um jovem adulto, com dinheiro, ser imunizado antes de um idoso ou profissional da saúde. Além disso, lascou o seguinte: “Imunizar primeiro uma minoria que tem dinheiro para pagar caro pela vacina não pode ser a regra”. E se entre os “abastados” estiverem idosos? São pessoas do chamado grupo de risco que, graças à “luta” do deputado, não teriam acesso à vacina em clínicas privadas. Pergunto: e se elas morrerem de Covid? Poderíamos, neste caso hipotético, chamar Freixo de um “genocida das elites”?

O deputado federal pelo PSOL é um dos mais ferrenhos críticos da gestão Jair Bolsonaro. Às vezes, com razão. Exemplo? O governo federal dormiu no ponto e demorou para providenciar seringas, item tão necessário quanto as doses da vacina. Até o mais pessimista dos brasileiros sabia que um dia a vacina chegaria. Além disso, se não for usado na prevenção ao coronavírus, o material é útil em outras campanhas de imunização. Ou seja, um erro. Marcelo Freixo talvez um dia entenda que a imunização feita pelo setor privado seja um somatório, um complemento, e não um concorrente do sistema público. Até lá, dispenso a luta, os esforços e o suor do nosso combatente, um ilustre defensor do “Exército Vanguardista do Atraso”.


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