A estratégia da Rússia

A estratégia da Rússia

Intenção de Moscou, além de Donbas, é dominar Odessa, isolando a Ucrânia

Jurandir Soares

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A guerra na Ucrânia está trazendo para o mundo algo que não poderíamos imaginar que viesse acontecer em pleno século XXI: corpos de civis espalhados pelas ruas de uma cidade. No caso, Bucha. Mas o pior: muitos com as mãos amarradas às costas. Ou seja, crime de guerra. Porém por mais que este fato esteja caracterizado, dificilmente Vladimir Putin irá enfrentar um tribunal internacional. Na realidade, o líder russo está preocupado em consolidar o domínio de, pelo menos, alguma parte do território ucraniano.

Quando Putin iniciou a invasão acreditava concluí-la em menos de uma semana, com a tomada da capital Kiev. Passaram-se mais de 40 dias, e a surpreendente reação ucraniana impediu que sua capital fosse tomada. Diante do desgaste em termos de material, equipamentos e suprimentos para manter esse cerco, Putin resolveu mudar de estratégia. Deslocou suas forças do Norte do país para o Leste. Mais especificamente para a região de Donbas, onde situam-se as províncias separatistas de Lugansk e Donetsk. Ali as forças russas seguem encontrando a resistência ucraniana, mas encontram, por outro lado, o apoio dos separatistas que querem a adesão da região à Rússia. Não é sem razão que as autoridades ucranianas estão pedindo para que a população fuja dali, porque a batalha tende a ser intensa. Antes disso, mais uma atrocidade russa. Bombardearam uma estação de trens na região de Donetsk, de onde a população buscava um caminho para escapar do conflito. Pelo menos 50 mortos e 300 feridos.

Ao mesmo tempo, a Rússia intensifica os bombardeios em Mariupol, cidade que já está 90% destruída. E onde também civis são mortos ao tentar fugir, muito embora com os acordos a respeito dos chamados corredores humanitários. A destruição e a ocupação de Mariupol tem um objetivo bem específico. Ela situa-se entre a província de Donbas, que a Rússia pretende tomar, e a Crimeia, que a Rússia já tomou. Estaria, portanto, estabelecida a ligação entre todas essas áreas.

Mas há demonstrações de que a intenção da Rússia é ir mais longe. Nesta semana foram feitos bombardeios à cidade de Odessa, situada a Oeste da Crimeia, e que é o mais importante porto marítimo da Ucrânia, dando saída para o Mar Negro. Dominando aquela cidade a Rússia deixaria a Ucrânia isolada, sem uma saída para o mar. Mas se uma vez for concretizada essa tomada de Odessa, estaria automaticamente estabelecida a ligação com a Transnístria, um encrave russo situado dentro do território da Moldova. É mais um resultado de guerras insufladas pela Rússia para estabelecer uma divisão territorial. A Transnístria pertence oficialmente à Moldova, embora tenha declarado sua independência em 1990, com a ajuda de tropas russas. O Conselho da Europa considera a questão como sendo um “conflito congelado”.

Assim, o que se percebe é que, uma vez terminada a guerra, a Rússia tentará conservar para si essa área que vai do Leste da Ucrânia ao Leste da Moldova. Senão toda, pelo menos uma parte, porque, seguramente, a tomada de Odessa será um capítulo bem mais difícil, que pode repetir o que acontece com Kiev. Mas a estratégia russa parece clara.

 


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