Os cubanos estão chegando

Os cubanos estão chegando

Quem são os estrangeiros que mais fogem para o Brasil

Jurandir Soares

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O advento da internet está sacudindo os governos autoritários pelo mundo afora. Na medida em que as pessoas percebem as liberdades vigentes em outros países e as comparam com a repressão em que vivem, começam a sonhar em deixar seu país e migrar para outro onde possam gozar de liberdade de pensar, de opinar, de se deslocar e de empreender. Dentre as ditaduras que estão sentindo essa rebelião interna está a de Cuba. A propósito, a Folha de São Paulo publicou no domingo último uma matéria muito interessante, mostrando o caso de um casal de cubanos que migrou para o Brasil, vindo se somar a um contingente que faz com que os cubanos se constituam na segunda nacionalidade que mais pediu asilo no Brasil. A primeira, logicamente, é a dos venezuelanos.

De janeiro a novembro foram 4.241 solicitações de cubanos. Os números foram levantados pelo Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra), com base em dados oficiais, a pedido da Folha. A matéria relata que Cuba vive uma das piores etapas da crônica crise econômica agravada pela queda de receita durante a pandemia e pela reforma cambial conduzida pelo regime. Estive em Cuba dois anos antes de estourar a pandemia e, quando a internet há muito já bombava pelo mundo, os cubanos estavam apenas engatinhando na sua utilização. Tanto que tive muita dificuldade em mandar minhas matérias para a Rádio Guaíba e para o Correio do Povo. O sonho da maior parte dos cubanos com ensino superior era trabalhar de garçom em Varadero. Na ocasião, o salário mais alto, de um advogado, engenheiro, economista etc era de 30 dólares. Conversei com um engenheiro que disse preferir trabalhar ali naquela praia como garçom por causa da gorjeta. Ganhando um dólar por dia já dava um salário igual. Só que ganhavam muito mais que isto.

Na ocasião também vigorava o peso novo cubano, implantado para as atividades que lidam com o turismo. Valia mais que o dólar americano, o qual comprava apenas 80 centavos de peso novo. Uma irrealidade que não tinha como se sustentar. Ainda mais quando veio a pandemia, o que implicou numa perda drástica no poder de consumo. Para tentar amenizar os problemas, o governo implantou o que foi chamado de “tarea ordenamiento”, um plano para unificar as moedas. A medida virou um gatilho inflacionário e o peso cubano só foi perdendo poder frente ao dólar. Ao ser lançado esse programa os cubanos precisavam de 24 pesos para comprar um dólar. Ao encerrar o ano passado, em decorrência da inflação galopante, já superava os 100 pesos por um dólar. Foi com esse cenário de fundo que se deram os protestos de julho de 2021, inéditos na história do país e que, como acontece com todo o regime ditatorial, foram reprimidos pela força e seus líderes presos. E por tudo isto também que os cubanos estão fugindo.

Este detalhe de que quem mais foge para o Brasil são cubanos e venezuelanos é preciso ser levado em conta para o atual governo, altamente simpático às ditaduras daqueles dois países. Não é por aí o nosso caminho de inserção no contexto social, político e econômico mundial. E espera-se que o governo não faça com os que agora estão chegando, em desespero, o mesmo que o então ministro da Justiça Tarso Genro fez com dois boxeadores cubanos que pediram asilo no Brasil. Devolveu-os à ditadura cubana.


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