Custos altos afetam plantio da cebola

Custos altos afetam plantio da cebola

Implantação do bulbo por hectare subiu cerca de R$ 5 mil em relação à safra passada, o que pode influenciar na área total plantada no Rio Grande do Sul, onde 100 municípios garantem a produção de 54 mil toneladas

Por
Angélica Silveira

O aumento dos custos de produção de cebola na safra de 2022 acabou criando mais dificuldade para os produtores do bulbo. No Rio Grande do Sul, mais de 100 municípios produzem cebola, entre os quais Rio Grande, Tavares, Mostardas, Canguçu, Ipê e Nova Prata. O maior produtor do Estado é São José do Norte, na Região Sul, com 1,8 mil hectares de área plantada e mil famílias envolvidas no cultivo da cebola. O cultivo do alimento é feito predominantemente por agricultores familiares, em áreas inferiores a dois hectares. 

Segundo a Emater/RS-Ascar, todos os produtores de São José do Norte terceirizam mão de obra no transplante e na colheita. No momento, os produtores estão no final da época propícia para a semeadura. O transplante ocorre em julho, e a colheita, por fim, em novembro. A expectativa é que sejam colhidas 54 mil toneladas de cebola neste ano. Conforme o chefe do escritório da Emater no município, Pedro da Silva Farias, os custos da produção aumentaram cerca de 25% de uma safra para a outra, ou seja, de R$ 20 mil para R$ 25 mil por hectare. “Os produtores gastam com sementes, adubos químicos, óleo diesel, máquinas, ou seja, muitos itens têm matéria-prima ou componentes importados, o que a conjuntura econômica global, a alta do dólar, a pandemia de coronavírus e a guerra na Ucrânia acabaram influenciando”, explica o extensionista. 

Farias relata que a alta dos custos motivou os agricultores a reduzir a área plantada. “Mas não é nada significativo, pois os preços compensam em parte desta safra, além de ser forte a tradição do cultivo da cebola em São José do Norte. Acredito que nesta safra sejam mantidos os 1,8 mil hectares”, projeta. A variedade mais plantada é a bola precoce, com 40% da área plantada, mas também há locais onde são semeadas as variedades juporanga, valessul, superprecoce e roxa. 

O extensionista lembra que o cultivo da cebola depende do clima. “Principalmente pelo efeito da umidade do ar na ocorrência de doenças fúngicas. A mão de obra precisa ser contratada nos picos de transplante e colheita e está cada vez mais escassa”, comenta. Para ele, as maiores dificuldades são os custos e a predominância de dias úmidos para o produtor. Já para o consumidor, a influência é a oferta nacional que determina a elevação ou não dos preços. Por não ter estrutura para armazenagem adequada, tudo que é colhido é comercializado. A safra passada, conforme o técnico, foi positiva em qualidade e quantidade, mas a rentabilidade foi afetada pelo aumento dos custos. São José do Norte produz 40% da cebola gaúcha, seguido pelos vizinhos Rio Grande e Tavares. A Serra Gaúcha tem produção importante, distribuída em muitos municípios de menor área. A produção de São José do Norte é destinada a cidades do nordeste e do sudeste brasileiro, sendo a menor parte para o mercado local.

O produtor de cebolas de São José do Norte Valério do Santos Scott Hood, de 44 anos, afirma que, mesmo com todos os problemas, não pretende deixar de plantar o tubérculo. A plantação de 3,5 hectares está instalada na localidade de Oriente, a 20 quilômetros da sede do município. Além da cebola, a resina de 17 mil árvores de pinos completa a renda dele e da família. “O meu carro-chefe é a cebola, o pinus é só um complemento”, destaca. Neste ano, o produtor teve de enfrentar a perda na semeadura precoce em razão da chuva e do vento que atingiram a região no final do mês de maio. “Apesar de ser 20% do total que a gente produz, neste ano em razão do clima perdemos 70% do que foi plantado de semeadura precoce. Como tem uma época certa para plantar, não tivemos como recuperar”, lamenta. 

Hood reclama que o principal problema deste ano é realmente o aumento dos custos da produção. Tanto que ele acha difícil projetar o preço de venda, o que deve ocorrer a partir do mês de novembro. “Se formos vender abaixo de R$ 1,50 o quilo, com certeza teremos prejuízo”, observa. “Entre altos e baixos, é mais lucrativo que trabalhar no comércio informal, por exemplo. Também a qualidade de vida no campo é muito melhor”, destaca, afirmando que ele a esposa, Lidiane, são felizes como cebolicultores.

Produtor reclama de preço baixo no campo

Agricultor da Ilha dos Marinheiros, em Rio Grande, na região sul do Estado, diz que cebola sai da propriedade por R$ 1,50 o quilo e chega ao supermercado para o consumo por até R$ 7,00 o quilo

Em Rio Grande, na região sul do Estado, aproximadamente 120 agricultores cultivam cebola em uma área plantada de 210 hectares. Conforme a Emater/RS-Ascar, a área da cultura só é menor que a destinada ao arroz e à soja. Em agricultura familiar, a cebola é a hortaliça mais cultivada no município.

Um dos produtores rio-grandinos é Fábio Leonidas Gonçalves Carvalho, de 56 anos. Ele planta cebola em uma área de três hectares da Ilha dos Marinheiros. O agricultor também cultiva outras verduras e legumes que comercializa em feira livre na cidade. Carvalho tem como cliente, que utiliza seus produtos nas escolas. Ele conta que ajudava o pai no cultivo de cebola desde os 10 anos de idade. “A agricultura passou de pai para filho desde o meu avô. Atualmente, minha esposa (Magda Carvalho) me ajuda aos finais de semana, pois ela é funcionária pública municipal, e meu filho de 12 anos, quando não está estudando”, relata. 

Carvalho avalia a safra passada como ruim. “Ainda tenho em torno de 10 toneladas de cebola que não vendi. Está armazenada no galpão para vender mais tarde, pois o preço normalmente sobe no fim da safra”, projeta. O agricultor ressalta que no início da comercialização da safra teve cebola vendida a R$ 0,50 o quilo. Atualmente o preço subiu para entre R$ 4,00 e R$ 4,50. “O aumento acontece porque finda a produção daqui, fica só o que vem de outros estado,s como Minas Gerais e São Paulo, e também da Argentina”, afirma. 

O plantio de Carvalho é, em geral, da variedade de cebola crioula, segundo ele, a mais resistente e que aguenta mais tempo no galpão sem adquirir fungos. Na safra passada, o cebolicultor conseguiu colher 55 toneladas do produtos, número que deverá se repetir em 2022. “Este ano, com o preço dos insumos, como adubos e agrotóxicos, que triplicaram, acredito que não será possível vender tão barato como ocorreu na safra passada”, diz. Carvalho recorda que na safra de 2021 um saco de 50 quilos de adubo custava cerca de R$ 80,00, valor que subiu para aproximadamente R$ 400 neste ano, mas garante que mesmo assim seguirá no cultivo. Ele, entretanto, não aconselha as pessoas a trabalharem na agricultura, pois a profissão é pouco valorizada. “Pela minha idade não vou mudar o rumo da vida, mas tranquilamente deixaria a agricultura por outra profissão, pois se trabalha muito e é muito pouco valorizado. Hoje as pessoas só reclamam do preço e não sabem o que custa produzir um produto de qualidade”, observa.

Ele acredita que a agricultura não terá continuidade em sua família, pois o filho está estudando. “A agricultura não é vista como um serviço, mas dá muito trabalho, então tendo oportunidade de estudar é o que tem que fazer para sair desta vida”, destaca.

Para o agricultor, quem ganha com a produção agrícola são os mercados e os grandes atacadistas, e o consumidor não consegue ter a noção disto. “A cebola sai a R$ 1,5 o quilo do campo e chega ao supermercado por quase R$ 7. O agricultor é quem está trabalhando, levantando às 4 horas no frio, sem fim de semana, e é o que menos ganha em toda a cadeia até o consumidor”, finaliza.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895