Final feliz após 90 dias

Final feliz após 90 dias

Com 33 anos e grávida de seis meses, Andressa esteve entre a vida e a morte depois de desenvolver um caso grave de Covid-19

Por
Felipe Samuel

Em meio à tragédia do novo coronavírus no Brasil, que já provocou mais de 551 mil mortes em 16 meses de pandemia, surgem histórias de pessoas que venceram a Covid-19. É o caso da cabeleireira Andressa Rodrigues Ferreira, 33, que contraiu a doença em março e passou 75 dias lutando pela vida na UTI do Hospital Nossa Senhora da Conceição. Depois de superar a doença e retornar para casa, na Zona Norte da Capital, ela publicou um vídeo emocionante nas redes sociais agradecendo o apoio da família e daqueles que torceram por sua recuperação.

O drama da família começou dia 25 de março, quando Andressa - que estava no sexto mês de gestação de uma menina - deu entrada no hospital. Por conta das complicações da doença, que evoluiu rapidamente para os pulmões, no dia 31 de março, a equipe médica decidiu fazer uma cesárea de emergência. A pequena Louisy nasceu com 1,07 quilo, mas sofreu complicações após o parto e acabou encaminhada para a UTI Neonatal. “É um prêmio, no final das contas, saber que conseguiu sobreviver, pois não tinha o que fazer. Os médicos perguntaram ao meu marido, se ele tivesse que escolher alguém, quem queria salvar, porque era difícil salvar as duas”, lembra.

O nascimento de Louisy representava a primeira parte de uma história feliz para o marido, Deividi de Moraes Fagundes, 35, e a filha Yasmim, 10. Mas a batalha de Andressa seguiria pelos próximos dois meses, quando chegou a ficar com 80% dos pulmões comprometidos. Entre outras coisas, teve infecção generalizada, passou por hemodiálise e traqueostomia, além de ficar um bom tempo intubada. “Meus rins pararam, tive trombose, hepatite medicamentosa.” Como seguiu trabalhando e “não cuidava muito” da prevenção, ela não sabe como contraiu o vírus.

Luta contra as sequelas

Uma dor de garganta e a perda do paladar indicaram que poderia ter sido infectada pela Covid-19. Depois de fazer exames e ter diagnóstico positivo para o novo coronavírus, começou quarentena. Mas o quadro de saúde piorou e acabou se deslocando ao hospital. “Fiquei intubada, passei mal. Passei ligando para o meu marido pedindo que fosse sedada. Não lembro como fui para a UTI”, afirma. Ela explica que foram 90 dias de internação entre leito de UTI e leito clínico. Praticamente um mês após receber alta hospitalar, Andressa ainda sofre as sequelas deixadas pela doença.

Por conta disso, faz fisioterapia todos os dias. “Hoje já ando sem o andador, vou meio tortinha, mas sem andador”, explica, em referência ao aparelho que usou nos primeiros dias após retornar para casa. “Devo voltar a trabalhar no período de dois a três meses, pois caminho um pouco e sinto um pouco de falta de ar”, relata. Uma das limitações provocadas pela Covid-19 é a impossibilidade de amamentar. “Não pude amamentar por causa da fraqueza”, recorda. O suporte do marido, da família, da equipe médica e dos amigos jamais será esquecido. “O Deividi passou um sufoco, a cada dia descubro uma coisa”, assinala.

História com final feliz

No período de internação da esposa, Deividi, que é guarda municipal em Gravataí, pediu dois meses de licença. Além de tocar a casa e visitar a filha na UTI Neonatal, administrava o salão de beleza da esposa com mais um funcionário. “A Andressa ficou muito tempo sedada. Foram 28 dias intubada”, destaca Deividi, acrescentando que a traqueostomia permitiu melhorar a respiração. “Nossa história teve final feliz, por isso fazemos questão de divulgar. Quando a gente estava em uma fase complicada, buscava informações de pessoas que passaram por uma fase complicada e se recuperaram. Lembrava de um senhor de 60 anos que ficou internado e teve alta. Usava esse exemplo de alento para buscar forças.”

Durante o período de internação, Deividi, na companhia de Yasmim, buscava forças para seguir em frente. “Ela me dava apoio. Entendeu (a situação) e não se desesperou. Nos deu força, sempre ficou calma, tranquila”, destaca. No dia da alta hospitalar, o sentimento era de felicidade. Ele recorda que a chefe da UTI Neonatal, Cátia Rejane Soares, sempre disse que o caso era grave. “Elas (Andressa e Louisy) saíram juntas do hospital. Todo mundo fala que é uma segunda data de nascimento. A Andressa ainda não tem noção, está em fase de reabilitação”, completa. O apoio dos colegas da GM de Gravataí também foi fundamental. Um grupo formado no Whats App era responsável por atualizar todos da situação clínica de mãe e filha.

Batalha pela sobrevivência

Sem poder acompanhar os primeiros meses de vida da pequena Louisy, os pais tiveram o suporte de Cátia. "Elas ficaram muitos meses internadas conosco. A Louisy nasceu com 1 quilo e foi um caso bem complicado, grave, pois o bebê teve que nascer em condições que não são ideais. Houve várias complicações, como prematuridade extrema. Foi uma batalha muito grande para a nossa equipe, em um primeiro momento, para que ela sobrevivesse", assinala. Cátia lembra que, naquele período, o hospital, por ser referência em gestação de alto risco, tinha alta demanda por atendimento.

“O pai fez muita diferença, porque, em geral, na internação da UTI Neonatal, contamos com as mães, que vão para amamentar, tirar leite, mas, nesse caso, não tinha a mãe. E o pai fez esse papel de presença muito forte”, destaca. “Foi muito gratificante para a nossa equipe o momento da alta, muito emocionante", lembra. “Ela disse que para a família deles eu era a 'segunda mãe' da Louisy. Aquilo foi para mim o momento de muito alegria, um dos mais intensos da minha carreira, porque tem todo contexto da doença, da dificuldade emocional de toda equipe para lidar com isso.”

Apesar do simbolismo da saída das duas pacientes no mesmo dia, Cátia lembra que a alta hospitalar da dupla foi mera coincidência. "No dia que a gente estava começando a programar a alta dela (Louisy), nos demos conta de que teriam alta juntas. Jamais iria imaginar isso, de dar essa coincidência. Todo mundo chorou, foi muita emoção", frisa.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895