Inclusão polêmica

Inclusão polêmica

Entidades avaliam que declarações do ministro vão na contramão de ações de inclusão no país

Por
Maria José Vasconcelos e Vera Nunes

A Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla 2021, em agosto último (21 a 28/8), integra o calendário do país pela Lei 13.585/2017. Visa informar e conscientizar sobre condições, potencialidades e necessidade de inclusão da pessoa com deficiência. Mas, neste ano, a data foi marcada por “ruído”, que, até agora, tem rendido explicações do ministro da Educação Milton Ribeiro. Além disso, a “Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida”, instituída pelo governo federal em setembro/20, tem o respectivo decreto (10.502/2020) sob análise de mérito no Supremo Tribunal Federal.

Apesar de o Ministério da Educação (MEC) destacar que a política para o setor pretende ampliar o atendimento educacional especializado a mais de 1,3 milhão de estudantes no país e garantir às famílias e ao público da Educação Especial o direito de escolher em que instituição de ensino estudar (escolas regulares inclusivas, escolas especiais ou escolas bilíngues de surdos), as indefinições do texto do decreto e as recentes declarações do ministro – afirmando que “a inclusão de alunos com deficiência atrapalha o aprendizado de outras crianças sem a mesma condição” – em nada colaboram para a superação de barreiras e inserção social. Além de lhe render representação do PSOL no Ministério Público Federal, pedindo investigação pelas polêmicas declarações, quando também afirmou que, em alguns casos, é “impossível a convivência”, Ribeiro ainda precisou se explicar (em 1°/9) na Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados e, agora, a Comissão do Senado também quer ouvi-lo. Por conta das polêmicas, o MEC já havia divulgado duas notas de esclarecimento.

Na Câmara, Ribeiro pediu desculpas e se comprometeu em buscar, juntamente com parlamentares, uma redação mais clara para artigos da Política Nacional de Educação Especial e reforço orçamentário à Educação Especial. Para a presidente da Comissão, deputada federal Rejane Dias (PI), o polêmico comentário está superado, pois “o ministro pediu desculpas e disse que foi uma fala muito infeliz”.

Mesmo que a adesão dos entes federados à nova política seja voluntária, a Undime (que congrega os dirigentes municipais de educação do país) avalia que o decreto repassa às famílias o poder de escolha entre escola regular ou especial. Considera que é preciso fortalecer o sistema educacional inclusivo, com investimento em formação e qualificação docente, metodologias e estratégias para atender as singularidades dos estudantes, materiais pedagógicos, estrutura de acessibilidade, transporte adaptado, entre outras ações. E alerta que, caso a família decida pelo atendimento especializado, deve ser complementar à escola regular.

Já com a Lei 14.191/21, recém-sancionada (3/8), o presidente Jair Bolsonaro define a educação bilíngue de surdos como modalidade de ensino independente. O texto modifica a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), para estabelecer como educação bilíngue aquela em que a Língua Brasileira de Sinais (Libras) é considerada primeira língua, e o português escrito, como segunda língua. A lei teve origem e foi aprovada no Senado, seguindo para a Câmara dos Deputados, que aprovou o texto e o enviou ao Executivo em julho. A medida deve ser aplicada em escolas bilíngues de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns ou em polos de educação bilíngue de surdos, beneficiando alunos surdos, surdos-cegos, com deficiência auditiva sinalizante, surdos com altas habilidades ou superdotação ou com outras deficiências associadas que tenham optado pela modalidade bilíngue. Haverá serviços de apoio educacional especializado, como atendimento educacional bilíngue, para atender às especificidades. Em regime de colaboração, o governo federal prevê apoio técnico e financeiro e os sistemas educacionais devem desenvolver programas integrados de ensino e pesquisa.

Já o Senado aprovou, por unanimidade, em 17/8, o projeto de lei 2.201/21, que prioriza a matrícula de crianças e jovens com deficiência em instituições educacionais públicas e garante acesso a material didático adequado às respectivas necessidades. A medida inclui instituições de ensino Infantil, Fundamental e Médio mantidas ou subsidiadas por verbas públicas. O projeto, da senadora Nilda Gondim (PB), segue à Câmara dos Deputados.

Ações em destaque

  • Monitoria: Criado em agosto de 2018, o projeto “Monitoria Intercultural: Inserção de Discentes Indígenas e Haitianos na UFFS/Campus Erechim” busca garantir espaços de socialização, intercâmbio, diálogos, colaboração e apoio pedagógico entre a comunidade acadêmica e estudantes indígenas, haitianos e com deficiência. Experiência vivenciada neste projeto consta no e-book “Diálogos em educação inclusiva”, com acesso gratuito aqui.
  • Congresso: Promovido pela Área do Conhecimento de Humanidades e pelo Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS), o congresso “Educação para Além da Diferença” segue até 21/10, on-line, via Youtube, com conferências, mesas-redondas e oficinas. É voltado a professores públicos e privados dos ensinos Infantil, Fundamental e Médio, além de atendentes e monitores da Educação Infantil. Inscrições gratuitas aqui.
  • Documentário: “Independência Além das Barreiras” retrata a vivência profissional de três surdos na pandemia, adaptações, apoios e dificuldades em suas trajetórias. A produção integrou a 24ª Semana Municipal da Pessoa com Deficiência, em uma iniciativa Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social de Porto Alegre, em parceria com a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (e a Sociedade dos Surdos do RS). Acesso aqui.
  • Carteira de Vacinação: O deputado estadual Faisal Karam protocolou o Projeto de Lei 280/21 sobre fornecimento de carteiras de vacinação em braile. O PL busca contemplar usuários do SUS com deficiência visual. Faisal destaca a importância da inclusão, igualdade e acessibilidade. E, segundo o PL, quem possui a carteira de vacinação tradicional poderá ter a versão em braile atualizada com dados de imunizações anteriores.
  • Apaes: Na abertura da exposição alusiva à Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, em 24/8, na AL, na Capital, o presidente da Frente Parlamentar em Defesa das Apaes, deputado Paparico Bacchi, em parceria com a Federação das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais do RS (Feapaes), destacou que as Apaes são indispensáveis e reivindicou ao Estado a destinação de R$ 2 milhões às Apaes do RS. 
Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895