Lições sobre racismo

Lições sobre racismo

Livro e curso gratuitos reúnem planos de aula que estimulam práticas antirracistas no cotidiano escolar

Por
Vera Nunes

Ampliar a discussão sobre o racismo para além de uma data comemorativa e fazer com que todos professores (negros ou não) se apropriem da discussão do tema em sala de aula. Esses são, pelo menos, dois desafios das irmãs Carolina e Fernanda Chagas Schneider, que, recentemente, por meio da Fundação Telefônica Vivo, lançaram o livro “Escola para Todos: promovendo uma educação antirracista”. A obra reúne um acervo de práticas educacionais elaboradas por educadores de diferentes etapas da Educação Básica de diversas regiões do Brasil e é fruto de inúmeras edições do curso homônimo disponível na Plataforma Escolas Conectadas, que oferece uma formação continuada de professores nessa temática.

Nascidas em Porto Alegre, Carol e Fernanda são irmãs, frutos de um casamento inter-racial, e se aproximaram da temática antirracista a partir do ponto de vista da própria experiência Hoje, ambas trabalham na periferia da Capital e com crianças que partilham dessas mesmas questões. “Eu sou uma das primeiras professoras que entraram por cotas raciais, no primeiro concurso realizado em 2003, quando a lei das cotas foi aprovada”, afirma Carol, lembrando que o risco de sua conquista ser invalidada, devido ao questionamento do Tribunal de Contas do Estado à legislação, na época, deu início a todo o trabalho desenvolvido depois.

As autoras do livro. Foto: José Augusto Schaedler / Especial / CP

Ação Afirmativa

Carol e o grupo de professores que ingressou sob as mesmas condições criaram um coletivo para fazer frente ao questionamento da constitucionalidade das cotas. “Esse coletivo entendeu que, como havíamos utilizado uma política de ação afirmativa, nada mais justo que implementássemos uma ação afirmativa, que é a Lei n° 10.639/2003”, recorda. A lei a que ela se refere é a que torna “obrigatório o ensino de história da África e da cultura afro-brasileira em todos os níveis de ensino, tendo como conteúdo programático o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à história do Brasil”.

Apostando na formação continuada, Carol passa a fazer parte do grupo Cangerê, que trabalha com formação antirracista. E a irmã, Fernanda, defende sua tese sobre Informática na Educação Especial. Foi nesse contexto que elas foram procuradas pela Fundação Vivo para um trabalho na Plataforma Escolas Conectadas, uma iniciativa reconhecida internacionalmente. Em 2020, foi o único projeto brasileiro a receber o Prêmio Unesco-Hamdan Bin Rashid Al-Maktoum de Melhores Práticas e Desempenho no Aprimoramento da Eficácia de Professores. Também conquistou, em 2021, o World Summit Awards, importante prêmio internacional na área digital, na categoria Aprendizagem e Educação, da edição Brasil.

Capa do livro. Foto: Divulgação / CP

As irmãs aproveitaram o contato e apresentaram a proposta do curso antirracista, que passou a ser oferecido pela plataforma e hoje já tem mais de quatro mil professores certificados. “A formação pela plataforma tem dimensão muito maior, nós atingimos pessoas que jamais conseguiríamos presencialmente. É um curso inicial, de sensibilização, mas se a pessoa for atrás, eu tenho certeza: isso muda a sala de aula”, garante Carolina.

Implementação da lei

Fernanda concorda com o poder de disseminação da plataforma Escolas Conectadas. Ela percebe que a educação antirracista hoje está muito a cargo do professor negro, “como se fosse uma temática exclusiva. E a gente acredita que esse cenário só vai mudar quando todos os professores, independentemente da sua etnia, fizerem a sua parte”, observa. “A lei já tem quase 20 anos, e a gente não vê uma mudança significativa. Nosso curso é essa sementinha, para que o professor se instrumentalize e implemente a lei na prática”, acrescenta. Fernanda destaca a importância da discussão não ficar restrita às datas comemorativas. “Uma educação antirracista vai acontecer se ela fluir durante todo o ano. O professor não precisar parar sua aula para abordar esse tema, ele deve estar inserido no currículo e, assim, estaremos implementando uma educação mais plural, mais diversa, fazendo com que aquela criança negra ou indígena que está em sala de aula se veja refletida. E isso é muito importante.”

Formação On-Line

A formação “Escola para Todos: promovendo uma educação antirracista” tem carga horária de 50 horas, em modalidade mediada pelas autoras, até 25/10, com certificação emitida pela Universidade Estadual do RS (Uergs). As inscrições podem ser realizadas pela plataforma escolasconectadas.org.br, até 3/10. Assim como o curso, a publicação impressa também é gratuita e está disponível em formato digital aqui

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