Novo Piso do Magistério em meio à polêmica

Novo Piso do Magistério em meio à polêmica

Sindicatos alegam que a regra que vincula o reajuste com o valor por aluno segue valendo, e municípios afirmam que, com a aprovação do novo Fundeb, a vinculação perdeu a validade e defendem a criação de outro índice de atualização

Presidente Bolsonaro e ministro Milton Ribeiro (D) assinaram, dia 4/2, a Portaria que eleva o Piso Nacional do Magistério, de R$ 2.886 para R$ 3.845. Conforme a SEC/MEC, beneficiará 1.726.099 professores de todo país

Por
Vera Lucia de Souza Nunes

O novo Piso Salarial Nacional dos professores da rede pública, cuja portaria foi assinada nesta sexta-feira (4/2) pelo presidente da República Jair Bolsonaro e pelo ministro da Educação Milton Ribeiro, é alvo de polêmica, com ameaças judiciais e pedidos de retratação. O reajuste de 33,2% foi anunciado dia 27/1, por twitter, pelo presidente, e festejado como a maior correção salarial concedida à classe, desde o surgimento da Lei do Piso, em 2008. Segundo a Secretaria de Educação Básica (SEB) do Ministério da Educação (MEC), 1.726.099 docentes serão beneficiados no país.

O valor, que aumentará, de R$ 2.886 para R$ 3.845, é contestado pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), que alega gerar impacto de R$ 30 bilhões nas contas das prefeituras, dificultando a situação fiscal e “inviabilizando” a gestão da educação no Brasil. Uma nota, assinada pelo presidente da entidade Paulo Ziulkoski, critica o movimento em ano eleitoral e afirma que a entidade “vai acompanhar a discussão do tema no âmbito jurídico”. Após a assinatura da portaria, a CNM voltou a criticar: “O anúncio reforça a falta de planejamento e comunicação dentro do próprio governo, bem como demonstra que a União não respeita a gestão pública no país”, destacou.

A manifestação foi rebatida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e, para o seu presidente, Heleno Araujo, “segue valendo a vinculação do valor por aluno, que, em 2022, subirá 33%. Também em nota, a CNTE repudiou “as descabidas e criminosas orientações da CNM (...)”. E afirmou que “formalizará denúncia ao Ministério Público (MP), para que as condutas do dirigente e da entidade sejam devidamente apuradas. Caso haja omissão ou demora do MP, ou não havendo retratação da CNM e de seu dirigente em relação à referida nota, a própria CNTE acionará a Justiça”. . 

Índice polêmico

Toda a discussão está centrada no índice de reajuste. Sindicalistas, congressistas e especialistas alegam que a regra de 2008 (Lei 11.738/2008) continua válida, até que outra lei seja aprovada no Congresso. Já entidades como CNM, Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed), União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), entre outras, defendem outra fórmula de correção. Se o reajuste de 33,2% não for aplicado, as organizações trabalhistas ligadas aos professores prometem ir à Justiça, diante do argumento que a lei não foi revogada. No RS, entidades como o Cpers/Sindicato prometem “seguir a pressão por reposição para toda a categoria: professores e funcionários, na ativa e aposentados”. O Cpers avalia que a partir da intensa ação realizada por entidades de educadores, como a CNTE e demais filiadas; e após congelar, por dois anos, o Piso Nacional do Magistério, “o presidente Jair Bolsonaro, que havia anunciado que descumpriria a Lei 11.738, através de uma medida provisória, agora se vê obrigado a cumprir a lei conquistada em 2008 pelos trabalhadores em educação”. 

Orçamentos municipais

O presidente da Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs) e prefeito de São Borja, Eduardo Bonotto, reconhece a importância do aumento, mas defende que os investimentos devem caber nos orçamentos municipais. “Teremos, em diversos municípios, reflexos significativos que impactam na lei de responsabilidade fiscal, nos gastos com índices de pessoal. Os impactos financeiros são muito maiores que o alcance que muitos municípios podem realizar. Precisamos, urgentemente, revisar o pacto federativo: menos Brasília, mais Brasil”, considerou. A Famurs recomendou aos gestores atenção às finanças municipais, pois o ajuste pode repercutir em outras áreas, para cumprir a legislação. 

Questão política 

O professor Rubens Barbosa de Camargo, diretor da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca) e docente da Universidade de São Paulo (USP), entende que a conjugação, de aumento na arrecadação e ampliação da participação da União no novo Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (Fundeb), viabiliza o reajuste. Organizações de trabalhadores e de defesa do direito à educação seguem o mesmo entendimento e dizem que a polêmica em torno do percentual de reajuste não tem justificativa econômica, mas política.

Judicialização

Já a Campanha Nacional pelo Direito à Educação alerta para um projeto de lei em debate, que busca mudar o índice de reajuste para o INPC (10,16%, em 2021), mas ainda não foi apreciado pelo Congresso. “Se o projeto avançar, o caminho é a judicialização”, diz Andressa Pellanda, coordenadora da entidade.

Debate

  • A lei que criou o Piso do Magistério (11.738/2008) vincula, no artigo 5º, o reajuste para professores ao aumento do valor anual mínimo, por aluno, dos anos iniciais do Ensino Fundamental, do Fundeb. Esta regra tem sido aplicada desde 2009. 
  • Para 2022, o reajuste está calculado em 33,2% e deve ser pago pelos governos estaduais e municipais, aos quais os docentes estão vinculados.
  • Com base numa consulta à Advocacia-Geral da União, o Ministério da Educação (MEC) alega que, com aprovação da Emenda Constitucional 108 de 2020, marco importante para o aprimoramento do Fundeb, ficou determinada a necessidade da atualização da Lei 11.738 de 2008. Ela versa sobre o PSPN, uma vez que o normativo faz referência a dispositivos constitucionais revogados pela emenda constitucional.
  • A definição do valor acontece após um estudo técnico e jurídico do MEC, que analisou a matéria e permitiu a manutenção do critério previsto na atual Lei 11.738/2008.
  • Uma das propostas em discussão é vincular o reajuste ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), o que equivaleria a um reajuste de 4,6%. Existe a possibilidade de o MEC editar uma Medida Provisória (MP) estabelecendo um novo critério de reajuste do Piso do Magistério. Se isso acontecer, o critério da MP passa a valer imediatamente, mas só se tornará definitivo se for aprovado pelo Congresso e convertido em lei ordinária. O prazo máximo é de 120 dias e, assim, a disputa em torno do reajuste se transfere para o Congresso Nacional.
  • A Secretária de Educação Básica do MEC diz que mais de 1,7 milhões de docentes serão beneficiados com o novo Piso.
Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895