MP RS investiga suposto desvio de mais de R$ 10 milhões do Siapergs

MP RS investiga suposto desvio de mais de R$ 10 milhões do Siapergs

O dinheiro acabou nas contas de pelo menos um dos ex-dirigentes da entidade

Fabrício Falkowski

Sindicato é responsável por repassar aos jogadores de futebol do RS os valores referentes ao "Direito de Arena"

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Uma coincidência e um ofício despretensioso cujo remetente era o Ministério Público do Rio Grande do Sul acabou por encontrar um suposto desvio de mais de R$ 10 milhões no Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado do Rio Grande do Sul (Siapergs). O destino do dinheiro, que, em tese, deveria ir para os jogadores de futebol do Estado e poderia ser importante, principalmente em tempo de pandemia, acabou nas contas de pelo menos um dos ex-dirigentes da entidade. Jorge Ivo Amaral da Silva, que era vicepresidente do Siapergs, atestou os depósitos em documento assinado e registrado em cartório com data de 24 de julho de 2020. O documento surpreendeu os experientes integrantes do MP gaúcho.

Mas o processo teve início antes. No início de julho, o MP, na esteira das investigações da Operação Rebote, que esquadrinha, desde 2017, a suspeita de “organização criminosa” que comandou o Inter entre 2015 e 2016, enviou um ofício ao Siapergs pedindo algumas informações básicas sobre o funcionamento da entidade. Depois disso, Ivo Amaral solicitou que o profissional responsável pela contabilidade do Siapergs, Alexandre Felten, levantasse as informações requeridas no ofício. Para isso, Felten teve acesso às contas bancárias do sindicato e encontrou as movimentações. “Nós não tínhamos acesso às contas. Quando o MP enviou o ofício, o Ivo Amaral nos passou as contas. Foi então que encontramos os desvios”, afirmou o contador, em contato com a reportagem do Correio do Povo.

Ivo, então, registrou em cartório documento no qual confirma ser o “único gestor e exclusivo responsável por toda a movimentação bancária” das contas do Siapergs. Além disso, também informa, no mesmo documento, que procedeu a “diversas transferências” das contas do sindicato para as suas próprias. Depois disso, pediu afastamento do cargo que tinha na entidade. A motivação de tal movimento não está clara nem para a atual diretoria do Siapergs nem para o Ministério Público.

Em seguida, no dia 4 de agosto de 2020, o Siapergs, ainda sob a presidência de Paulo César Beneduzi Mocellin, reuniu-se para deliberar sobre o caso. De acordo com a ata do encontro, a qual a reportagem do CP teve acesso, a diretoria reconheceu “os desvios” de “algo superior a R$ 10 milhões, durante o período avaliado (de 2015 até a presente data)”. No dia seguinte (5 de agosto), Mocellin formalizou pedido de licença da presidência da entidade alegando “relação familiar” com Ivo Amaral. Segundo Mocellin, o afastamento “é fundamental para evitar qualquer conflito, acusação ou comentário, conferindo a maior transparência e lisura possíveis à colaboração ora em curso com o Ministério Público, no âmbito da investigação que lá se desenvolve”.

O Siapergs, então, enviou ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público um dossiê contendo as informações sobre os valores depositados nas contas bancárias ligadas a Ivo Amaral. 

O MP não comenta investigações em andamento, mas sabe-se que os investigadores estão cruzando dados e movimentações bancárias não só de Ivo Amaral como de outros dirigentes e colaboradores do Siapergs. Uma denúncia deve ser formalizada e apresentada à Justiça nas próximas semanas.

A origem dos R$ 10 milhões 

O Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado do RS (Siapergs) recebe recursos basicamente de duas fontes. A primeira são as contribuições previstas na legislação brasileira, que minguaram bastante após a Reforma Trabalhista aprovada em 2017. A outra, muito mais pujante, é um percentual dos valores pagos pelas emissoras de televisão aos clubes, que é repassada para os sindicatos de jogadores de cada Estado, que, por sua vez, calculam e pagam – ou deveriam pagar - os atletas pelo “Direito de Arena”.

O Direito de Arena é um tipo de remuneração paga aos jogadores por sua exposição nas transmissões da televisão. Tem origem na Lei de Direitos Autorais, de 1973, mas passou a ser pago somente em 2001, quando os sindicatos que representam os jogadores, como o Siapergs, venceram ações na Justiça. A questão passou por mudanças, sem, no entanto, mudar sua essência. Os sindicatos, hoje, recebem dos clubes 5% de todos os valores pagos pelas emissoras de televisão. Em seguida, calculam quanto cada atleta deve receber por cada competição, com base no número de vezes que esteve em campo.

A origem dos R$ 10 milhões que saíram do Siapergs e pararam em contas ligadas a Ivo Amaral ainda é desconhecida. O CP entrou em contato com pessoas relacionadas à entidade que se dizem surpresas com o tamanho do montante. Segundo essas fontes, o valor seria incompatível com as receitas do sindicato. Além disso, a entidade estaria rigorosamente em dia com suas obrigações com os jogadores de futebol do Rio Grande do Sul.

Sendo assim, uma hipótese é ter havido erro no cálculo de quanto valia a participação em cada partida, fazendo com que os jogadores recebessem valores menores e sobrassem recursos nas contas da entidade. Assim, os jogadores estariam sendo lesados. Outra hipótese é que as contas do Siapergs possam ter sido usadas apenas para a passagem do dinheiro, o que caracterizaria o crime de lavagem. O MP também investiga outras pessoas ligadas à gestão do Siapergs.

Contraponto

O ex-vice-presidente do Siapergs, Jorge Ivo Amaral da Silva, não atendeu mais às chamadas feitas pelo CP. No início de setembro, ele disse ao colunista Hiltor Mombach que as denúncias que motivaram a investigação do Ministério Publico teriam motivação na “guerra política” do sindicato. Ex-goleiro do Grêmio, Ivo Amaral também ocupou cargos de direção, inclusive de presidente, na Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol e, atualmente, é auditor do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). Também foi integrante da Autoridade Pública de Governança do Futebol (APFut).

O contador Alexandre Felten, que encontrou as movimentações financeiras, afirmou que “tem interesse no esclarecimento dos fatos e que desconhecia os desvios feitos por Ivo Amaral”. O atual presidente do Siapergs, Gabriel Schacht, não quis dar entrevista. Segundo Leonardo Medeiros, que atendeu ao telefone na sede do Siapergs, a atual diretoria da entidade não comentará os fatos que envolvem a antiga gestão antes do final das investigações por parte do Ministério Público.

 

 


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