A dolorosa memória de um campo nazista transformado em moradia após a guerra

A dolorosa memória de um campo nazista transformado em moradia após a guerra

Libertação do campo de concentração de Dachau chega ao 75º aniversário nesta quarta

AFP

Campo de concentração de Dachau foi libertado há 75 anos

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Jean ainda se lembra do número da tenda onde vivia com sua família, a 31 C. E da que abrigava sua escola, a 33, ou o de um bar aberto em uma antiga torre de vigia.

Jean Böhme, hoje com 73 anos, passou parte de sua infância, pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial, no antigo campo de concentração de Dachau, cuja libertação chega ao 75º aniversário nesta quarta-feira (29).

Trata-se de uma página desconhecida, mas muito real, da história de alguns campos nazistas no imediato Pós-Guerra. As sinistras barracas continuaram sendo usadas pelas forças aliadas, ou mais tarde pela nova Alemanha federal, como quartéis ou habitações, na ausência de alojamentos em outros lugares.

Alemães expulsos

Na Alemanha do Pós-Guerra, onde várias cidades foram devastadas, faltava moradia principalmente para os mais pobres. O antigo campo de Dachau, construído em 1933 e modelo para os demais campos da Europa, foi usado com essa finalidade pelo governo de Baviera, região onde está localizado.

Essas habitações precárias acolheram principalmente alemães expulsos do Leste Europeu após a derrota do III Reich, mas também havia casos particulares, como o da família de Jean.

Segundo o centro de documentação de Dachau, cerca de 2.300 pessoas viveram lá entre 1948 e 1965. Uma vez instalados, os Böhme quase nunca saíram do antigo campo que funcionava de maneira autártica.

"Havia uma escola, uma padaria, uma tenda, um bar, um local para dar trabalho às pessoas, um médico, uma igreja católica e um templo protestante. Havia inclusive um bordel!", conta Jean.

Em uma foto guardada até hoje, ele aparece sentado ao lado de uma árvore de Natal. "Certamente era meu primeiro Natal na Alemanha", afirma.

"Felizes em ir embora"

A família passaria três anos no antigo campo de concentração. "Estávamos felizes de ir embora", disse Jean. No entanto, isso não o impediu de viver muito tempo na cidade de Dachau.

"Quando recibia visitantes, ele os levava para o campo. Era algo inevitável", afirma. "Queria que vissem o que havia acontecido, o que este país foi capaz de fazer".

Jean costuma pensar em sua infância incomum, principalmente quando lê matérias sobre refugiados recém-chegados à Alemanha, com "o mesmo passado".

"Quando você tem que viver na promiscuidade, quando há pouco espaço, necessariamente haverá conflitos. Era o caso em Dachau e continua sendo o caso nos centros de refugiados de hoje", comenta Jean Böhme.

"As tendas foram destruídas, já não resta quase nada" de sua antiga casa, constata.


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