Arábia Saudita luta para virar a página no caso Khashoggi

Arábia Saudita luta para virar a página no caso Khashoggi

Jornalista foi assassinado em outubro de 2018 no consulado saudita em Istambul

AFP

Jamal Khashoggi era um jornalista colaborador do Washington Post e crítico do regime saudita

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A Arábia Saudita busca virar a página do assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, com o anúncio do veredicto final, mas esse escândalo e suas repercussões globais ainda podem assombrar o reino por muito tempo, dizem analistas.

Jamal Khashoggi, um colaborador do Washington Post e crítico do regime saudita, foi assassinado e seu corpo cortado em pedaços em outubro de 2018 no consulado saudita em Istambul, onde deveria recuperar um documento. Seus restos mortais nunca foram encontrados.

O assassinato mergulhou o reino saudita, peso-pesado regional e maior exportador de petróleo do mundo, em uma de suas piores crises diplomáticas e manchou a imagem do príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, acusado por autoridades turcas e americanas de ser o mandante do crime.

Na segunda-feira, em um veredicto final, um tribunal saudita anulou cinco sentenças de morte proferidas por este assassinato e condenou oito réus não identificados a entre sete e 20 anos de prisão. "A justiça foi feita", comemorou o jornal pró-governo Okaz.

No entanto, para os especialistas, esse assassinato e o escândalo que causou serão difíceis de esquecer, especialmente porque o reino continua a reprimir as vozes críticas. "O veredicto e as penas não traçarão uma linha definitiva no caso Khashoggi", disse à AFP Hussein Ibish, pesquisador do Arab Gulf States Institute, com sede em Washington. "No exterior, não parece que a justiça foi feita. Isso pode perseguir os sauditas por muito tempo".

Simulacro de julgamento 

Após o anúncio do veredicto final, a noiva turca de Jamal Khashoggi, Hatice Cengiz, denunciou uma "farsa". A Anistia Internacional lamentou "um simulacro de julgamento", visto que o veredicto não reconhece "o envolvimento das autoridades sauditas".

A relatora especial da ONU para execuções extrajudiciais, Angès Callamard, criticou uma "paródia da justiça". E a Turquia considerou que a decisão estava "longe de atender (suas) expectativas" e as da comunidade internacional.

Limpeza da imagem antes do G20

A Arábia Saudita, que sofre com a queda do preço do petróleo, tenta limpar sua imagem após o escândalo, no momento em que será o primeiro país árabe a sediar uma cúpula do G20 em novembro. Antes do caso Khashoggi, o príncipe herdeiro era descrito na mídia como um jovem líder moderno, em um reino ultraconservador, concedendo alguns direitos às mulheres e abrindo mais a economia.

Depois de ter negado o assassinato, e depois de ter apresentado várias versões, Riad afirmou que foi cometido por agentes sauditas que agiram sozinhos. Mas a CIA e Agnès Callamard estabeleceram uma ligação direta entre o príncipe herdeiro e o assassinato, o que Riade nega. Altos funcionários acusados de envolvimento no assassinato foram exonerados, incluindo dois assessores do príncipe herdeiro.

A comutação das sentenças mostra que "o príncipe Mohamed e o Estado saudita estão confiantes de que o mundo perderá o interesse pelo caso Khashoggi", observou Bessma Momani, professora da Universidade de Waterloo, no Canadá. "Também contribui de alguma forma para restaurar a confiança dos agentes de inteligência sauditas devido ao fato de que o Estado os apoia", apontou.

Quase dois anos após o escândalo, a Arábia Saudita espera atrair investidores estrangeiros. "Os líderes sauditas aprenderam que uma imagem de marca positiva para o país pode ser importante para atrair investimentos", segundo Bessma Momani.

Na tentativa de melhorar sua imagem em termos de direitos humanos, o reino decidiu recentemente abolir o açoitamento e a pena de morte para réus menores de idade. Mas a repressão de qualquer dissidência não diminui. Saad Aljabri, ex-oficial de inteligência exilado no Canadá, afirmou recentemente que assassinos sauditas foram enviados para procurá-lo duas semanas após o assassinato do jornalista.

Para Hussein Ibish, "ainda parece que os cidadãos sauditas, em casa e especialmente no exterior, permanecem altamente vulneráveis à intimidação, prisão e outros atos prejudiciais".


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