Bolsonaro planeja ir à cúpula climática de Biden e cobrar recursos, diz chanceler

Bolsonaro planeja ir à cúpula climática de Biden e cobrar recursos, diz chanceler

Encontro de líderes está marcado para 22 de abril

AE

Acordo entre Brasil e UE mencionado por Araújo envolve mais de 30 países

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O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, disse nesta terça-feira que o presidente Jair Bolsonaro pretende participar do encontro climático de 22 de abril com chefes de Estado e de governo organizado pelo presidente dos EUA, Joe Biden, em Washington. Araújo afirmou ainda que, na reunião, Bolsonaro deve cobrar financiamento por parte de países desenvolvidos de ações de proteção e recuperação ambiental no Brasil.

Como o Estadão já havia revelado, autoridades do governo americano pressionam para que Bolsonaro participe da Cúpula da Terra e já o haviam convidado em reuniões reservadas. Nesta terça, o chanceler brasileiro confirmou, durante entrevista, que o presidente planeja comparecer ao evento.

Segundo Araújo, o Brasil já foi convidado durante contatos de alto nível político e diplomático, embora não tenha sido enviado ainda um convite formal. Araújo relatou que o enviado especial dos EUA para o Clima, John Kerry, expressou, durante reunião virtual, a expectativa de Biden de que Bolsonaro vá ao evento. "O presidente pretende fazer parte desse esforço", disse Araújo.

O chanceler brasileiro disse que o Palácio do Planalto vai apresentar na reunião de abril sua contribuição determinada no Acordo de Paris, metas ambientais que o País se comprometeu a alcançar, e usará sua presença no fórum para cobrar financiamento por parte de países desenvolvidos de ações de proteção e recuperação ambiental no Brasil.

"Isso é aquilo que até hoje está faltando", disse Araújo, sobre o Acordo de Paris. "O acordo é extremamente ambicioso, mas continua não havendo cumprimento de compromissos na contraparte financeira, isso certamente será uma de nossas prioridades."

Durante a campanha eleitoral, Biden ameaçou impor sanções econômicas ao Brasil, caso Bolsonaro não agisse para conter desmatamento e incêndios na Amazônia. O então candidato democrata afirmou à época que reuniria outros países do mundo para pressionar o governo brasileiro e ofereceria em troca uma quantia de U$ 20 bilhões.

As declarações irritaram o presidente brasileiro, que declarou que o País não aceitaria "subornos". "Assistimos há pouco aí um grande candidato à chefia de Estado dizer que, se eu não apagar o fogo da Amazônia, ele levanta barreiras comerciais contra o Brasil", disse. "E como é que podemos fazer frente a tudo isso? Apenas a diplomacia não dá, não é, Ernesto? Quando acaba a saliva, tem que ter pólvora, senão, não funciona."

Durante a campanha eleitoral americana, Bolsonaro apostou suas fichas em Donald Trump, fazendo campanha publicamente pelo republicano, apesar dos alertas de que poderia ficar isolado caso Biden vencesse - o que aconteceu.

Em novembro, os democratas saíram das urnas mais enfraquecidos na Câmara. Antes, o partido tinha uma maioria folgada de 233 dos 435 deputados. Depois das eleições de novembro, a margem de manobra diminuiu para 221 contra 211 republicanos. Com isso, sem poder perder votos no plenário, havia o temor de que a ala mais radical do Partido Democrata pudesse influenciar a nova política externa americana.

Desde a eleição de Bolsonaro, em 2018, o presidente brasileiro vem sendo alvo de críticas de deputados democratas. Os questionamentos à política ambiental e de direitos humanos de Bolsonaro são feitos em cartas, resoluções e propostas de emenda que circulam no Congresso americano. A preocupação aumentou quando Biden indicou a deputada Deb Haaland, integrante da ala crítica ao governo brasileiro, para o cargo de secretária do Interior.

No entanto, assim que se consolidou na cadeira, o presidente americano foi aos poucos enviando sinais de que buscaria evitar atritos na relação com o Brasil. Em fevereiro, em entrevista ao Estadão, Kristina Rosales, uma das porta-vozes do Departamento de Estado americano, disse que Biden continua a ver o Brasil como um aliado, apesar de divergências com Bolsonaro. "Não é simplesmente porque os dois líderes têm forma diferente de pensar que as coisas estejam mudando para pior", afirmou a diplomata.

Biden é considerado um conhecedor do Brasil e da América Latina. Como senador democrata, ele ficou conhecido como um político conciliador e dedicado ao relacionamento internacional - foi presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado por 12 anos.

Em 2013, o democrata atuou diretamente na relação com o Brasil. Em visita a Brasília, Biden ajudou a abrir caminho para uma visita de Estado que Dilma Rousseff faria aos EUA - a viagem acabou cancelada em razão da revelação de que comunicações da presidente e da Petrobrás haviam sido bisbilhotadas pela Agência de Segurança Nacional (NSA), dos EUA.

Reaproximação

Coube a Biden, que era vice-presidente de Barack Obama, voltar ao Brasil, durante a Copa do Mundo de 2014, para aparar as arestas. Ele já havia conversado com Dilma em Santiago, meses antes, na posse de Michelle Bachelet como presidente do Chile. Na ocasião, Biden voou para Natal, com o pretexto de assistir ao jogo em que os EUA venceram Gana por 2 a 1.

Na ocasião, Biden trouxe um presente para Dilma: um lote de documentos até então secretos dos arquivos dos EUA sobre violações na ditadura militar. Os papéis reforçariam a coleta de provas da Comissão Nacional da Verdade. Os dois acabaram tendo uma boa relação - o que pode se repetir com Bolsonaro.

 


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