Governo e manifestantes avançam em acordo para saída da violenta crise na Colômbia
As partes dialogam em uma sede neutra em Bogotá
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O governo e a principal frente de protesto na Colômbia, reunidos em Bogotá nesta terça-feira deram os primeiros passos para um acordo para apaziguar a convulsão social que deixa quase 60 mortos em um mês de manifestações contra o presidente Iván Duque.
Fábio Arias, um dos porta-vozes da Comissão Nacional de Paralisação, que reúne sindicalistas, estudantes e professores, destacou que "estão em andamento ações para suspender" os bloqueios de estradas que afetam especialmente o sudoeste do país.
O gesto foi celebrado pelo governo, que exige o levantamento dos bloqueios para iniciar uma eventual negociação: "O progresso que está sendo feito para o levantamento dos bloqueios é muito importante para os colombianos", disse o assessor presidencial Emilio Archila.
Delegados de Duque e do Comitê de Desemprego mantiveram várias rodadas de negociações desde 7 de maio, sem chegar a um acordo para iniciar as negociações. Embora seja o grupo mais visível, o Comitê não reúne todos os setores insatisfeitos com a gestão do impopular Duque, que enfrenta a revolta popular um ano antes das eleições das quais seu sucessor deve emergir. No entanto, um eventual acordo com a organização é visto como um passo em direção ao fim da crise.
"Os jovens de Cali disseram que as pessoas do Comitê de Desemprego não nos representam. Não nos rendemos e não paramos até que o incêndio apague", disse à W Radio Andrés Velásquez, líder do bloqueio na cidade de Cali, epicentro dos protestos, após ouvir o apelo de um dos porta-vozes da comissão.
O governo atribui aos bloqueios a morte de dois bebês que ficaram presos em ambulâncias e perdas econômicas milionárias. "Na primeira semana (de protestos) tínhamos 800 bloqueios, hoje restam 36", disse o ministro da Defesa, Diego Molano.
Civis armados
As partes dialogam em uma sede neutra em Bogotá, quando o país ainda processa o dia mais violento da crise, desencadeada pela já descartada ideia do governo de cobrar mais impostos de uma classe média empobrecida pela pandemia.
Na sexta-feira, enquanto milhares de pessoas comemoravam nas ruas o primeiro mês do levante popular, 13 pessoas morreram em Cali, a terceira cidade da Colômbia e uma das mais afetadas pelas mobilizações e bloqueios nas estradas.
Naquele dia houve confrontos que envolveram manifestantes, agentes uniformizados e civis armados, o que levantou a preocupação de que as forças paraestatais estejam ganhando destaque na volátil conjuntura.
Em um mês de protestos, 59 pessoas morreram, segundo relatos da Defensoria e autoridades civis. O Ministério Público afirma que 20 desses casos "estão diretamente relacionados às manifestações". A Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, pediu uma investigação "independente" sobre os ataques que ceifaram vidas em Cali.
Como resultado do que houve na sexta-feira, Duque ordenou o envio de tropas para Cali e outras partes do país sob a figura de "assistência militar", que capacita o exército a apoiar as tarefas de vigilância da polícia, o que é fortemente questionado local e internacionalmente por causa do uso de força contra os manifestantes.
Garantias para protestar
Os jovens que estão nas ruas defendem um Estado mais solidário no enfrentamento ao desemprego, à evasão escolar e outros problemas causados pela pandemia, que avança de forma implacável, quebrando recordes diários de mortes e casos.
O governo e manifestantes entraram em confronto desde o início por causa da violência em torno do primeiro grande levante popular desde o acordo de paz de 2016, que levou ao desarmamento da extinta guerrilha das Farc, hoje partido político.
Os manifestantes exigem uma condenação explícita da repressão policial e "garantias para o protesto", enquanto o presidente Duque quer que os bloqueios de estradas que causam escassez e afetaram atendimentos médicos sejam levantados. As forças sociais, que se opõem à militarização, também clamam por uma rejeição explícita dos excessos da polícia.
"Não se pode continuar a assistir a vídeos nos quais a força pública atira nos manifestantes, nos quais civis atiram nos manifestantes", disse Francisco Maltés, líder sindical e porta-voz do comitê.