Caingangues desocupam área da Floresta Nacional de Canela

Caingangues desocupam área da Floresta Nacional de Canela

Oficiais de Justiça cumpriram mandado de reintegração de posse nesta quarta-feira

Halder Ramos

Grupo, que reivindica estudo antropológico da área, foi para Passo Fundo

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O grupo de caingangues que ocupava parte da Floresta Nacional (Flona) de Canela desde 16 julho deixou o local na tarde desta quarta-feira. Duas oficiais de Justiça da 4ª Vara Federal de Caxias do Sul, acompanhadas da Polícia Federal, Brigada Militar e Conselho Tutelar, cumpriram mandado de reintegração de posse. Após negociação, os 33 índios aceitaram sair, com destino a Passo Fundo. Eles queriam deixar o local, mas permanecer na cidade da Serra. Os caingangues pleiteiam um estudo antropológico para comprovar que o espaço foi habitado por ancestrais.

Conforme o delegado da Polícia Federal Luiz Antônio Bastos, houve pequena resistência inicial, mas o grupo aceitou deixar a cidade de forma pacífica. Explica que foram providenciados pela Prefeitura de Canela ônibus e caminhão para o transporte até a Funai em Passo Fundo. “Iniciamos processo de negociação para tudo ocorrer calmamente. Eles queriam deixar a área a pé e colocar as coisas na rua, mas conversamos que isso não seria uma atitude prudente. Por fim, aceitaram deixar a cidade”, conta o delegado. O cumprimento do mandado com auxílio das forças policiais foi necessário porque os índios não cumpriram o prazo para saída voluntária estabelecido pela Justiça Federal, que se encerrava à meia-noite do dia 15. Após audiência conciliatória, os índios foram notificados a desocupar a área. No entanto, eles pretendiam ficar até que o estudo antropológico fosse realizado.

Conforme Maurício Salvador, uma das lideranças indígenas, o grupo optou por ir a Passo Fundo para pressionar a fundação. “Temos a resposta por parte da Funai de que o estudo vai ocorrer. Nos deram prazo de 90 dias para realização. Outros caciques me orientaram a não desistir, me deram ânimo de que não é o fim. A luta por nossos direitos é assim: em umas horas a gente perde e em outras ganha.” O principal argumento para ocuparem a Floresta Nacional é que foi ocupada por antepassados. Atualmente, a área é administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e destinada ao manejo sustentável da flora.

O grupo descende do cacique Zílio Salvador, que faleceu em agosto de 2017. Os líderes indígenas explicam que permanecer na área é um antigo pleito do cacique. Em 2015, o mesmo grupo, liderado por Zílio, ocupou a área da Flona e fez acordo para a saída voluntária, segundo Maurício, com a promessa de que o estudo antropológico seria feito. “Saímos e o processo não andou. O medo do grupo é que isso aconteça de novo. Essa ocupação não é de agora. É do tempo do meu pai, que morreu lutando por isso. Ele sempre nos ensinou que a gente tem direito de preservar nossa cultura, que temos direito de sermos ouvidos”, afirma Maurício, filho de Zílio.

Os caingangues alegam que existem indícios arqueológicos que comprovam que a área foi habitada por caingangues no passado. Os indígenas apresentam peças de argila esculpidas artesanalmente e apontam para a existência de cavernas em meio à mata, que eram morada de seus antepassados. “Meu pedido é que eu tenha por escrito que o estudo vai acontecer.”


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