Com pressão vinda do exterior, dólar termina em alta, em R$ 5,67

Com pressão vinda do exterior, dólar termina em alta, em R$ 5,67

Bolsa fecha em baixa de 1,53%, aos 94.015,68 pontos, com perda de 3,08% na semana

AE

Moeda norte-americana acumula valorização de 2,07% nos últimos cinco dias

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O dólar terminou a sexta-feira em alta, acumulando valorização de 2,07% nos últimos cinco dias, a quarta semana seguida de ganhos, subindo 41,3% no ano. Hoje a moeda chegou a encostar em R$ 5,69 com pressão vinda do exterior, após o aumento da incerteza nas eleições americanas com Donald Trump confirmando estar infectado com o coronavírus. No Brasil, persistentes dúvidas sobre o financiamento do novo programa social do governo seguem pressionando o câmbio, hoje com a troca de farpas entre o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e o da Economia, Paulo Guedes.

O dólar à vista encerrou a semana cotado em R$ 5,6704, em alta de 0,29%. É a cotação mais alta desde o fechamento de 20 de maio. No mercado futuro, o dólar para novembro tinha ganho de 0,46% às 17h, para R$ 5,6750.

No novo capítulo sobre o Renda Cidadã, Marinho disse em call com o mercado hoje, de acordo com fontes ouvidas pelo <b>Broadcast</b>, que o programa sai "por bem ou por mal" e ainda criticou Guedes. Mais tarde, ao ouvir os relatos, Guedes chamou o colega de "desleal".

"O teto da dívida continua sendo um problema permanente", destaca a analista de moedas do banco alemão Commerzbank, Alexandra Bechtel. Ela ressalta que após a repercussão negativa de como financiar o novo programa social de Jair Bolsonaro, o governo voltou atrás sobre o uso de precatórios, mas não deu novos detalhes do que pretende fazer. Nesse cenário, será difícil o real se apreciar, mesmo se o ambiente for de procura por risco, ressalta ela.

Nesta sexta-feira, o cenário de incerteza fiscal se somou ao aumento da incerteza sobre as eleições americanas após Trump anunciar que está com covid e cancelar a campanha por 15 dias. Os estrategistas do banco ING observam que as dúvidas eleitorais vêm em um momento de preocupação redobrada com a recuperação da atividade econômica. Com isso, o dólar subiu ante divisas fortes e em alguns emergentes, como Colômbia, Chile, Turquia e Rússia.

Para o mercado doméstico, o Itaú Unibanco manteve a projeção de dólar a R$ 5,25 no final do ano. Caso a incerteza fiscal diminua e o cenário externo fique mais benigno - com recuperação das principais economias no segundo semestre deste ano - somado a um balanço de pagamentos já ajustado, o real deve se apreciar nos próximos três meses. Com o PIB voltando a crescer em 2021, há espaço para apreciação adicional do real, destaca o Itaú, prevendo o dólar a R$ 4,50 em dezembro do ano que vem. O banco, porém, faz um alerta. "Caso haja uma deterioração fiscal significativa, que resulte numa saída mais forte de capitais, o real deve se depreciar mais do que no nosso cenário."

Ibovespa

A semana chega ao fim com a notícia de que o presidente dos EUA, Donald Trump, está com coronavírus a um mês da eleição, o que pode não apenas embaralhar o cenário para 3 de novembro, mas também a definição de novo pacote fiscal no Congresso. Assim, desde cedo, a sexta-feira foi de aversão a risco em Nova Iorque e também na B3, onde o Ibovespa fechou em baixa de 1,53%, aos 94.015,68 pontos, tendo oscilado entre mínima de 93.896,61 e máxima de 95.995,70 pontos, uma variação de cerca de 2.100 pontos do piso ao teto da sessão.

Na semana, o Ibovespa acumulou perda de 3,08% e, nestes dois primeiros dias de outubro, de 0,62% - no ano, o índice cede 18,70%. Com a quinta perda semanal consecutiva, o índice iguala agora a sequência negativa do auge da crise da pandemia, entre 17 de fevereiro e 20 de março, embora naquele intervalo as perdas tenham sido incomparavelmente superiores, chegando a 18,88% no trecho final de cinco sessões. O giro financeiro desta sexta-feira totalizou R$ 23,1 bilhões.

"Parecia que ia ser o caos, mas lá fora acabou limitando um pouco. Aqui, com queda acima de 4% nos preços da commodity, não foi possível à Petrobras dar sequência à boa repercussão da decisão do STF sobre o plano de vendas de refinarias, confirmada depois do fechamento de ontem. Mas, hoje, o noticiário favorável aos bancos, sobre compulsório e consignado, contribuiu para que o setor fosse um bom contrapeso ao desempenho ruim de Petrobras na sessão", diz Ari Santos, operador de renda variável da Commcor.

A notícia de que Trump e Melania estão com Covid-19, e passam bem, foi anunciada no fim da noite de quinta-feira, em post do presidente no Twitter. "Com 32 dias para a eleição, o presidente terá que entrar em quarentena", escreveu em nota Edward Moya, analista de mercado financeiro da OANDA em Nova York, acrescentando que o vice, Mike Pence, e o secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, testaram negativo, o que não alivia o temor de que autoridades venham também a desenvolver a doença, afetando a linha de comando. "O presidente é considerado por muitos como de alto risco, podendo ter uma chance em três de hospitalização e complicações devido à sua idade e peso", acrescenta o analista.

Ainda que Trump permaneça com sintomas leves, é improvável que haja tempo para que retome agenda eleitoral em alta intensidade após o período de afastamento. No meio da tarde, a campanha à reeleição confirmou que todos os eventos serão adiados.

Em outro desdobramento negativo, um senador republicano, Mike Lee, foi diagnosticado, o que alimenta o receio de que outros congressistas venham a apresentar sintomas da doença, no momento em que o Capitólio busca solução para renovação de apoio às folhas de salário e suporte a setores como o de aviação civil. Tal combinação de notícias deixou em segundo plano dados econômicos de peso, divulgados nesta sexta-feira, como a geração de vagas de trabalho nos EUA em setembro, em desaceleração, e o índice de confiança do consumidor americano, em recuperação.

No Brasil, segue de pé o propósito do governo de levar adiante o Renda Cidadã da forma que vier a se mostrar possível, o que mantém em cima da mesa o receio do mercado quanto à preservação do teto de gastos, após o mal-estar do início da semana com a referência a precatórios e Fundeb como fontes de financiamento. A combinação de tantos fatores negativos nesta última sessão da semana resultou em elevação do dólar, inclinação dos juros e perdas para o Ibovespa, ainda que relativamente moderadas.

A cizânia entre os ministros Paulo Guedes (Economia) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) reapareceu perto do fechamento. "Se Marinho falou mal, é despreparado e fura-teto", disse Guedes, após relatos de que o colega de ministério teria feito críticas à equipe econômica em teleconferência com agentes de mercado, na qual teria indicado que o Renda Cidadã será lançado, de um jeito ou de outro. Nesta semana, Guedes também voltou a entrar em choque com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Apesar do clima azedo, quando as novas declarações de Guedes vieram a público, as perdas do Ibovespa já estavam na casa de 1,4%.

Na B3, em dia de queda aguda do petróleo, a correção em Petrobras (PN -4,18% e ON -3,86%) foi contrabalançada pelo desempenho positivo de bancos, segmento de maior peso na composição do Ibovespa. Principais retardatárias no ano, as ações do setor foram beneficiadas nesta sexta-feira por dois fatores: a ampliação de 35% para 40% na fatia do benefício de aposentados e pensionistas do INSS que pode ser comprometida em empréstimos consignados, e a decisão do BC de prorrogar até abril de 2021 a vigência da alíquota temporária de 17% dos compulsórios sobre recursos a prazo.

Assim, destaque para a alta de 1,79% na Unit do Santander (maior do Ibovespa na sessão) e de 0,82% para Bradesco PN, ambas limitando ganhos no fechamento. No lado oposto do índice, Azul cedeu hoje 5,56%, seguida por CVC (-5,28%) e Magazine Luiza (-4,19%).

Juros

Os juros futuros terminaram o dia em alta firme, com aumento dos ruídos políticos e do pessimismo com o cenário fiscal na etapa vespertina, num dia ruim no exterior. Apesar da polêmica em torno do Renda Cidadã permanecer como pano de fundo negativo, o mercado vinha relativamente sob controle até o começo da tarde, quando então as taxas passaram a subir com força em reação a declarações do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, dadas durante uma teleconferência com agentes do mercado. Nela, segundo fontes, Marinho teria sinalizado que o programa será lançado de qualquer forma, o que, na leitura dos participantes, reforçou a ideia de que o teto de gastos pode estar em risco. Ainda segundo os relatos, o ministro teria feito críticas à equipe econômica, especialmente, ao ministro Paulo Guedes.

 

Como nos últimos dias, as taxas que mais subiram hoje foram as do miolo da curva, mais sensível ao forward guidance do Banco Central e que também agora está ameaçado pela deterioração do quadro fiscal, percepção que ganhou força após a fala do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, ontem durante teleconferência do JPMorgan.

 

Nesse contexto, o mercado ampliou as expectativas de alta da Selic nos próximos meses, que agora passaram a ser majoritárias. Segundo o Haitong Banco de Investimentos, a curva projeta 60 pontos-base de alta para a taxa básica até o fim do ano, com 60% de probabilidade de aumento de 0,25 ponto porcentual já em outubro e 40% de chance de manutenção em 2%. Para o Copom de dezembro, a indicação é de 100% de chance de aperto de 0,25 ponto. Para o fim de 2021, a precificação mostra Selic em 5,5%.

 

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 fechou com taxa de 3,40%, de 3,124% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2023 subiu de 4,615% para 4,85%, com máxima de 4,95%. O DI para janeiro de 2025 encerrou com taxa de 6,71%, de 6,534% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 avançou de 7,504% para 7,60%.

 

Na teleconferência organizada pela Ativa Investimentos, Marinho teria dito que o Renda Cidadã sairá por bem ou por mal e, ainda, que foi Guedes quem propôs usar precatórios e parte dos recursos do Fundeb para bancar o programa. Na última quarta-feira, o ministro da Economia havia dito que o uso dos precatórios para o Renda Cidadã não era uma fonte saudável de financiamento. "Não haverá proposta do governo. Seria do Ministério da Economia, mas depois do que foi feito, você acha que o Bittar senador Márcio Bittar (MDB-AC), relator da PEC emergencial, vai confiar na Economia?", afirmou Marinho, na call segundo participantes.

 

As declarações de Marinho circularam nas mesas de operação e em conversas de economistas, para os quais o episódio alimenta a ideia de conflito dentro do governo. No fim da tarde, Marinho afirmou, em nota, que a reunião teve o objetivo de reforçar o compromisso do governo com a austeridade nos gastos e que não houve "desqualificações" a agentes públicos nem às propostas já apresentadas. Não negou, porém, ter dito aos participantes que o Renda Cidadã será criado "da melhor ou pior maneira".

 

Paulo Guedes também se manifestou. "Não acredito que Marinho falou mal de mim. Se falou mal, isso mostra que ele, em primeiro lugar, é despreparado, além de desleal e fura teto", disse.

 


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