Dólar fecha em queda com avanço da PEC dos Precatórios

Dólar fecha em queda com avanço da PEC dos Precatórios

Essa foi a queda mais forte desde 24 de agosto deste ano (-2,25%) e seu menor patamar desde 1° de outubro (R$ 5,3696)

AE

Moeda negociada no mercado interbancário caiu 1,80%, a R$ 5,4031 na venda

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O real exibiu de longe o melhor desempenho entre as divisas emergentes na comparação com dólar nesta quinta-feira, dia marcado por forte valorização do Ibovespa e recuo dos juros futuros. Segundo analistas, a perspectiva de que a PEC dos Precatórios passe no Senado, após ser aprovada por boa margem em segundo turno na Câmara dos Deputados, diminui a incerteza no campo fiscal e, por tabela, os prêmios de risco embutidos nos ativos domésticos. Também contribui para a apreciação do real a alta de commodities como o minério de ferro, na esteira dissipação de temores de uma crise no setor imobiliário chinês após a incorporadora Evergrande honrar pagamento de bônus e Pequim sinalizar que pode relaxar a regulação setorial.

A moeda brasileira, que havia sido muito castigada ao longo de outubro, auge das preocupações com o furo do teto dos gastos, agora se sobressai entre seus pares. Por aqui, o dólar à vista trabalhou em queda superior a 1% durante quase todo o pregão e, no início da tarde, chegou a romper o piso de R$ 5,40, descendo até a mínima de R$ 5,3926 (-1,95%). No fim do dia, encerrou em baixa de 1,74%, a R$ 5,4042 - menor valor de fechamento desde 1º de outubro, quando encerrou a R$ 5,3691.

Operadores destacam que o fluxo cambial foi pequeno devido ao feriado do Dia dos Veteranos nos Estados Unidos (com o mercado de Treasuries fechado), o que não tira a representatividade da recuperação do real. O fato é que, com a queda desta quinta, o dólar já perde 2,15% na semana. Em novembro, a moeda americana acumula um tombo de 4,28%, esboçando interromper uma sequência de dois meses de valorização (3,67% em outubro e 5,40% em setembro).

O economista-chefe da Integral Group, Daniel Miraglia, classifica a apreciação do real como um movimento natural de correção no curto prazo, estimulado pela redução das incertezas no campo fiscal. "O fato de a PEC passar na Câmara trouxe um alívio de curto prazo, porque significa que não vai se perder totalmente o controle das despesas, como poderia ocorrer sem a PEC", afirma Miraglia, que vê uma "boa possibilidade" de a proposta ser aprovada no Senado. "Estão tirando cenários piores dos preços, mas o real ainda tem um desempenho pior que seus pares em janelas mais longas."

O estrategista da Davos, Mauro Morelli, vê a recuperação recente do real não como um sintoma de otimismo dos investidores com a política fiscal, mas como uma redução gradual do pessimismo após a aprovação da PEC dos Precatórios. Ele lembra que o dólar chegou a toca R$ 5,70 e era de se esperar um recuo da taxa de câmbio à medida que diminuísse um pouco a percepção de risco. "Não vejo esse movimento como uma tendência de melhora. É mais um ajuste. A moeda brasileira ainda é uma das mais desvalorizadas do mundo e a volatilidade tende a continuar", diz Morelli, chamando a atenção para as incertezas que devem ser provocadas pela aproximação do processo eleitoral.

Em evento realizado pelo Itaú, a diretora de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos do BC, Fernanda Guardado, pontuou que houve quebra na relação entre termos de troca e formação da taxa de câmbio no Brasil e em outros países produtores de commodities - fenômeno que poderia ser explicado pela deterioração fiscal provocada pelos gastos com a pandemia. Guardado acredita que essa descorrelação pode ser atenuada com a normalização das políticas monetárias. Em todo caso, o 'modus operandi' do BC no mercado de câmbio não muda. "Só atuamos em cenários de fluxo que não consegue ser digerido por mercado, ou quando há disfuncionalidade", afirmou.

Em relação à política monetária, Guardado sinalizou que o ritmo de alta da taxa Selic em 1,5 ponto porcentual por reunião - adotado em no encontro do Copom em outubro - "ainda parece adequado", dado o conjunto de informações que o BC tem no momento. Não faltou a tradicional ressalva de que o BC pode adotar mudar de ideia caso as condições econômicas se alterem.

O principal indicador do dia deu força a quem aposta que o Copom não vai acelerar o passo em dezembro. Pela manhã, o IBGE informou que as vendas no varejo caíram 1,3% em setembro em relação a agosto (com ajuste sazonal), enquanto a mediana de Projeções Broadcast era negativa em 0,6%. Em relação a setembro de 2020 (sem ajustes sazonal), o tombo foi de 5,5%, também acima da mediana (-4%).

Na B3, o dólar futuro para dezembro fechou em queda de 1,76%, a R$ 5,41400, com volume negociado de US$ 11,2 bilhões.

Taxas de juros

A quinta-feira foi de alívio nos prêmios de risco da curva de juros. A queda nas taxas curtas foi destaque em função dos ajustes na precificação de Selic, após a surpresa negativa com a Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) e declarações da diretora de Assuntos Internacionais do Banco Central, Fernanda Guardado, reforçando a ideia de manutenção do ritmo de aperto de 1,5 ponto porcentual.

Sobre os longos, continuou reverberando o efeito positivo da aprovação da PEC dos Precatórios, com melhora nas expectativas de tramitação no Senado. Além disso, o fato de o mercado de Treasuries nesta quinta estar fechado contribuiu para evitar maior volatilidade, considerando a escalada dos yields nos últimos dias. No fechamento, porém, o recuo dos longos perdeu fôlego, com o mercado realizando lucros após quatro sessões seguidas de baixa neste trecho. Por fim, o Tesouro elevou os lotes de prefixados no leilão de títulos, mas que ainda estão bem abaixo do padrão.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 fechou em 8,45% (regular e estendida), de 8,507% no ajuste anterior, e a do DI para janeiro de 2023 caiu de 12,216% para 11,96% (regular) e 11,955% (estendida). A do DI para janeiro de 2025 saiu de 11,835% no ajuste anterior para 11,79% (regular) e 11,75% (estendida). O DI para janeiro de 2027 encerrou com taxa de 11,69% (regular) 11,64% (estendida), de 11,673%.

Um dia após o IPCA de outubro superar o teto das estimativas, os dados do varejo decepcionaram ao mostrarem quedas nas vendas mais fortes do que a mediana das projeções, em setembro ante agosto. No conceito restrito, o recuo foi de 1,3% (mediana era de -0,6%) e no ampliado, de 1,1% (mediana zero). Com inflação surpreendendo para cima e a atividade, para baixo, o cenário de estagflação parece ganhar corpo, mas a tendência é que caminhe para uma recessão caso o Banco Central tenha de apertar muito o juro para recolocar a inflação na meta.

"Os números do varejo sugerem que o BC pode optar por um ciclo mais longo em vez de acelerar o ritmo de alta da Selic para 2 pontos. Mas no meio do caminho tem o risco de o Federal Reserve antecipar o aumento de juros", afirmou o operador de renda fixa da Terra Investimentos Paulo Nepomuceno, destacando a trajetória altista da T-Note de dez anos. Nesta quinta, o mercado de Treasuries não funcionou por causa de feriado nos Estados Unidos.

A leitura do varejo provocou ajustes nas apostas de Selic para dezembro na curva e nas opções digitais na B3, com aumento da expectativa de manutenção do compasso de alta de 1,5 ponto, mas a de elevação de 2 pontos mantendo-se ainda como amplamente majoritária.

Durante participação em evento do Itaú, Fernanda Guardado mostrou confiança no plano de voo do BC para colocar a inflação de 2022 na meta de 3,5% e indicou que o ritmo de 1,5 ponto ainda está valendo, dado o conjunto de informações que a autoridade monetária tem atualmente. "Boa parte dos impactos de todo esse aperto que fizemos desde março e que sinalizamos para dezembro vai ocorrer ao longo de 2022 e em 2023, em parte", completou.

Os longos ainda estiveram sob o impacto da PEC dos Precatórios durante boa parte do dia, mas na última hora da sessão regular o fôlego de baixa se esvaiu com ajustes técnicos de posição, com a inclinação negativa se acentuando bastante desde o fim da semana passada.

Bolsa

Em sessão com forte queda do dólar à vista (-1,74%), de volta agora a R$ 5,40, e de recuperação de 4,13% no minério de ferro na China (Qingdao), que na quarta-feira havia retrocedido ao menor nível desde maio de 2020, o Ibovespa conseguiu emendar a terceira alta, de 1,54%, aos 107.594,67 pontos, alcançando nesta quinta-feira o maior nível de fechamento desde o último dia 25, então aos 108.714,55 pontos. Nesta quinta, saiu de mínima na abertura aos 105.987,86 para chegar na máxima da sessão aos 108.669,18 pontos, com giro financeiro a R$ 36,9 bilhões. Na semana, o Ibovespa avança 2,64% e, no mês, 3,96%, ainda cedendo 9,60% no ano.

Apesar da timidez da recuperação observada nessas últimas sessões, foi a mais longa série positiva do Ibovespa desde o intervalo de quatro pregões entre 5 e 8 de outubro, no qual o índice de referência da B3 já mostrava lateralização.

"O mercado seguiu repercutindo hoje a passagem da PEC dos Precatórios, da Câmara para o Senado. Embora nem tudo esteja resolvido, houve avanço, vitória em primeiro momento, aliviando a tensão e o risco fiscal que vinham pesando sobre os ativos brasileiros. Trouxe algum alívio também à curva de juros, com um pouco mais de previsibilidade depois da piora vista nas últimas semanas", diz João Vitor Freitas, analista da Toro Investimentos.

"Com a aprovação da PEC, o mercado deixou um pouco de lado a incerteza sobre o fiscal e volta a olhar para o micro, os resultados das empresas, com muitas reportando números acima do esperado, como Azul (+9,83%, segunda maior alta do Ibovespa na sessão), e algumas outras, não, como Via (-12,48%, maior perda da carteira Ibovespa nesta quinta-feira)", observa Julio Pinelli, especialista em renda variável da Delta Flow Investimentos, escritório ligado ao BTG Pactual.

"Houve uma aversão a risco mais forte ontem no exterior, um dia mais pessimista pelo 'driver' da inflação americana acima do esperado, com a ponta longa da curva de juros precificando alta para o ano que vem (na taxa de referência dos EUA). Hoje, do cenário externo, veio notícia positiva sobre pagamento de dívida pela Evergrande, com efeito para os preços de commodities, especialmente o minério de ferro", diz Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo Investimentos. Nesta quinta-feira, o desempenho foi misto no fechamento de Nova York, com o blue chip Dow Jones em baixa de 0,44% e o tecnológico Nasdaq em alta de 0,52%.

Com muitas ações e setores acumulando gordos descontos no ano, como as de varejo e bancos, é natural alguma acomodação em segmentos ainda um pouco melhor posicionados em 2021, como parte das commodities, com rotação para os papéis expostos à economia doméstica, aponta Pinelli, da Delta Flow. Contudo, o dado macro do dia, sobre as vendas do varejo, não favoreceram o desempenho do segmento. A queda de 1,3% registrada pelo varejo em setembro ante agosto foi a mais acentuada para o mês na série histórica da Pesquisa Mensal de Comércio, iniciada em 2000 pelo IBGE. O resultado sucede retração de 4,3% em agosto. Nos dois meses, a perda é de 5,6%.

"Parte dos bancos já mostra ganhos interessantes no mês inclusive pelos balanços positivos, assim como as de varejo, ambos ainda bem descontados no ano", diz Pinelli. Assim, Banco do Brasil ON avança 5,96% no mês e 3,11% na semana, ainda acumulando perda de 18,38% no ano - nesta quinta, fechou em baixa de 1,92%, na mínima da sessão.

Com a recuperação do minério na China nesta quinta-feira, o setor de mineração e siderurgia puxou os ganhos do Ibovespa na sessão, em que Vale ON avançou 3,53%, Gerdau PN, 5,99%, CSN ON, 7,46%, e Usiminas PNA, 6,24%. Na ponta do índice da B3, além de Azul e CSN, destaque também para Méliuz (+10,34%) e Banco Pan (+7,39%), à frente de Banco Inter (PN +6,33%) e Usiminas. Na ponta oposta, além de Via, destaque para Braskem (-2,94%), Taesa (-2,40%) e Raia Drogasil (-2,39%).


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