Dólar sobe 0,86%, a R$ 5,39, com mau humor externo e cautela pré-eleição

Dólar sobe 0,86%, a R$ 5,39, com mau humor externo e cautela pré-eleição

Moeda norte-americana passa a acumular ganhos de 2,80% na semana

AE

Moeda norte-americana encerrou a semana com ganhos de 2,11%

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A dobradinha formada por alta da moeda norte-americana frente a divisas emergentes, em dia de forte aversão ao risco no exterior, e reforço de posições defensivas às vésperas da eleição presidencial abalou o real na sessão desta quinta-feira. Dados da economia americana e declarações de dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) reforçaram a aposta de aperto monetário mais forte e duradouro nos Estados Unidos, o que derrubou as bolsas em Nova York e levou a alta adicional das taxas dos Treasuries.

Com o mercado externo azedo, o dólar já abriu em alta firme por aqui e ultrapassou a barreira de R$ 5,40 na primeira meia hora de negócios, registrando máxima a R$ 5,4292 (+1,49%) no fim da manhã. Com certa moderação ao longo da tarde, a moeda encerrou o dia com avanço de 0,86%, cotada a R$ 5,3955 - no maior valor no fechamento desde 22 de julho. Com isso, a divisa passa a acumular ganhos de 2,80% na semana, o que leva a valorização em setembro para 3,73%.

Termômetro do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY, que chegou a superar os 114,000 pontos nesta semana, nesta quinta recuou para a casa dos 112,100 pontos, com recuperação técnica do euro e da libra esterlina, diante da intervenção do Banco da Inglaterra (BoE) com compra de título públicos (gilts). A taxa anual da inflação ao consumidor na Alemanha acelerou de 7,9% em agosto para 10% em setembro (dados preliminares), acima do esperado por analistas (9,5%).

Nos EUA, a leitura final do PIB no segundo trimestre mostrou, como esperado, queda anualizada de 0,6%. Já o índice de preços de gastos com consumo (PCE), medida de inflação preferida do Fed, avançou à taxa anualizada de 7,3% (ante 7,1% na leitura preliminar). O número de pedido de auxílio-desemprego apresentou queda de 16 mil na semana encerrada em 24 de setembro (para 193 mil), abaixo do que esperavam analistas (215 mil).

Segundo a economista Bruna Centeno, especialista em renda fixa da Blue3, os dados dos EUA e sinais de dirigentes do Fed reforçam a expectativa de alta de juros nos EUA, o que muda a relação entre risco e retorno entre ativos, castigando bolsas e moedas emergentes. "A economia americana está ainda aquecida e a inflação, elevada. O que estamos vendo hoje é um '<i>risk off</i>' muito forte", diz Centeno, que não vê grande influência da tensão pré-eleitoral sobre os preços de ativos nesta quinta-feira.

O gerente da mesa de derivativos financeiros da Commcor, Cleber Alessie, diz que o impacto de eventual cautela pré-eleitoral sobre a dinâmica da taxa de câmbio nos últimos dias e no pregão desta quinta é muito reduzido. "O que estamos vendo é um contágio vendo de fora. Ambos os candidatos que lideram as pesquisas são mal vistos do ponto de vista fiscal. O populismo vai continuar seja qual for o resultado da eleição", afirma.

Para gerente da Commcor, o mercado global passa por um momento de rebalanceamento de ativos diante da expectativa de juros mais altos nos EUA e de possível recessão global. Esse movimento mantém o ambiente de dólar forte no mundo no curto prazo e castiga divisas emergentes como o real. "Não vejo esse dólar forte no mundo como sustentável. Nos níveis de atuais, o real está bastante atraente. O PIB do Brasil sobe, apesar do efeito base fraco, a inflação desacelera e temos ainda um carry atrativo", diz Alessie. "Sou vendedor de dólar por esses aspectos. Mas agora não adianta dar murro em ponto de faca, porque o momento é de rebalanceamento de portfólios."

Por aqui, dados positivos do Caged (abertura líquida de 278.639 vagas em agosto) e a divulgação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), acompanhada de entrevista coletiva do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, não tiveram peso relevante na formação da taxa de câmbio, segundo operadores.

Taxas de juros

O mercado de juros operou em dois tempos nesta quinta-feira. As taxas engataram alta firme pela manhã e no começo da tarde zeraram o sinal, oscilando com viés de baixa durante à tarde. A virada coincidiu com declarações do presidente do Banco Central e do diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, que reforçaram a percepção de que o próximo movimento na Selic é para baixo. Até então, pesavam sobre a curva as incertezas do cenário externo e desconforto, ainda que tardio, com o quadro eleitoral, nesta reta final antes do primeiro turno no domingo, 2. Em paralelo, o mercado teve ainda uma agenda doméstica carregada a digerir, mas nada que tivesse provocado reação nos ativos. O leilão de prefixados com lote menor evitou estresse adicional à curva.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 encerrou em 12,865%, de 12,893% no ajuste anterior, e a do DI para janeiro de 2025, atualmente o mais líquido com cerca de 600 mil contratos, passou de 11,737% na quarta-feira para 11,72%. O DI para janeiro de 2027 terminou com taxa de 11,675%, de 11,713%.

As incertezas do cenário global pesaram na etapa inicial, em meio a novas falas duras do ponto de vista da política monetária de membros do Federal Reserve e dados nos Estados Unidos que incomodaram os agentes. Na Europa, o pacote fiscal de aumento de gastos e corte de impostos no Reino Unido continua repercutindo negativamente, enquanto na Alemanha a inflação ao consumidor superou 10% em setembro, de 7,9% em agosto, em termos anuais, o que deve exigir postura firme dos bancos centrais.

No fim da manhã, a as taxas voltaram para perto da estabilidade, com viés de queda. Nas mesas de renda fixa, as falas dos membros do BC reforçaram a mensagem de que uma nova alta da Selic é bastante improvável, e para alguns deixou a impressão de que o Banco Central não estaria desconfortável com a precificação do mercado de cortes no fim do primeiro semestre.

Entre os pontos vistos como sinal de que a Selic não sobe mais, estão as menções do BC ao aperto no mercado de crédito, com Campos Neto citando o aumento da inadimplência, considerados já como efeito da política monetária. "Um pedaço do trabalho está sendo feito", disse o presidente do BC. Chamou a atenção do mercado a afirmação de que "usando a curva do Focus com corte em junho, mostramos que a gente atinge nossos objetivos".

O economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, reconhece que a curva começou a zerar a alta a partir da fala sobre os cortes, mas para ele houve certa "confusão" no mercado. "A afirmação não representa nenhum tipo de 'guide' sobre corte da Selic. Ele apenas relatou o que acontece na Focus e foi fiel à comunicação dos documentos oficiais", disse, acrescentando que, por se tratar de entrevista, Campos Neto foi "instigado" a comentar sobre cortes na taxa. "Teve um viés de seleção para o assunto", completou.

A curva, segundo a Greenbay Investimentos, mantém precificação de queda da Selic a partir de maio de 2023, com taxa projetada em 11,00% para o fim do ano que vem. Outro ponto que, na visão de Sanchez, ajudou a aliviar a curva foi o leilão de prefixados do Tesouro, com lotes menores de LTN e de NTN-F. Nas LTN, a oferta caiu de 14,5 milhões na semana passada para 7,5 milhões nesta quinta, vendido integralmente. "Especialmente o lote da 2026 foi bem menor", disse, referindo-se ao volume de 5 milhões do papel, ante 12 milhões na semana passada.

A redução dos lotes é considerada compreensível pelo mercado, numa semana de reta final das eleições. O candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, lidera há meses as pesquisas de intenção de votos à Presidência, mas só agora às vésperas das eleições os agentes parecem estar embutindo o risco eleitoral nos preços, com temores sobretudo na área fiscal de um provável governo do PT. Pesquisa realizada pela gestora Warren aponta que uma vitória do presidente Jair Bolsonaro (PL) seria o melhor cenário para os ativos de risco, de acordo com 58,4% dos agentes de mercado consultados.

Bolsa

Alinhado ao mau humor externo, o Ibovespa deu prosseguimento nesta quinta-feira à correção deflagrada no fim da semana passada. Tendo encerrado a última quinta-feira, 22, aos 114 mil pontos, em alta perto de 2% naquele dia e no melhor nível desde 20 de abril, o Ibovespa desde então teve quatro perdas em cinco sessões, considerando a pausa da quarta-feira (+0,07%).

Nesta quinta, chegou a parecer que fecharia abaixo dos 107 mil pontos, mas conseguiu conter danos no fim da tarde e ceder 0,73% no fechamento, aos 107.664,35 pontos, entre mínima de 106.243,52 e máxima de 108.448,54, correspondente à abertura. O giro financeiro foi de R$ 28,4 bilhões nesta quinta-feira. Na semana, o Ibovespa cede 3,63% e, no mês, cai 1,70%, faltando apenas a sexta-feira para o encerramento de setembro. No ano, o ganho é limitado a 2,71%.

Agora abaixo dos 108 mil pontos, o nível de fechamento desta quinta-feira foi o menor desde 5 de agosto, então aos 106.471.92 pontos naquela sessão. Em Nova York, as perdas foram a 2,84% (Nasdaq) no fechamento desta quinta-feira, após terem chegado perto de 4% no índice de tecnologia, na sessão. Mesmo com a aversão a risco desde o exterior, parte dos nomes entre os mais líquidos da B3 conseguiu escapar à correção, firmando-se em alta à tarde, com destaque para Itaú (PN +1,49%) e Bradesco (ON +1,06%, PN +0,76%).

Na ponta perdedora do Ibovespa, companhias aéreas (Azul -8,79%, Gol -8,17%), com o dólar a R$ 5,39 no fechamento do câmbio, e empresas do varejo, como Americanas (-7,41%) e Magazine Luiza (-6,47%), com a alta firme nos juros futuros observada pela manhã. Destaque também para Embraer (-6,93%), Via (-6,37%) e CVC (-6,02%). Entre as ganhadoras, além de Itaú e Bradesco, destaque também para Itaúsa (+1,26%), bem como para Eneva (+1,33%), Sabesp (+0,67%), Minerva (+0,47%) e Eletrobras (PNB +0,34%).

"As taxas de juros até que se comportaram bem por aqui (à tarde), no Brasil, fechando nos vértices de 24, 25, e também no vértice um pouco mais longo, de 27, com movimento pequeno de 4 a 5 'basis', dependendo do vértice", diz Luciano Costa, economista-chefe da Monte Bravo Investimentos. "Mas pela manhã teve alguma pressão nos juros (futuros), devido ao mercado lá fora, que não esteve muito favorável hoje, ainda nervoso com a dinâmica de atividade nos Estados Unidos - hoje, os dados de pedidos de auxílio-desemprego ficaram abaixo do esperado, em sinal de mercado de trabalho muito aquecido ainda -, o que se combinou a novas declarações de dirigentes regionais do Fed, como Bullard (St. Louis) e Mester (Cleveland), sobre a continuidade do ciclo de alta de juros no país", acrescenta o economista, destacando também a realização nas bolsas de fora, com o ambiente externo desfavorável.

Em Nova York, "o S&P 500 caiu bastante forte (-2,11% no fechamento)", diz Luiz Adriano Martinez, portfólio manager da Kilima Asset. "Há uma aversão a risco global, com duas causas principais: a alta de juros mais agressiva que o Federal Reserve está implementando na economia americana, deixando claro que vai subir os juros até que a inflação fique controlada, o que resulta em venda de ativos de risco no mundo inteiro; e há também a questão geopolítica, mais complicada com a anexação pela Rússia de áreas na Ucrânia (após plebiscito contestado pela comunidade internacional), o que leva o petróleo a ter comportamento diferente de outras commodities", acrescenta o gestor, referindo-se a potencial efeito sobre as condições de oferta.

Assim, com o petróleo em ajuste discreto na sessão, o segmento de energia caía nesta quinta à tarde menos do que a média de outros setores em Nova York, mesmo aqueles considerados mais resilientes, como o de utilities, observa Martinez. Dessa forma, Petrobras (ON +0,09%, PN +0,14%) teve efeito quase neutro no fechamento do Ibovespa, favorecido também por leve alta de Vale (ON +0,13%), firmada ao longo da tarde, bem como da maior parte dos grandes bancos, à exceção de BB (ON -0,54%).


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