Declarações de Bolsonaro derrubam bolsa, que fecha fevereiro com queda de 1,86%
Dólar fecha em alta a R$ 3,75
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Temores renovados de desidratação da reforma da Previdência, secundados por um ambiente externo negativo e a possibilidade de redução do peso de papéis brasileiros em um índice acionário global de emergentes, levaram o Ibovespa a perder a linha dos 96 mil pontos no pregão desta quinta-feira, encerrando fevereiro em queda de 1,86%. Também contribuiu para deprimir o mercado a fraqueza da retomada da economia brasileira, atestada pelo resultado fraco do PIB em 2018.
Em encontro com jornalistas nesta quinta-feira, em Brasília, o presidente Jair Bolsonaro disse que é possível uma mudança na idade mínima para aposentadoria das mulheres na proposta de reforma da Previdência. A proposta inicial fala em 62 anos para mulheres e 65 para homens. O governo poderia admitir idade mínima de 60 para mulheres. Já desconfiados em relação à capacidade do governo em articular uma base de apoio para aprovar o texto reforma sem muitas alterações, o mercado se surpreendeu ao ouvir do próprio presidente que pontos centrais da proposta, como a idade mínima, podem virar letra morta.
A percepção entre analistas e operadores ouvidos pelo Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, é a de que Bolsonaro "queimou na largada" e cedeu antes mesmo de barganhar com o Congresso. "O mercado foi totalmente influenciado por essa questão da Previdência. Ninguém gostou da ideia de já flexibilizar a proposta. Qualquer coisa que ponha em risco a economia de R$ 1 trilhão vai desagradar", afirma Pedro Galdi, analista da Mirae Asset Corretora.
Além da Previdência, operadores também citaram como fator negativo para o Ibovespa a possibilidade de que o Brasil perca espaço no índice MSCI Emergentes, que reúne papéis de empresas de países emergentes. O comitê da MSCI, provedora dos índices, estuda uma mudança na composição do indicador, que poderia ter peso maior de ações da China.
Segundo projeções, caso as mudanças sejam efetuadas, a participação do Brasil no índice, hoje em 5,8%, poderia cair para 5,5% em agosto deste ano e para 5,4% em maio de 2020. Isso levaria a uma realocação global de ativos com impactos prejudiciais para o mercado doméstico.
Com máxima de 97.528,01 pontos e mínima de 95.364,39 pontos, o índice encerrou o pregão aos 95.584,35 pontos, queda de 1,77%. A derrocada do Ibovespa veio em meio a um tombo generalizados de papéis do setor financeiro e das ações da Petrobras, sobretudo dos papéis ON.
Embora a empresa tenha reportado bons números no quarto trimestre e encerrado 2018 com lucro de R$ 25,779 bilhões, o primeiro resultado anual positivo após quatro anos, o mercado se ressentiu da perspectiva de que a empresa continue a limitar o pagamento de dividendos, após declarações do presidente da petroleira, Roberto Castello Branco, em teleconferência.
A ação ON da Petrobras fechou em queda de 2,64%, enquanto o papel PN recuou 0,07%. Para Glauco Legat, analista-chefe da Necton, o Ibovespa está sem um gatilho de alta no curto prazo, já que dúvidas sobre o andamento da reforma da Previdência tornam a relação risco-retorno, por ora, pouco favorável.
"O Ibovespa avançou bastante em janeiro. Agora, há mais fatores potencialmente negativos, como a possibilidade de que a reforma da Previdência demore a ser aprovada e não sair do Congresso do jeito que entrou", afirma Legat, ressaltando também os riscos externos, como os temores de desaceleração da economia global, em meio a dúvidas sobre um acordo comercial entre China e Estados Unidos. "O cenário para a renda variável no ano ainda é positivo, mas no curto prazo a bolsa deve ficar sem tendência", afirma.
Dólar
O dólar fechou fevereiro acumulando valorização de 2,58%, a maior alta mensal desde novembro, quando subiu 3,50%. O cenário externo mais adverso e dúvidas sobre a tramitação da reforma da Previdência foram um dos principais fatores que contribuíram para o fortalecimento da moeda americana nas últimas semanas.
Nesta quinta-feira, declarações do presidente Jair Bolsonaro em encontro com jornalistas, de que é possível mudança na idade mínima de aposentadoria e de que há "gordura" para queimar na proposta de reforma, foram mal recebidas pelas mesas de operação, que viram na afirmação sinais de que o governo pode ceder demais para aprovar o texto.
Com isso, o dólar fechou em alta de 0,62%, a R$ 3,7535, o terceiro pior desempenho entre os emergentes no mercado internacional, atrás apenas do peso da Argentina e do México. Fatores técnicos também tiveram peso na formação das cotações, principalmente até o início da tarde, quando ocorreu a definição do referencial Ptax, que será usado na liquidação e ajustes de contratos futuros de câmbio e de swap cambial. Pela manhã, o dólar operou volátil, mas firmou-se em alta na hora do almoço, quando chegaram ao mercado as declarações de Bolsonaro.
O movimento de alta continuou após a definição da Ptax, que fechou com ganho de 0,09%, a R$ 3,7385. Para o operador especializado em dólar Jefferson Laatus, do grupo Laatus, as declarações de Bolsonaro mostram que o governo está disposto a ceder antes mesmo de começar a tramitação do proposta de reforma no Congresso.
Ele ressalta que o mercado havia gostado das declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, que foi enfático ao afirmar a intenção do governo de conseguir economia fiscal de R$ 1,1 trilhão com a reforma e nesta quinta Bolsonaro já sinalizou que não deve ficar nesse valor. A fala do presidente, aliada aos problemas já mostrados de articulação do governo no Congresso, indica que não deve ser fácil a tramitação do texto, ressalta ele.
Apesar das dúvidas sobre a Previdência, os estrangeiros reduziram as posições compradas em dólar nos últimos dias no mercado futuro, aquelas que apostam na alta da moeda. Somente entre quarta e terça-feira, elas foram reduzidas em US$ 1 bilhão. Com isso, o total caiu para US$ 33,2 bilhões nesta quinta, incluindo dólar futuro e cupom cambial, segundo a B3, um dos menores volumes desde início de dezembro.
A visão das casas estrangeiras é de que haverá aprovação da reforma da Previdência este ano, apesar de alguns percalços. Nesta quinta, o banco americano JPMorgan ressaltou que segue otimista com o cenário brasileiro, por conta da promessa de Bolsonaro de medidas pró-mercado, que devem ajudar a melhorar a confiança dos agentes econômicos, com reflexos positivos no crédito e no consumo privado. O JP, porém, cortou a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil este ano de 2,3% para 2,1%, após os fracos dados de 2018.
Taxas de juros
Os juros futuros terminaram a sessão regular desta quinta-feira, 28, em alta, mais acentuada nos contratos de longo prazo. A trajetória das taxas foi definida por um conjunto de fatores, mas a agenda doméstica, que trouxe em destaque o PIB do quarto trimestre e de 2018, ficou em segundo plano.
Ajustes técnicos típicos de fim de mês, câmbio pressionado, o ambiente externo e declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre a proposta de reforma da Previdência, além do leilão grande de prefixados do Tesouro, foram os principais argumentos a justificar a postura mais cautelosa hoje do investidor. A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2020 fechou em 6,485%, de 6,450% no ajuste anterior, e a do DI para janeiro de 2021 subiu de 7,081% para 7,15%.
A taxa do DI para janeiro de 2023 fechou em 8,25%, de 8,192%, e a do DI para janeiro de 2025 avançou de 8,732% para 8,78%. As taxas estiveram em alta desde a etapa matutina. No exterior, dados fortes da economia norte-americana, em especial o PIB do quarto trimestre que teve crescimento anualizado de 2,6%, acima da mediana das estimativas (2,2%), deram força tanto ao dólar em relação a divisas de economias emergentes quanto ao rendimento dos Treasuries.
Em meio a isso, há ainda cautela geopolítica diante da frustração em relação a um entendimento entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com o líder norte-coreano, Kim Jong-un. O dólar esteve em baixa durante um breve período da manhã, mas voltou a subir ante o real no começo da tarde, quando também os juros aceleravam para as máximas.
O movimento foi atribuído a uma reação do mercado à declaração do presidente, em encontro com jornalistas, de que é possível uma mudança na idade mínima para aposentadoria das mulheres na proposta de reforma da Previdência. A proposta inicial fala em 62 anos para mulheres e 65 para homens. Por aqui, a agenda trouxe o PIB do quarto trimestre, que cresceu apenas 0,10% ante o trimestre anterior, mas em linha com a mediana das estimativas. Em 2018, a economia mostrou expansão de 1,1% ante 2017, taxa que era o piso das previsões.