Porto Alegre 250 anos: 1872-1922, mais avanços à vista

Em 1874, a primeira linha férrea liga a Capital a São Leopoldo, idealizada pelo engenheiro José Ewbank da Câmara, que, posteriormente, levaria até Novo Hamburgo. “É importante do ponto de vista do desenvolvimento comercial em que a cidade recebe muitos produtos desta região. Com a evolução de ferrovias e o cais do porto, a rua Voluntários da Pátria se torna um centro de atacado e avanço do comércio daquela região”, explica o professor e pesquisador da PUCRS, pós-doutor em História Social e Cultural da Arte, Charles Monteiro. O trecho inicial, inaugurado em abril, tinha 33,7 quilômetros de extensão e quatro estações: Porto Alegre, Canoas, Sapucaia e São Leopoldo.

A planta de Porto Alegre em 1888, no final do Império, marca a expansão da cidade, já sem as fortificações no seu entorno, para a região Norte e a intensificação do crescimento do tecido urbano na região Sul e da Cidade Baixa. É neste período que surgem os primeiros hipódromos, como o Rio-Grandense (Menino Deus), o Boa Vista (Independência) e o Navegantes. As áreas intermediárias começavam a ser valorizadas para loteamentos, surgindo os núcleos dos futuros bairros Floresta, Bom Fim, Moinhos de Vento e muitos outros. A discussão política e social na cidade também já adquiria considerável vigor, com partidos políticos ativos e vários jornais de opinião em circulação, como A Democracia e A Federação, de ideais republicanos. Essa movimentação resultou, em 1884, na libertação de muitos escravos na Capital, quatro anos antes da Lei Áurea.

Empoderamento feminino

Em 1873, a escritora, professora e poetisa Luciana de Abreu, destacada na comunidade e defensora da causa feminina, recebe a Cruz de Ouro, maior distinção conferida pela Sociedade Parthenon, o primeiro clube literário da cidade. Fundada cinco anos antes, a entidade é considerada pioneira entre as agremiações culturais do Estado no século XIX. Incentivava a prática da leitura e da criação literária, promovendo aulas, saraus e conferências. Parthenon Litterario chegou a ter mais de 140 membros efetivos e uma rede de colaboradores com mais de 300 pessoas, reunindo boa parte da elite intelectual gaúcha, tendo como líderes José Antônio do Vale Caldre e Fião e Apolinário Porto-Alegre. Convidada a participar de saraus, Luciana de Abreu subia à tribuna e fazia contundentes discursos pelos direitos da mulher, geralmente sendo ovacionada pelos presentes. “E vós, senhoras brasileiras, que reunis à beleza plástica uma vasta inteligência e um terno coração, não quereis que pulse ele ao amor das letras e da glória nacional?”, bradou, em uma dessas ocasiões.

Bondes puxados a burro

Gradativamente, surgem as primeiras linhas de bonde com tração animal, puxadas a burro, em 1873, pela Cia. Carris de Ferro Porto-Alegrense, fundada um ano antes. O primeiro itinerário era o Menino Deus, saindo do Mercado, passando pela Rua da Margem (atual rua João Alfredo). “Outra linha saía da Praça da Matriz em direção à Várzea, o que é hoje o Parque Farroupilha (Redenção)”, conta o professor Monteiro. Em 1889, em um período posterior, na República, são criadas novas linhas, abrangendo novas regiões da cidade.

Serviços básicos regulamentados

A Lei Municipal de 1876 regulariza a coleta de lixo e, dois anos depois, é a vez do saneamento. “As pessoas tinham cubos sanitários, que eram recolhidos e trocados uma vez por semana e despejados na Ponta do Dionísio. Eram lavados e devolvidos aos donos”, lembra o historiador e pesquisador da PUCRS Charles Monteiro. Após 1899, os dejetos passaram a ser jogados na “Ponta do Melo”, onde ficava o extinto construtor de navios Estaleiro Só.

1º de outubro de 1895

Atualmente, o jornal há mais tempo em atividade no Rio Grande do Sul e um dos mais tradicionais do Brasil, o Correio do Povo é “uma folha lida e apreciada por todos, sem poupar esforços nem medir sacrifícios”, valores definidos por seu fundador, Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior, em 1895. O diário surgiu dois meses após o término da Revolução Federalista, que durante três anos opôs republicanos e federalistas no Estado. Procurando firmar uma posição apartidária, em seu primeiro número, o jornal se declarava “independente, nobre e forte”, e prometia não se deixar escravizar, por “cogitações de ordem subalterna”. Sergipano do município de Neópolis, Caldas Júnior, radicado no Rio Grande do Sul desde novo, então com 27 anos, chamou dois jovens, um balconista da livraria Americana, que mais tarde seria médico, Mário Ribeiro Totta, e o tipógrafo José Paulino de Azurenha para darem início a um jornal, que teve sua primeira edição, em uma terça-feira, com quatro páginas, de 39 centímetros por 56 centímetros, em seis colunas. A redação e tipografia foram instaladas no prédio 132 da Rua da Praia.

Cerveja, futebol e paixão

Em 1886 começa o primeiro serviço telefônico de Porto Alegre, instalado pelos alemães, que também trouxeram para a cidade o hábito de tomar chopp. “Aquela prática de encontrar os amigos, aos finais de tarde e ouvir música no Chalé da Praça XV foi a primeira versão de happy hour, no fim do século XIX”, observa o professor. É da mesma época a criação de cerca de cem cervejarias na cidade.

O Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense é fundado em 15 de setembro de 1903, por Candido Dias da Silva. Uma semana antes, ele assistiu a uma partida demonstração do esporte bretão em um campo improvisado, até que a bola murchou. Silva emprestou a que tinha aos esportistas, que lhe explicaram detalhes e o incentivaram a criar seu próprio clube. Em 4 de abril de 1909, o Sport Club Internacional é fundado pelos irmãos Henrique, José e Luiz Poppe, com o objetivo de aceitar toda e qualquer pessoa, sócio ou atleta, independente da origem, raça ou cor da pele. Até então, pessoas que não fossem brancas não tinham espaço para participar do jogo. A dupla Gre-Nal se tornou uma das maiores rivalidades futebolísticas do mundo.