Após declaração de procuradora, familiares de vítimas devem entrar na Justiça contra prefeitura
Mirela Marchesan disse que embriaguez de frequentadores seria uma das causas das mortes
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O presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria, Sérgio da Silva, classificou como “sem noção” a manifestação da procuradora. “Estamos sendo escrachados pelas autoridades. No laudo do meu filho, a única causa da morte foi cianeto. Não tinha uma gota de álcool. Aí vem uma pessoa sem noção falar uma besteira dessas. Como pai, é muito constrangedor. A associação vai entrar com um processo coletivo contra o município de Santa Maria”, afirmou.
A ação deve ser movida contra o município de Santa Maria. Silva frisou que também gostaria que a procuradora se retratasse sobre o texto. “Quem tem responsabilidade sobre isso foi ela. Ela é bem paga e concursada e falou um absurdo desses, sabendo que depois iria sair na mídia. Eu entraria com uma ação contra ela, mas a associação entrará contra a prefeitura”, disse.
A reportagem da Rádio Guaíba tentou contato com a procuradora Mirela Marchezan. Em sua alegação, no texto que tramita no STJ, a representante da PGM de Santa Maria escreveu:
“Apesar da comoção generalizada e luto coletivo ocorridos com a tragédia da Boate Kiss, e mesmo podendo parecer insensível mencionar a possibilidade de ocorrência de culpa das próprias vítimas, não há como ignorar o fato de que diversas pessaos que estavam em frente ao palco, onde começou o incêndio, conseguiram sair do local; ao passo que outras tantas, que estavam muio mais próximas à porta de saída, não abandonaram o recinto. Certamente diversos fatores contribuíram para esta diferença de condutas e de desfechos, sendo, um deles, o estado de sobriedade ou embriaguez de cada um dos frequentadores, fato que deve ser bem analisado em cada caso concreto”, concluiu.
A prefeitura de Santa Maria alega que a defesa foi realizada ainda na gestão anterior. No último mês de janeiro, quatro anos após a tragédia, o Executivo foi condenado pelo Tribunal de Justiça (TJ/RS) a pagar uma indenização de R$ 200 mil aos pais e ao irmão de Ariel Nunes Andreatta, que morreu no incêndio aos 19 anos. O município ainda pode recorrer da decisão.
O processo
O processo principal que apura a tragédia foi instruído e julgado, sendo decidido, no dia 27 de julho do ano passado, que os quatro réus serão submetidos a júri popular. As defesas recorreram da decisão de primeiro grau e o recurso está sendo analisado pelo Tribunal. Os réus são os sócios da Kiss Elissandro Spohr e Mauro Londero Hoffmann e os músicos Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão. Ao longo do processo, o juiz de Direito Ulysses Fonseca Louzada ouviu 204 pessoas, entre sobreviventes, testemunhas, peritos e réus.
Três bombeiros foram levados a julgamento pelo Tribunal de Justiça Militar do RS, acusados de responsabilidades no incêndio. Um deles foi condenado a um ano e três meses de reclusão e outro, a um ano. O terceiro foi absolvido.
Também tramitam na Justiça processos em que quatro pais de vítimas da tragédia são processados por integrantes do Ministério Público por calúnia e difamação. Já o Instituto Juntos e famílias recorreram à Comissão Interamericana de Direitos Humanos para que agentes públicos que não foram acusados possam ser novamente investigados.
A tragédia
Na madrugada de 27 de janeiro de 2013, a banda que se apresentava na boate acendeu um artefato pirotécnico que teria atingindo o teto, dando início ao incêndio. Conforme denúncia do MP, as centelhas entraram em contato com a espuma altamente inflamável que revestia partes do local, causando o fogo e a emissão de gases tóxicos. No projeto da Kiss em 2009, teriam sido apontadas 29 irregularidades.