Apesar de lei, doce de leite nunca foi proibido na merenda escolar

Apesar de lei, doce de leite nunca foi proibido na merenda escolar

Projeto de lei sancionado pelo governador determina a inclusão do alimento na dieta da rede escolar estadual

Samantha Klein

Doce nunca foi proibido, mas restrito na merenda dos estudantes

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Treze anos foram necessários para aprovar o projeto de lei 385/2006 na Assembleia Legislativa, que determina a inclusão do doce de leite na merenda escolar da rede estadual de ensino. Nesta quinta-feira, a proposta foi sancionada pelo governador Eduardo Leite.  

O deputado Edson Brum, autor da proposta, destaca que o alimento é "rico em nutrientes indicados especialmente para alunos do ensino fundamental".  Além disso, o parlamentar ressalta que essa é uma oportunidade para valorizar as cooperativas e os produtores de leite do Estado. Apesar do rito de tramitação no Legislativo, a proposta nunca foi exatamente necessária, já que o doce de leite nunca foi proibido na dieta alimentar implementada nas escolas.

O alimento é restrito, o que significa que deve ser consumido com cuidado. "Assim como as geleias de frutas, sorvetes, bebidas lácteas, mel e melado são consumidos com restrição. Logo, essa lei é desnecessária e parece atender aos interesses da indústria", destaca a nutricionista e coordenadora do Centro Colaborador de Alimentação e Nutrição Escolar (Cecane/UFRGS), Luciana Dias de Oliveira. 

O órgão responsável pelo apoio técnico e operacional ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a implementação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) faz críticas aos argumentos utilizados para a aprovação da legislação.

Em nota técnica, os nutricionistas do Cecane destacam que o alimento altamente proteico, conforme destacado na proposta do parlamentar. "A afirmação não está de acordo com  norma da Anvisa em que um alimento considerado fonte de proteína deve ter, no mínimo 6 gramas por porção de 100 gramas ou 12 gramas para ser altamente protéico". Segundo a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos, o doce de leite possui cerca de 5,5 gramas de proteína em 100g. 

"E é preciso estar atento a qual tipo de doce de leite é servido para as crianças. Se for um alimento industrializado, cheio de aditivos, qual é o sentido de oferecer na alimentação escolar?", sustenta Luciana. 

A partir da sanção da proposta, o alimento já vai passar a constar no cardápio de todas as escolas uma ou duas vezes ao mês segundo Luana Petrini, coordenadora alimentação escolar da Secretaria Estadual da Educação (Seduc). "É um produto que contém açúcar, não é para ser utilizado diariamente, mas eventualmente não trará malefícios. Podemos encaixar com um pão integral e um suco para o lanche das crianças", ressalta.   

A coordenadoria é responsável pela elaboração dos cardápios das escolas de todo o Estado.

Pedido ignorado 

O governador ignorou pedido de nutricionistas e sancionou a matéria. Na semana passada, o Conselho Regional de Nutricionistas da 2ª Região entregou carta pedindo o veto ao projeto de lei. 

O parecer técnico sustenta que dentre os motivos para vetar, deveriam ser levados em consideração os índices de aumento da obesidade infantil e as doenças crônicas. 

Outro posicionamento dos nutricionistas atenta para a existência de legislação similar prevendo que “a oferta de doces e/ou preparações doces fica limitada a duas porções por semana, equivalente a 110 kcal/porção”. 

Deputado defende texto

Por outro lado, o deputado Edson Brum se defende dizendo que a proposta não obriga a inclusão do alimento. “Esse é um projeto que sugere a inclusão do doce de leite, mas não obriga nada. E claro, já acontece um acompanhamento realizado por nutricionistas porque a lei exige. Assim como é servido geleia de frutas, bolos e biscoitos, a proposta é só uma sugestão para o cardápio”, sustenta.

O Conselho de Nutrição, em contrapartida, lembra que, apesar da eficiência do trabalho da Coordenação de Alimentação Escolar da Secretaria Estadual da Educação (Seduc), só existem duas nutricionistas para cuidar dos cardápios das mais de 2 mil escolas da rede pública, que soma mais de 845 mil alunos matriculados, conforme o Censo Escolar do ano passado.


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