Casarão de generais pode ser alugado em Porto Alegre

Casarão de generais pode ser alugado em Porto Alegre

Emílio Médici e Ernesto Geisel moraram no local quando eram comandantes do Exército durante a Ditadura Militar

Henrique Massaro

José Carlos Victória, de 66 anos, fez serviço de guarda para a família do general Médici e atua hoje como taxista

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Uma faixa pendurada na casa 3.232 da avenida Cristóvão Colombo, em Porto Alegre, informa em números vermelhos um telefone para interessados em alugar o imóvel. Ao ligar, o possível comprador será informado pela pessoa do outro lado da linha dados como a área e o preço mensal. A ligação durará menos do que cinco minutos e a visita ao local, caso ocorra, não muito mais do que isso. A história daquele lugar, no entanto, precisará de um tempo maior para ser narrada, pois conta, também, parte da trajetória política do Brasil.

Décadas antes do início da construção da trincheira que passa perto da edificação localizada na esquina da rua Carlos Von Koseritz — e da própria existência do asfalto na avenida, a casa foi habitada por pelo menos dois generais que se tornariam presidentes do país durante a Ditadura Militar. Emílio Médici e Ernesto Geisel moraram no local quando eram comandantes do Exército, hoje conhecido como Comando Militar do Sul (CMS).

Quem lembra do período em que Médici viveu no local é José Carlos Victória, 66 anos. Ex-soldado do Exército, ele fez o serviço de guarda da família do general que comandaria o país de 1969 a 1974. Carlão, como é conhecido, serviu como militar apenas por um ano, de 1969 a 1970, mas acumula mais de 30 anos de convivência com a casa da Cristóvão Colombo. Depois de servir, ele se fixou como taxista e, desde 1986, trabalha justamente no ponto de táxi que fica em frente ao antigo lar dos militares.

“Eu conto para os meus colegas como era isso aqui e eles ficam de boca aberta”, relata o ex-soldado. Ele não se refere a nenhum incidente ocorrido no local, mas ao poder e à forma como os militares de patentes mais elevadas eram tratados na época. Segundo recorda, toda a calçada que passa em frente à casa ficava isolada à noite para a segurança da família do general. Eram, ao todo, nove soldados e um cabo que se revezavam na guarda. Aos finais de semana, se Médici saía a pé, era sempre acompanhado de dois homens, um à sua frente e outro do outro lado da rua.

O CMS informou que o imóvel pertenceu ao Exército até 2015, quando deixou de ser utilizado. Um novo prédio foi construído na Capital com o objetivo de abrigar todos os generais. A casa da Cristóvão Colombo foi vendida para a Ecoplan Engenharia. De acordo com a empresa, ela foi adquirida através de concorrência pública. A edificação possui três andares e uma área de 578 metros quadrados.

Jornalista recorda fatos curiosos

O jornalista Marco Antônio Kraemer, que fez cobertura diária do Exército pelo Correio do Povo por cerca de 15 anos, também lembra da casa como personagem importante da história política brasileira. Ele recorda, inclusive, que ela chegou a ser, ainda que por pouco tempo, a moradia de Médici já enquanto presidente militar empossado.

Isso porque, logo após a posse, o general retornou ao endereço de Porto Alegre, onde ficou por cerca de duas semanas. Sobre esta época, Kraemer ainda guarda uma curiosidade. Alguns dias antes do anúncio oficial do novo presidente por parte do Exército, o Correio do Povo divulgou o provável nome. Em uma viagem de avião ao interior do Estado, onde cobriria atividades militares, o jornalista foi chamado pelo general, que teria lhe confidenciado sua opinião sobre vir a ser o presidente: “Eu não quero isso”, disse Médici, conforme Kraemer.

Moradia dos militares por décadas, a casa também serviu de abrigo para o presidente deposto pelo golpe em 1964. Segundo o jornalista, João Goulart, por resistência e intermédio do ex-governador Leonel Brizola, passou três dias no local quando veio de Brasília com destino ao Uruguai. Novamente, a política brasileira ficou atenta à casa da Cristóvão Colombo, recorda Kraemer, que ainda viria a ser porta-voz do governo do último presidente do período militar: João Figueiredo.

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