CNJ apura conduta de juíza que cita raça para condenar réu negro no PR

CNJ apura conduta de juíza que cita raça para condenar réu negro no PR

Segundo advogada do réu, "associar a questão racial à participação em organização criminosa revela racismo ainda latente na sociedade brasileira"

R7

CNJ irá apurar a conduta da juíza Inês Marchalek Zarpelon, que citou a raça de um homem negro para aumentar sua sentença condenatória em sete anos

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O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afirmou que irá apurar a conduta da juíza Inês Marchalek Zarpelon, que citou a raça de um homem negro para aumentar sua sentença condenatória em sete anos. O documento foi proferido em junho deste ano, mas ganhou visibilidade na quarta-feira.

Na sentença condenatória, a magistrada do Fórum Central da Região Metropolitana de Curitiba, no Paraná, declarou: "Sobre sua conduta nada se sabe, seguramente integrante do grupo criminoso, em razão de sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente.

Em nota, a juíza disse que "em nenhum momento houve o propósito de discriminar qualquer pessoa por conta de sua cor". "Sinto-me profundamente entristecida se fiz chegar, de forma inadequada, uma mensagem à sociedade que não condiz com os valores que todos nós devemos diuturnamente defender", declarou.

Além do CNJ, a Ordem dos Advogados do Brasil do Paraná vai pedir uma apuração por crime de racismo. "Essa sentença tem uma nulidade e uma carga discriminatória quando fala da condição social e de sua condição de origem negra do acusado por isso a Ordem repele esse tipo de manifestação", afirmou Cassio Telles.

O caso

A juíza Inês Marchalek Zarpelon, do Fórum Central da Região Metropolitana de Curitiba, no Paraná, aumentou em sete meses a pena de um homem negro, de 42 anos, após associar em uma sentença publicada em junho deste ano a questão racial à suposta participação em uma organização criminosa.

"Com base na fundamentação da raça, ela aumentou a pena em uma das fases. Ela nunca poderia se utilizar da raça para fundamentar nada", afirma Thayse Pozzobom, advogada que acompanha o caso. Segundo a advogada, o homem foi condenado a cumprir 14 anos, 2 meses e 45 dias multa de reclusão.

"Sobre sua conduta nada se sabe, seguramente integrante do grupo criminoso, em razão de sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente.

A advogada publicou em suas redes sociais, na noite da terça-feira, uma mensagem de indignação após a divulgação da sentença. "O nome do ser humano violado com as palavras proferidas pela magistrada é Natan Vieira da Paz, 42 anos, negro", diz.

"Associar a questão racial à participação em organização criminosa revela não apenas o olhar parcial de quem, pela escolha da carreira, tem por dever a imparcialidade, mas também o racismo ainda latente na sociedade brasileira", afirmou a advogada.

"Organização criminosa nada tem a ver com raça, pressupor que pertencer a certa etnia te levaria à associação ao crime demonstra que a magistrada não considera todos iguais, ofendendo a Constituição Federal. Um julgamento que parte dessa ótica está maculado. Fere não apenas meu cliente, como toda a sociedade brasileira", escreveu a advogada.

De acordo com a advogada, o Poder Judiciário tem o dever de não somente aplicar a lei, mas também de reduzir as desigualdades sociais e raciais, atenuar as injustiças. "Jamais produzi-las como fez a magistrada ao associar a cor da pele ao tipo penal.

A advogada afirmou que irá recorrer da sentença e buscará a anulação. "Vou buscar as comissões de igualdade racial e direitos humanos da OAB do Paraná, o CNJ e a Corregedoria", afirma.

Na sentença, a magistrada escreve: "com efeito, denota-se que a pena aplicada ao réu ultrapassa quatro anos, restando preenchido o requisito do artigo 313, no inciso I, do Código de Processo Penal."

"A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência de crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado."

A juíza escreveu ainda que "considerando que o acusado permaneceu solto durante a instrução processual, entendo que os requisitos da constrição não estão presentes."


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