Iniciativas dão sobrevida ao Arroio Dilúvio

Iniciativas dão sobrevida ao Arroio Dilúvio

Curso d' água que cruza Porto Alegre e desemboca no Guaíba agoniza com o lixo jogado em seu leito

Jézica Bruno

Arroio que cruza Porto Alegre e desemboca no Guaíba agoniza com o lixo jogado em seu leito

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Quem viveu em Porto Alegre no começo do século XX jamais poderia imaginar que o arroio Dilúvio seria conduzido a um destino tão cruel. A sua planície úmida, decorada por maricás, e as curvas sinuosas que davam vazão à água limpa chegaram a representar um obstáculo para o crescimento urbano. As lavadeiras que se posicionavam próximas à foz, na época, decoravam um cenário difícil de ser construído na cabeça dos que olham hoje as águas poluídas do arroio, que corta a cidade como um esgoto a céu aberto, perseguido pela avenida Ipiranga.

O destino do Dilúvio começou a ser modificado a partir de 1930, quando passou a ser ocupado por uma densa área urbana e foi engessado depois da enchente de 1941, quando perdeu a curvatura, como conta o professor do Instituto de Geociência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), geólogo Rualdo Menegat. A microbacia do arroio, com uma área de cerca de 80 quilômetros quadrados, 83% dela em Porto Alegre, foi ocupada ao longo de seu curso, que tem início em Viamão, por cerca de 600 mil pessoas.

Anualmente, o Dilúvio recebe 50 mil metros cúbicos de terra e lixo em suas águas. Isso equivale a dez mil caminhões-caçamba cheios. “As classes mais ricas afogaram o local com construções e as comunidades mais pobres com a contaminação por lixo e esgoto, o que evidencia os problemas dos serviços urbanos públicos”, explica.

Renaturalização

Por outro lado, Menegat ressalta que não é necessário apenas investimento econômico para projetos e serviços mais eficientes de limpeza urbana. Ele acredita que o principal investimento seja modificar a cultura implantada na cidade. “As pessoas precisam pensar no Dilúvio não como um esgoto a ser tapado, mas como um importante arroio a ser recuperado. Temos que investir em ações junto às comunidades, como coleta de resíduos e autonomia das pessoas em fazer isso e, por último, na renaturalização do canal com uma cultura urbana, utilizando conceitos modernos”, salientou.

Não é necessário voltar um século na história, no entanto, para entender a importância de reverter a situação do arroio que deságua no Guaíba, a menina dos olhos dos porto-alegrenses. A foz é a zona de maior impacto quando a poluição é analisada por especialistas. “A água nesse ponto é extremamente fétida e suja. O arroio recebe muita sujeira do comércio, de hospitais e de grandes instituições que estão pelo seu caminho”, observa. “Não precisamos de bilhões de reais, porque grande parte do problema é cultural”.

Iniciativa

Para tentar reduzir a interferência dos esgotos nos arroios de Porto Alegre, uma outra iniciativa se voltou para as residências. Um grupo de pessoas se mobilizou para mostrar a tecnologia necessária à população para que o lixo produzido em casa pudesse ser compostado pelos próprios moradores e, para que eles, passassem a ser os geradores da própria mudança. Nasceu assim o projeto Transformação Solidária, desenvolvido por agentes articuladores, voluntários e técnicos, e realizado pelo Instituto Eckart e Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam).

Em 21 dias intensivos foram reunidas experiências para colocar em prática tecnologias sociais capazes de resolver ou minimizar os problemas de esgoto, separação, destinação e compostagem do lixo doméstico que pinta de cinza as moradias localizadas às margens dos arroios da Capital. “Nosso objetivo foi mostrar a tecnologia para que a pessoa perceba que isso é possível. Fomos lá para botar a mão na massa”, afirmou a diretora de Relacionamento do Instituto Eckart, Angelita Luizetto Walter.

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