Invernos no RS devem ser mais quentes e com episódios de frio intenso, alerta climatologista

Invernos no RS devem ser mais quentes e com episódios de frio intenso, alerta climatologista

No verão, tendência é que o estado volte a enfrentar ondas de calor este ano

Lucas Eliel

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Os países da Europa estão passando atualmente por uma forte onda de calor, que tem ocasionado em mortes e várias queimadas. As altas temperaturas, no entanto, não são exclusivas do continente do Hemisfério norte. Em um cenário de mudanças climáticas, o Rio Grande do Sul, por exemplo, teve um verão bem intenso este ano e a tendência para as próximas décadas, segundo o climatologista do Centro Polar e Climático da Ufrgs, Francisco Eliseu Aquino, é que os invernos também tenham termômetros com marcas  maiores, mas com episódios de frio rigoroso.

Conforme Aquino, os estudos indicam que a temperatura média dos invernos no RS aumentou. "Eles (os invernos) não são mais tão frios, como os vistos pelos nossos avós e bisavós. Os cenários futuros para a região do Rio Grande do Sul indicam que a gente vai ter maior variabilidade: poucos dias muito frios, mantendo aquela média de invernos 'mornos'", informa.

Com a mudança climática, a tendência também é que Rio Grande do Sul tenha nos próximos anos dias estranhamente quentes em épocas de mais frio e eventos de precipitação concentrada, trazendo muita chuva em um curto espaço de tempo. Porém, não há a possibilidade da onda de calor hoje observada na Europa "viajar" até o Brasil, destaca o especialista. O país tem os seus próprios fatores que contribuem para um aumento das temperaturas. "Os estudos mais recentes apontam que as ondas de calor no Brasil, e em especial na região do Prata, onde está o Rio Grande do Sul, estão mais duradouras em número de dias e mais intensas se a gente compara com 20, 60 ou 90 anos atrás", enfatiza.

Em relação ao RS, existem duas causas centrais causando temperaturas bastante opostas. Se de um lado a região equatorial tropical do mundo está mais quente e favorece ondas de calor, de outro o Estado está situado mais próximo da Antártica, que por conta de alterações na circulação atmosférica consegue trazer para o RS massas de ar frio mais fortes do que as observadas em décadas anteriores.


Termômetros marcando 24ºC em Porto Alegre nessa quinta-feira, em pleno inverno | Foto: Matheus Piccini

No início do ano, o Rio Grande do Sul registrou consecutivamente altas temperaturas. Em fevereiro, o Estado quebrou o recorde de calor, quando Uruguaiana chegou a ter 42,9ºC, de acordo com informações da Metsul Meteorologia. Para o próximo verão, as temperaturas devem ser novamente bem altas. "Teremos um verão quente, talvez anomalamente mais quente, porque ainda vamos ter o efeito da La Niña, que diminui a precipitação e deixa a América do Sul mais seca", salienta. 

Motivos das mudanças climáticas 

Segundo o climatologista, há uma série de motivos para o planeta hoje estar mais quente, como o fato do mundo ter começado a utilizar mais combustível fóssil a partir da revolução industrial e ter aumentado o número de áreas urbanas, consequentemente também acrescendo o índice de desmatamento. "A mudança da superfície do planeta e mais a emissão de gases de efeito estufa, como o CO2 na atmosfera, amplificam o aquecimento natural que a terra tem", ressalta. "O aumento de 1,2 graus na média global é responsável pelos eventos extremos: ondas de frio, ondas de calor, tempestades, que registramos na América do Sul e em outras partes", acrescenta. 

A alta na temperatura do planeta ainda gera alteração no campo de pressão da atmosfera, em áreas de alta e baixa pressão, causando a mudança na circulação dos ventos. "Olhando desta vez o Hemisfério norte, que tem mais área continental, nos verões, a circulação atmosférica agora induz a formação de áreas de alta pressão, que nós reconhecemos como áreas de bloqueio atmosférico, causando um verão mais quente e mais seco", pontua. 

Na Europa, a atual onda de calor já causou a morte de ao menos 500 pessoas na Espanha e mais de 1 mil óbitos em Portugal, segundo autoridades dos países. A psicóloga Monica Voelz e o jornalista Marco Aurélio Ruas, que vivem no segundo país, relatam dificuldades na rotina em decorrência do forte calor. "A gente enfrenta alguns desafios bem importantes, em especial por conta do fumo das queimadas", diz Voelz. Já Ruas tem uma esposa grávida e ela tem episódios de mal-estar. "Frequentemente ela começa a ficar com a pressão baixa, começa a ficar meio zonza. Até por isso que nós não temos ido à praia, não indo também em lugares abertos", conta.  


Incêndios causados pela onda de calor também aumentam poluição | Foto: Maria-Cecilia Rezende, Alice Pallussiere, Delphine Lecrercq / AFP / CP

Aquecimento localizado e o que a população pode fazer para um mundo menos quente

De forma local nas cidades, as zonas podem ter diferentes sensações térmicas se comparadas regiões mais e menos arborizadas. Por conta disso, Aquino vê como fundamental que ao fazer novos empreendimentos, como prédios ou novas vias, seja adotada sempre uma estratégia de replantio das árvores nos municípios. "É interessante comentar que os estudos mais recentes mostram que com a arborização de ruas, de praças, há uma tendência de formar uma 'ilha de frescor versus uma 'ilha de calor'. Com isso, os benefícios para ao ambiente urbano são muito grandes, pois a biodiversidade nos acolhe e suaviza a temperatura nas cidades", reforça. 

Há atitudes que podem ser adotadas pelas autoridades dos países para frear o aquecimento global. Segundo o especialista, há hoje tecnologia suficiente para a elaboração de políticas públicas para um mundo mais sustentável. Mesmo que não seja possível interromper o cenário de aquecimento global até os próximos 20 anos, o futuro além desse período também é importante, frisa o especialista. 

Além disso, há também medidas que a população pode tomar no dia a dia para ajudar na luta contra o aquecimento global. Segundo Aquino, elas incluem andar mais, utilizar transporte híbrido e mesclar dias de trabalho remoto e presencial. "A ação mais relevante no ponto de indivíduo é não desperdiçar alimento. Nós gastamos muita água, gastamos qualidade de solo, adubamos, depois colhemos. Para ter colheita, utilizamos combustível fóssil no transporte, utilizamos energia elétrica. E se no final a gente desperdiça alimento, nós jogamos tudo isso fora, poluímos a atmosfera e emitimos gases de efeito estufa", esclarece.


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