ONGs denunciam prisão abusiva de ambientalistas na Amazônia brasileira

ONGs denunciam prisão abusiva de ambientalistas na Amazônia brasileira

Membros da Brigada de Incêndio de Alter do Chão são suspeitos de provocar incêndios para arrecadar fundos do exterior para seu combate

AFP

MPF do Pará afirmou que outra indagação não aponta como suspeitos os membros da ONG

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A prisão de quatro pessoas acusadas de causar incêndios na Amazônia brasileira para arrecadar fundos internacionais preocupa organizações ambientais, que denunciam uma medida "abusiva" que faz parte da campanha do governo de Jair Bolsonaro para desacreditar seu trabalho.

Quatro membros da Brigada de Incêndio de Alter do Chão, grupo de voluntários que desde 2018 auxilia os bombeiros no combate de incêndios florestais no Pará, foram detidos nesta terça-feira como parte de uma investigação para determinar a responsabilidade pelo incêndio que em setembro consumiu uma extensa área em uma unidade de proteção ambiental próxima ao balneário turístico da região.

A polícia afirma que existem "indícios" de que os voluntários provocaram os incêndios para depois arrecadar fundos do exterior para seu combate, algo que a ONG em questão e seus patrocinadores negam. "Eles filmavam, publicavam e depois eram acionados pelo poder público para auxiliar no controle de um incêndio que eles mesmos causavam. Toda vez alegavam surpresa ao chegar no local, mas não havia outra possibilidade lógica", afirmou o titular da Diretoria de Polícia do Interior (DPI), José Humberto Melo Jr., citado em um comunicado da Polícia Civil do Pará. Nas buscas, os agentes confiscaram documentos, computadores e telefones celulares dos investigados. 

O fogo na região de Alter do Chão - um balneário de areia branca e água doce do rio Tapajós - consumiu o equivalente a 1.600 campos de futebol e demorou quatro dias para ser extinto. A ONG Instituto Aquífero Alter do Chão, do qual a brigada depende, nega as acusações e afirma que já estava colaborando com as autoridades nas investigações, iniciadas em setembro.

Tanto o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, como Bolsonaro repercutiram as acusações da Polícia nas redes sociais. "Em outubro declarei que muitos focos de incêndios poderiam estar ligados a ONGs. Agora a polícia paraense prende alguns suspeitos pelo crime", tuitou após as prisões o presidente, que assumiu o poder em janeiro.

"Medidas abusivas", diz WWF

Os investigadores afirmam que os voluntários criaram focos de incêndio para depois vender as imagens para o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), que as teria usado em campanhas para arrecadar doações internacionais, entre elas uma do ator americano Leonardo DiCaprio. A WWF-Brasil nega estas alegações, que qualifica de "mentiras".

O fundo admite ter transferido mais de 70.000 reais à ONG, como parte de um contrato realizado de forma transparente com a organização para comprar novos insumos de combate às chamas. "A falta de clareza sobre as investigações, a falta de fundamento das alegações usadas (...) são extremamente preocupantes do ponto de vista da democracia e configuram claramente medidas abusivas", acrescentou a WWF-Brasil, que reiterou sua confiança na ONG local.

A ONG Observatório do Clima, que reúne várias organizações ambientalistas, afirma que as autoridades locais estão aplicando "medidas abusivas" com o "único intuito de intimidar as pessoas que trabalham pelo desenvolvimento sustentável da Amazônia". "Ao permitir tal abuso, o governador do Pará mostra um alinhamento sinistro com o presidente Jair Bolsonaro e suas intenções declaradas de abrir a Amazônia ao desmatamento e acabar 'com todo tipo de ativismo'", acrescentou o Observatório em comunicado.

A prisão dos voluntários também foi condenada pela Anistia Internacional e pelo Greenpeace, que acusam o governo de debilitar os controles ambientais e favorecer, também com seu discurso antiambientalista, o avanço do desmatamento ilegal na floresta Amazônica.

O Ministério Público Federal do Pará pediu à polícia para ter acesso à investigação, afirmando que outra indagação aberta sobre o mesmo caso, esta no âmbito federal, não aponta como suspeitos os membros da ONG. "Na investigação federal, nenhum elemento apontava para a participação de brigadistas ou organizações da sociedade civil. Ao contrário, a linha das investigações federais, que vem sendo seguida desde 2015, aponta para o assédio de grileiros, ocupação desordenada e para a especulação imobiliária como causas da degradação ambiental em Alter", informou o MPF em comunicado.

Entre agosto de 2018 e julho de 2019, o desmatamento na Amazônia aumentou 43%, totalizando 10.123 km2, um recorde em dez anos, segundo dados atualizados esta semana pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).


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