Pandemia amplia problemas nos cuidados a animais abandonados na Capital e região metropolitana

Pandemia amplia problemas nos cuidados a animais abandonados na Capital e região metropolitana

Animais têm ficado órfãos em decorrência da morte de seus tutores e sido abandonados devido a crise econômica

Gabriel Guedes

Fundadora da associação 101 Viralatas, Aline diz que a entidade tem resgatado mais animais, mas a novidade é que são de tutores quem tem relatado dificuldades econômicas para manter os cuidados com os bichos

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As entidades que cuidam de animais abandonados seguem enfrentando desafios para poder seguir cuidando dos milhares de cães e gatos que acabam indo parar nas ruas da Capital e região Metropolitana. Nas últimas semanas, com os donos morrendo de Covid-19, animais têm até ficado órfãos, problema que não ocorria até o começo deste ano. O abandono dos bichos também tem aumentado ao mesmo tempo em que o voluntariado, responsável pela maior parte do acolhimento a estes animais, tem enfrentado uma diminuição nas doações de rações, medicamentos e até de recursos financeiros, e por isso pedem ajuda para seguir atuando.

“Na Lomba Grande (bairro rural de Novo Hamburgo), a pessoa que cuida dos meus cães, mora na Vila Belo Horizonte (localidade) e eles perderam um casal de vizinhos, ele 69 e 50 e poucos anos de idade. Deixaram seis cães adulto e seis filhotes. A vizinhança, muito assustada, viu os animais ficarem sem ninguém e tiveram a iniciativa de cuidar dos animais. A filha dos vizinhos tratou de divulgar e providenciar a doação. Muitas histórias como estas têm chegado às nossas redes”, conta a ativista da causa animal e Secretaria de Igualdade, Cidadania e Direito Humanos, Regina Becker.

De acordo com Regina, situações como estas poderiam ser contornadas se as pessoas que seriam as responsáveis legais respeitassem a legislação. “A filha que herdou a terra mandou o recado aos vizinhos que simplesmente não queria os animais. Do ponto de vista jurídico, o que diz a lei: os animais estão entre os bens que as pessoas herdam, conforme a lei federal 13.105, artigos 82 e 874", defende ao citar o Código de Processo Civil (CPC). Entretanto, situações assim, segundo a secretária, acabam indo parar nas mãos de organizações não-governamentais (ONGs) e projetos organizados por voluntários dos direitos dos animais. “A rede de apoio pública é muito precária e acabam dependendo do voluntariado e da compaixão destas pessoas”, afirma. 

A administradora da Majúna Proteção Animal, Raquel Majúna, também teve conhecimento da morte de pelo menos três cuidadoras, em Porto Alegre, Viamão e Eldorado do Sul, que deixaram órfãos dezenas de animais abrigados. “Os pedidos de ajuda por conta da pandemia, chegam todos os dias. Alguns são porque o tutor morreu de Covid-19 e a família não está preparada para abrigar o animal. Em outros casos, o tutor ou tutora está internado e às vezes são os vizinhos que pedem ajuda. Também tem o caso em que o tutor volta da internação, mas está tão debilitado, que não tem condições de cuidar dos animais de estimação. Esses são casos bem tristes, porque envolve um sentimento de incapacidade, e o tutor pensa com amor nos animais”, relata Raquel.  

À fundadora da associação 101 Viralatas, Aline Orestes Vieira, ainda não chegou relatos de animais órfãos. Mas em compensação, aumentou significativamente os pedidos de resgates. "Diariamente recebemos pelo menos dois pedidos de ajuda para animais feridos de atropelamentos, miiases (bicheiras), tumores. Há pessoas pedindo ajuda e não tendo como dar tratamento porque estão desempregados e passando por sérias dificuldades financeiras”, revela. Na organização, que atua em Porto Alegre e possui um abrigo em Viamão, atualmente há cerca de 30 filhotes de cães e 20 de gatos aguardando adoção. Mas quando se olha para os indivíduos adultos, são aproximadamente 300 animais, com 260 cães e 40 gatos. Na ONG da Raquel também houve aumento nesta demanda. “Tínhamos 216 animais abrigados antes da pandemia e hoje o número é de 332”, acrescenta. 

Entretanto, infelizmente o aumento de pedidos por resgate de cães e gatos culmina com as dificuldades e manter as atividades. “Já vivemos muitos momentos difíceis, mas com a pandemia as doações diminuíram e o valor das rações, vacinas e medicamentos aumentaram muito”, afirma. “Tivemos que nos reinventar através das lives (ao vivo nas redes sociais). Quando paramos com os eventos de adoção e brechó, as adoções despencaram e as doações também”, relata. A 101 Viralatas faz os brechós on-line todas as quartas-feiras e sábados após às 19h, no Instagram @101viralatas. Doações para a Majúna, que tem uma clínica veterinária voluntária na zona Sul de Porto Alegre, também enfrenta os mesmos desafios. Quem quiser colaborar, pode pedir informações antes, no telefone (51) 99772-5406. 

PODER PÚBLICO OMISSO

Em canil e gatil em Viamão, ONG 101 Viralatas tem cerca de 300 animais aguardando por uma adoção. Foto: Ricardo Giusti

As iniciativas de Aline e Raquel são duas entre dezenas a atuar na lacuna deixada pelo poder público. A própria secretária Regina pretende ampliar a nova atuação da STAS, avalizada em nova legislação estadual em outubro do ano passado, que também entregará esforços em prol da atenção animal. “Faremos parcerias com prefeituras e viabilizaremos recursos, no primeiro ano, para 20 mil castrações, além de outras parcerias de orientações com prefeituras, denúncias e maus tratos, e ampliando esta parceria com a Polícia Civil, que criou o selo Delegacia Amiga dos Animais”, adianta. 

Em Porto Alegre, a diretora do Gabinete da Causa Animal da Prefeitura de Porto Alegre, Catiane Mainardi, afirma que a estrutura desta divisão ligada diretamente ao Gabinete do Prefeito, é bastante enxuta, com seis veterinários e a Unidade de Saúde Animal Victória (USAV), na Lomba do Pinheiro, é onde a prefeitura presta apoio. O hospital veterinário é administrado pela Anclivepa-SP, uma associação de veterinários paulistas, e o município tem contratualizado até outubro, com a entidade, o albergue a 100 animais. Hoje são 105 – 76 cães e 29 gatos. E ainda, segundo Catiane, a USAV tem 25 fichas por dia para atendimento veterinário e realiza até 35 castrações por dia. Mas para poder usufruir deste serviço, a família tem que ser moradora de Porto Alegre, e ter cadastro no Bolsa Família ou renda de até três salários mínimos. Para auxílio a animais de rua, é necessário contatar uma das cuidadoras credenciadas – cuja relação consta no site https://prefeitura.poa.br/carta-de-servicos. “Estamos recebendo muitos pedidos de comunidades e bairros com relatos de animais abandonados. Então, estamos elaborando um plano de ação para que estas comunidades sejam atendidas no Victória”, conclui. 


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