Projeto de maior mina de carvão a céu aberto do País no Rio Grande do Sul divide opiniões

Projeto de maior mina de carvão a céu aberto do País no Rio Grande do Sul divide opiniões

Especialistas apontam impactos e desafios para implementação da Mina Guaíba nos municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas

Cláudio Isaías

Professora Jaqueline Sgarbi dos Santos, da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, de relato sobre o impacto da mineração em Moçambique

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A Região Metropolitana de Porto Alegre poderá receber a maior mina de carvão a céu aberto do Brasil - a Mina Guaíba. O projeto da empresa Copelmi Mineração aguarda o processo de licenciamento por parte da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). A proposta é escavar o complexo em uma área de aproximadamente quatro mil hectares nos municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas para trazer à tona 166 milhões de toneladas de carvão mineral para uso em gaseificação, termelétricas a carvão, ou mesmo em um polo carboquímico.

O projeto em solo gaúcho divide opiniões e, por este motivo, o Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural (PGDR) realizou nesta terça o debate "Mineração e segurança alimentar e nutricional: impactos e desafios em Moçambique e em Eldorado do Sul", no auditório da Faculdade de Ciências Econômicas, da Ufrgs, em Porto Alegre. A professora Jaqueline Sgarbi dos Santos, da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, realizou um relato sobre o impacto da mineração em Moçambique, na África, região que visitou em novembro de 2018 com um grupo de pesquisadores do Brasil e de integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

"Visitamos comunidades que tinham sido reassentadas a partir do impacto da mineração. Um grupo de empresas indianas recebeu a cedência de um território em Moçambique e as comunidades foram deslocadas para outra região", destacou. Segundo Jaqueline Sgarbi, que é integrante do Mecanismo de Participação das Universidades no Conselho Segurança Alimentar (Consan), os moradores que foram transferidos para outra região perderam totalmente a referência do seu território com relação ao fato de encontrar alimentos e a água porque estavam próximas do rio Zambeze, um dos principais da África.

"Eles foram colocados em uma "comunidade" construída pela empresa onde, por exemplo, os moradores não têm acesso ao rio Zambeze", ressaltou. Conforme a professora, os moçambicanos tinham práticas tradicionais de cultivo de animais e de alimentos que não conseguiram mais ser reproduzidas na estrutura construída pela empresa. As empresas indianas vão explorar o subsolo de uma região de Moçambique onde existe carvão e minério de ferro.

O aluno de Mestrado do Instituto de Pesquisa Hidráulicas (IPH) da Ufrgs, Iporã Possantti, afirmou que é preciso entender como a mineração vai interferir nos processos de movimento da água. "O licenciamento ambiental foi muito bem-vindo na década de 1970, mas hoje é um instrumento de gestão ambiental que sempre vai olhando cada caso e não olha a sinergia de diversos empreendimentos", explicou. Segundo Possantti, é preciso observar os impactos do empreendimento e promover um diálogo com a população a respeito do projeto.

Diante do impacto socioeconômico que esse projeto pode causar, é necessário um movimento mais organizado e mais esclarecido por parte do Poder Legislativo, a fim de defender os interesses da população gaúcha, levando em consideração os custos ambientais, sociais e econômicos do projeto. O debate contou ainda com a participação de Michele Martins, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração.

Audiência pública

Os Ministérios Públicos Estadual e Federal realizarão, no dia 20 de agosto, audiência pública para instruir seus respectivos expedientes investigatórios sobre o projeto Mina Guaíba. O debate acontecerá das 18h às 24h, no auditório do MP/RS, na rua Aureliano de Figueiredo Pinto. A promotora do Meio Ambiente de Porto Alegre Ana Maria Moreira Marchesan disse que a decisão de realizar o evento considerou a complexidade do projeto e a grande repercussão de seus possíveis impactos ambientais, sociais e econômicos, além dos pedidos formulados em larga escala pela sociedade.

Conforme a promotora, embora Porto Alegre não esteja mapeada no EIA/RIMA como integrante da área diretamente afetada pela atividade, houve forte demanda social pela audiência pública em função do empreendimento de mineração estar entre 15 a 30 Km da Capital. “Além disso, situa-se a menos de 500 metros da Área de Preservação Ambiental e mil metros do Parque Estadual Delta do Jacuí”, explicou Ana Marchesan.


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