Taxistas enfrentam concorrência de transporte por aplicativo e efeitos da pandemia

Taxistas enfrentam concorrência de transporte por aplicativo e efeitos da pandemia

Restrição de circulação da população na cidade reduziu o número de passageiros

Felipe Samuel

Em meio a dezenas de táxis parados no ponto da Estação Rodoviária, motoristas aguardam pacientemente pela chegada de usuários numa tarde desta semana

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Os taxistas observaram nos últimos anos o avanço da concorrência a partir do surgimento dos serviços de transporte por aplicativos. Mais do que lutar para garantir a clientela em pontos tradicionais da cidade, como a rodoviária e o aeroporto Salgado Filho, agora os profissionais precisam enfrentar outro adversário: o novo coronavírus.

A restrição de circulação da população na cidade reduziu o número de passageiros e aprofundou as perdas para a categoria. Em meio a dezenas de táxis parados no ponto da Estação Rodoviária, motoristas aguardam pacientemente pela chegada de usuários numa tarde desta semana.

Alguns chegam a esperar até quatro horas para conseguir o primeiro passageiro do dia. Os relatos dos motoristas são semelhantes, e vão desde reclamações por concorrência com motoristas de aplicativos até os efeitos da pandemia de Covid-19.

Favorino Silva Vargas, 79, trabalha há 42 anos como taxista e já passou por diversos períodos de crise econômica. Mas não encontra nenhum exemplo parecido para o que os profissionais da categoria estão vivendo. "O movimento está horrível, muito ruim. A gente chega aqui de madrugada para fazer três ou quatro corridas até 21h. É o dia inteiro para fazer três corridas", desabafa.

Além do movimento reduzido da clientela, Vargas relata os baixos valores cobrados pelo transporte por aplicativo. "Eles trabalham por pouco preço (aplicativos), mas não tiro razão deles ou de quem pega isso aí", conforma-se. O início da rotina de Vargas no veículo começa ao meio-dia e se estende até 22h. Aposentado desde 2002, trabalha para reforçar a renda da família.

Mesmo assim, a realidade da crise econômica exige cada vez mais esforços. "Tô puxando o freio de mão, aqui tá ficando ruim (Estação Rodoviária). Antes dava para tudo, agora tá bem complicado", observa, acrescentando que a categoria está sem aumento há quatro anos.

Na avaliação de Vargas, esse é o momento mais complicado para a categoria. "É o pior período. Nesse tempo todo de profissão, desde 1973, é a pior época. Bem pior do que na época do que governo Collor (1990-1992)", analisa. Rudiniei Cardoso dos Santos, 52, também convive com cenário de baixa procura pelo serviço.

Há 16 anos atuando no ponto da Estação Rodoviária, afirma que a combinação de concorrência de "aplicativos e pandemia" dificulta o dia a dia dos profissionais. "As duas juntas formam uma doença bem ruim", resume.

Mesmo com o movimento fraco, Santos segue trabalhando. "Se ficar parado não resolve nada. Com essa coronavírus que tá aí, e antes dessa "corona", o aplicativo, o meu serviço caiu 50%. O que a gente vai fazer? Temos que vir, correr atrás", resume. Santos inicia a jornada de trabalho às 15h. Muitas vezes só vai dormir de madrugada, após 12 horas rodando. "Levo de quatro a cinco horas para conseguir uma corrida. Então é de três a quatro corridas por noite", relata.

Em outros tempos, essa média representava apenas 10% de um dia normal de trabalho. "Em época boa fazia de 20 a 30 corridas por noite, quando não tinha aplicativo", compara. Apesar da concorrência com aplicativos, ele não critica os motoristas que optam pelo serviço. "Eles têm que ganhar pão deles também, têm família", comenta.

Ele observa, no entanto, que alguns veículos estão em péssimas condições. "Se avaliar alguns carros deles, não têm condições de trabalhar. Cadê a segurança do passageiro? Passageiro não está pela segurança, ele está pelo preço", garante.

Para atenuar os efeitos econômicos provocados pela pandemia, o Sindicato dos Taxistas de Porto Alegre (Sintáxi) deve confirmar nesta terça-feira a ampliação do desconto de 35% para 50% nos pedidos efetuados a partir do aplicativo do sindicato. De acordo Luiz Nozari, a categoria - que conta com frota de 3,8 mil carros - enfrenta concorrência dos serviços por aplicativos desde 2015.

A medida deve se estender pelo menos enquanto perdurar a bandeira vermelha na Capital - alto risco de contágio para o novo coronavírus - conforme modelo de Distanciamento Controlado do governo. "Uma parcela da categoria está pedindo para dar desconto maior de 35%, pedindo para dar 50%. Tem outra parcela que pede para aumentar preço", relata.

Ele reforça, no entanto, que os taxistas ainda detêm 15% do mercado, conforme pesquisa do Sintáxi. "Temos que prestar serviço de alta qualidade, pois temos aval do poder público", destaca. Na avaliação de Nozari, a pandemia aprofundou problemas em diversos setores da sociedade, mas garante que os taxistas precisam continuar "oferecendo serviço de alta qualidade por preço acessível".

Conforme o dirigente, no ponto da Estação Rodoviária 380 veículos fazem ponto, o que representa 10% da frota. "O pessoal tem que parar de reclamar e continuar garantindo serviço de qualidade", frisa. Segundo Nozari, uma parte da categoria ainda tem resistência ao uso de novas tecnologias, como aplicativos de serviço.


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