Bolivianos comemoram renúncia de Evo Morales

Bolivianos comemoram renúncia de Evo Morales

Presidente deixou cargo por pressão militar após aceitar novas eleições

AFP

OEA aponta irregularidades em pleito que elegeu Morales

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A renúncia, neste domingo do presidente boliviano, Evo Morales, devido a protestos contra sua contestada reeleição e da perda de apoio das Forças Armadas, foi comemorada nas ruas do país, em meio a um vácuo de poder e à denúncia de Morales de uma ordem de prisão contra ele, o que as autoridades negam.

"Renuncio a meu cargo de presidente para que (Carlos) Mesa e (Luis Fernando) Camacho não continuem perseguindo dirigentes sociais", disse Morales em Cochabamba, em discurso televisionado, referindo-se a líderes opositores que convocaram protestos contra ele, desde o dia seguinte às eleições de 20 de outubro.

O primeiro presidente indígena da Bolívia, forjado politicamente como sindicalista cocaleiro, defendeu seu legado que, segundo ele, levou progresso econômico e social a um dos países mais pobres da América Latina. "Estamos deixando a Bolívia com muitas conquistas sociais", disse em sua mensagem de renúncia o presidente de 60 anos, que assegurou que não abandonaria o país.

Morales denunciou durante a noite a existência de uma ordem de prisão "ilegal" contra ele, uma afirmação negada pelo chefe de polícia, o general Yuri Vladimir Calderón. Porém, o líder de direita Luis Fernando Camacho, que comandou o movimento de protesto contra Morales, confirmou no Twitter a ordem de detenção.

A praça Murillo de La Paz, onde fica o Palácio Quemado, antiga sede do governo, foi tomada por bolivianos que comemoravam a renúncia de Morales, que governou a Bolívia por quase 14 anos, um recorde nacional de permanência no poder. "Este sonso, que não sabe pensar, saiu pela janela; que bom, estamos felizes", disse à AFP a comerciante Reggina Sojas, de 61 anos.

Ao mesmo tempo, um grupo tentava arriar a "whipala", bandeira multicolorida xadrez que identifica os povos andinos, que a polícia retirou dos principais edifícios públicos. Durante a noite foram registrados atos violentos em La Paz e na cidade vizinha de El Alto, com incêndios em ônibus municipais e nas casas de um líder cívico e de uma jornalista, denunciaram os afetados.

Vácuo de poder

Os resultados de uma auditoria da Organização dos Estados Americanos (OEA) divulgados no domingo, que apontavam "sérias irregularidades" nas eleições, desencadearam os acontecimentos que levaram à renúncia de Morales. Durante a manhã, ao tomar conhecimento do relatório, o agora ex-presidente anunciou novas eleições, mas a notícia não foi suficiente para conter a ira da oposição.

Morales enfrentou durante o domingo uma avalanche de renúncias de altos funcionários, em alguns casos depois de terem tido suas casas incendiadas, e pela pressão decisiva dos militares e da polícia, que pediram sua renúncia. "Pedimos ao presidente de Estado que renuncie a seu mandato presidencial permitindo a pacificação e a manutenção da estabilidade, pelo bem de nossa Bolívia", disse o comandante-em-chefe das Forças Armadas, o general Williams Kaliman.

Após a renúncia de Morales, a polícia prendeu a presidente do Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), María Eugenia Choque, e outros funcionários do organismo por ordem do Ministério Público, que investiga irregularidades cometidas nas eleições. A Bolívia vive agora um vácuo de poder, pela renúncia de todas as autoridades que formavam a linha de sucessão constitucional.

A Constituição boliviana prevê que a sucessão começa com o vice-presidente, depois passa para o titular do Senado e depois para o titular da Câmara dos Deputados, mas todos eles renunciaram com Morales. A segunda vice-presidente do Senado, a opositora Jeanine Añez, reivindicou o direito de assumir a presidência da Bolívia.

Cuba e Venezuela denunciam "golpe"

Os principais aliados ideológicos de Morales na América Latina, Cuba e Venezuela, denunciaram o que consideram ter sido um "golpe de Estado". "Condenamos categoricamente o golpe de Estado consumado contra o irmão presidente @evoespueblo", escreveu no Twitter o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.
 

 


A embaixada da Venezuela em La Paz foi tomada durante a noite por homens encapuzados, anunciou a diplomata Crisbeylee González. Da Argentina chegaram duas mensagens distintas. O governo de Mauricio Macri pediu a preservação da paz social e do diálogo na Bolívia, mas o presidente eleito, o peronista de centro-esquerda Alberto Fernández, denunciou um "golpe de Estado produto da ação conjunta de civis violentos, policiais auto-aquartelados e a passividade do exército".

O Perú pediu uma "transição" democrática de poder. Apesar de Morales ter afirnado que não abandonaria a Bolívia, o México ofereceu asilo", anunciou o chanceler Marcelo Ebrard, que falou em "20 personalidades do Executivo e do Legislativo da Bolívia" asiladas na embaixada mexicana na capital boliviana. O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, pediu a "todos os atores relevantes que se abstenham da violência para reduzir a tensão e exercer a máxima moderação".

 


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