Bombardeios russos se intensificam e geram fuga de ucranianos antes de novas negociações

Bombardeios russos se intensificam e geram fuga de ucranianos antes de novas negociações

Negociação sobre eventual cessar-fogo deverá ocorrer ainda nesta quinta

AFP

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Após assumir o controle de Kherson, considerada cidade estratégica dentro da Ucrânia, as tropas da Rússia intensificaram os bombardeios contra outros centros urbanos do território ucraniano. A série de ataques obrigou mais de um milhão de civis a abandonarem suas casas, antes das novas tratativas para um possível cessar-fogo na região. A negociação está prevista para acontecer ainda nesta quinta-feira. 

No momento em que aumenta o arsenal de sanções, bloqueios e boicotes de resposta dos países ocidentais à invasão iniciada pela Rússia, o presidente ucraniano Volodymyr Zelenski celebrou a resistência "heroica" de seu povo.

Zelensky disse que as tropas ucranianas provocaram 9 mil baixas entre as forças russas desde o início da invasão, um forte contraste com as 498 mortes informadas por Moscou, que divulgou pela primeira vez um balanço desde o começo da ofensiva em 24 de fevereiro.

"Somos uma nação que quebrou os planos do inimigo em uma semana. Planos escritos há anos: pérfidos, cheios de ódio em relação ao nosso país", disse o presidente, que prometeu reconstruir o país depois da guerra e garantiu que a Rússia pagará o custo. "Vamos reconstruir cada edifício, cada rua, cada cidade, e dizemos à Rússia: aprenda a palavra 'reparação'", declarou Zelensky, de 44 anos.

Uma delegação ucraniana estava a caminho para a segunda rodada de negociações com os russos - após o fracasso do primeiro encontro na segunda-feira -, que coincide com o reconhecimento por parte de Kiev de que perdeu o controle de Kherson, um porto estratégico no Mar Negro, sul do país.

O presidente russo Vladimir Putin pediu "o reconhecimento da soberania russa da Crimeia, a desmilitarização e a 'desnazificação' do Estado ucraniano e a promessa de um estatuto neutro" como condições preliminares para uma resolução do conflito.

Avanço russo para Mariupol 

As tropas russas que avançam a partir da península da Crimeia - anexada por Moscou em 2014 - têm em seu alvo agora o porto de Mariupol. "A única coisa que os russos querem é destruir a todos", lamentou o prefeito de Mariupol, Vadim Boishenko.

Se Mariupol cair, a Rússia poderia garantir uma continuidade territorial entre a Crimeia e os territórios separatistas pró-Moscou da região de Donbass (sudeste). Outro alvo é Khariv, a segunda maior cidade do país, com 1,4 milhão de habitantes, cenário de intensos bombardeios que mataram vários civis, incluindo uma observadora da missão de vigilância da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE).

O ataque a Kiev parece estagnado no momento. Fontes do governo americano afirmaram que a imensa coluna de veículos militares que seguia para a capital está "parada" por falta de combustível e mantimentos.  Na cidade de Yitomir, 150 quilômetros ao oeste da capital Kiev, Oleg Rubak chora a morte da esposa Katia em um bombardeio russo. "Em um momento eu a vi entrando no nosso quarto, e no momento seguinte, nada, nada mais", disse Rubak à AFP, sentado nos escombros do que era sua casa, com a filha de um ano e meio.

Um milhão de refugiados

Centenas de civis ucranianos morreram desde o início da invasão, que será investigada pelo procurador do Tribunal Penal Internacional (CPI), o britânico Karim Khan, por supostos crimes de guerra após as acusações de Kiev de bombardeios contra zonas residenciais.

Nesta quinta-feira, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) atualizou os números de deslocados e informou que mais de um milhão de pessoas fugiram da Ucrânia em sete dias. Mais da metade delas seguiram para a Polônia.

Os países ocidentais e seus aliados responderam à invasão com uma bateria de sanções para isolar a Rússia nas áreas diplomática, econômica, cultural e esportiva.

Além da exclusão dos principais bancos do sistema de transferência internacional SWIFT, o Banco Mundial suspendeu todos os programas de ajuda na Rússia e em Belarus. E as aeronaves russas estão impedidas de sobrevoar o espaço aéreo que inclui toda a UE, Estados Unidos e Canadá.

O abalo provocado pelas sanções à economia russa levou as agências de classificação Fitch e Moody's a reduzir as notas da dívida da Rússia para a categoria especulativa, também conhecida como "bônus lixo".

Em mais um sinal do crescente isolamento, nesta quinta-feira o Comitê Paralímpico Internacional reverteu a decisão adotada 24 horas antes e vetou a participação dos atletas russos e bielorrussos nos Jogos de Inverno de Pequim, alegando que muitas delegações ameaçaram não competir, o que colocava em perigo a viabilidade do evento.

Na Assembleia Geral da ONU, uma resolução para exigir exigir a retirada das tropas da Rússia da Ucrânia e criticar a invasão recebeu na quarta-feira 141 votos favoráveis, apenas 5 contrários - Rússia, Belarus, Coreia do Norte, Eritreia e Síria - e 35 abstenções.

Guerra nuclear

O ministro russo das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, acusou os políticos ocidentais de considerar uma guerra nuclear e negou que este tipo de armamento integre o plano russo. O presidente Vladimir Putin anunciou no domingo que colocou em alerta a força de dissuasão nuclear do país. Desde então, o fantasma de um conflito atômico está presente. A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, advertiu nesta quinta-feira para o "grande impacto" da invasão russa sobre milhões de ucranianos e a ameaça nuclear que pesa sobre "toda a humanidade".

A ofensiva russa mudou a política de segurança na Europa e a Otan reforçou a presença na região leste da Europa. A Alemanha, com uma guinada histórica e um forte aumento do orçamento militar, anunciou uma ajuda adicional ao governo de Kiev de 2,7 mil mísseis antiaéreos.

O presidente francês Emmanuel Macron, que conversou de maneira separada nesta quinta-feira com Putin e Zelensky, disse que "a guerra na Europa não é mais algo dos livros" e que escolheu "seguir em contato" com o presidente russo. "Nós não estamos em guerra contra a Rússia", declarou Macron.

Apesar das advertências e da repressão, milhares de pessoas protestaram contra a guerra em Moscou, São Petersburgo e outras cidades russas. "Eu não podia ficar em casa. Esta guerra tem que ser interrompida", disse à AFP Anton Kislov, um estudante de 21 anos. A rádio independente russa Ekho Moskvy (Ecos de Moscou) - emissora histórica na imprensa russa - anunciou sua dissolução após sofrer pressões por sua cobertura da invasão.

 


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