China: de olho no Afeganistão após fiasco dos EUA

China: de olho no Afeganistão após fiasco dos EUA

Temores de Pequim se concentram, principalmente, na região de Xinjiang, que compartilha uma pequena parte da fronteira com o país afegão

AFP

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A China se mantém prudente com os talibãs, preocupada com o caos no Afeganistão e com as possíveis repercussões em seu território, mas deixa a porta aberta para o diálogo com o novo poder. O país asiático procura novas oportunidades após o fiasco dos Estados Unidos.

Os temores de Pequim se concentram, principalmente, na região chinesa de Xinjiang, que compartilha uma pequena parte da fronteira com o Afeganistão e é palco de vários atentados terroristas atribuídos a movimentos islâmicos e separatistas da etnia local uigur. Em resposta, Pequim instaurou, nos últimos anos, uma rigorosa vigilância policial na região. Segundo especialistas ocidentais, ao menos um milhão de uigures teriam passado por "campos de reeducação".

A tomada de poder do Talibã, que mantém relações estreitas com os militantes islamitas uigures estabelecidos no Afeganistão, preocupa muito a China. "Esperamos que os talibãs combatam todas as organizações terroristas, incluindo o Movimento Islâmico do Turquestão Oriental", declarou nesta quarta-feira (18) o porta-voz do Ministério chinês das Relações Exteriores, Zhao Lijian.

No entanto, para Raffaello Pantucci, especialista em Afeganistão na S. Rajaratnam School of International Studies da Singapura, a "China sabe que não é um governo em que pode confiar totalmente", considera.

"Um regime aberto"

No final de julho, em Tianjin (norte do país), a China realizou uma reunião com uma delegação talibã, na qual se encontrava, entre outros, o cofundador do movimento, o mulá Abdul Ghani Baradar. "São uma força política e militar crucial no Afeganistão", afirmou então o ministro chinês das Relações Exteriores, Wang Yi, que esperava que "tivessem um papel importante no processo de paz, de reconciliação e de reconstrução".

A China ainda não reconheceu oficialmente o regime talibã, à espera da composição do futuro governo. "Esperaremos que se estabeleça um regime aberto, inclusivo e amplamente representativo antes de abordarmos a questão do reconhecimento diplomático", declarou nesta quarta-feira o porta-voz chinês, Zhao Lijian.

Ao contrário de várias potências ocidentais, no entanto, a China mantém sua embaixada em Cabul aberta. Seu embaixador permanece na capital afegã, embora Pequim tenha repatriado 210 cidadãos no mês passado. Para a China, a retirada americana é uma chance de reforçar seu grande projeto de "Nova Rota da Seda", ao qual o Afeganistão se juntou em 2016.

Além disso, Pequim conseguiu em 2007 a concessão da enorme mina de cobre de Aynak (perto de Cabul), a segunda maior jazida do mundo. O Afeganistão também possui grandes reservas de lítio que poderiam interessar as empresas chinesas, já que este país é o primeiro produtor mundial de veículos elétricos.

Exigências

Antes de investir no Afeganistão, porém, a China estabelece suas exigências. "A primeira é a proteção dos investimentos e dos cidadãos chineses", afirmou em Pequim o analista político independente Hua Po. "A segunda é que (o Talibã) rompa relações com os separatistas uigures do Turquestão Oriental", acrescenta.

Em julho, o porta-voz do Talibã, Suhail Shaheen, tranquilizou Pequim sobre essas duas questões, chamando a China de "amigo do Afeganistão". Embora Pequim não espere ter nenhum papel político no Afeganistão, os diplomatas chineses não pouparam críticas aos Estados Unidos pelo caos no país da Ásia Central.

"A força e a função dos Estados Unidos é destruir, e não construir", afirmou na terça-feira uma porta-voz da diplomacia chinesa, Hua Chunying, que acusou Washington de ter deixado "uma desordem enorme" no Afeganistão.


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