Corpos de mortos por Covid-19 somem de hospitais em Guayaquil

Corpos de mortos por Covid-19 somem de hospitais em Guayaquil

Parentes lidam com a culpa por não conseguirem localizar parentes falecidos em meio a entraves burocráticos e desinformação após 'sumiço' em hospitais

R7

Cidade vive crise funerária

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A crise funerária continua em Guayaquil, onde várias famílias ainda não tinham conseguido enterrar seus parentes porque ou não localizaram o corpo ou eram impedidos pela pressão nos cemitérios e as restrições provocadas pela pandemia do novo coronavírus. No início da semana, o governo afirmou que a coleta de corpos  estava em dia e habilitou um serviço online para que os familiares pudessem saber onde seus mortos estavam, mas as filas continuam nos cemitérios, tanto para saber o paradeiro como para fazer o sepultamento.

Mais de duas semanas de procura

Alcides Gutiérrez  anda pela cidade sem saber o destino de sua tia Lourdes, falecida em 25 de março no hospital do ISEE (Instituto Equatoriano de Assistência  Social) Teodoro Maldonado Carbo. “Minha tia chegou no hospital com insuficiência respiratória em 14 de março, passam os dias e nos disseram que ela melhorando e que seria transferida para a unidade de cuidados intermediários, até que no dia 23 de março não soubemos mais dela”, conta o sobrinho.

Na tarde do dia 26, comunicaram a uma de suas filhas que ela havia morrido. Foi o começo de uma odisseia que começou com a tentativa de retirar o corpo do centro médico. “Começamos a fazer acordos com a Junta de Beneficência e nos fizeram pagar uma taxa, diziam que no atestado de óbito constava que ela havia morrido no dia 25, não no dia 26”, explicou.

Quando os parentes voltaram ao hospital com os papéis, o corpo da tia não estava mais lá e um guarda disse que havia entrado um carro do Instituto Médico Legal e levado quatro mortos ao Hospital Guasmo Sur. Entre eles, o da tia.

No entanto, naquele outro hospital não havia sinal de entrada de nenhum veículo com corpos. A incerteza aumentou ainda mais quando uma ligação assegurou que o corpo havia sido incinerado. A família sabia que o corpo não estava mais no hospital, mas que havia sido levado ao Instituto Médico Legal. O guarda chegou a oferecer que fossem buscar o corpo no necrotério, mas não puderam, pois não tinham equipamentos de proteção.

Depois de uma busca de 18 dias, o nome da tia não aparece nem na página que o governo lançou para localizar os sepultados. “Para nós sobrou a culpa de não ter feito o suficiente para encontrar o corpo”, lamenta Gutiérres.

Incerteza há 12 dias

Outro nome que também não aparece nas listas oficiais é o do pai de Liliam Larrea, que morreu em 31 de março no hospital da IESS de Los Ceibos, após quatro dias de internação. “Antes de meu pai ser internado, procurei três clínicas privadas e nenhuma quis recebê-lo porque ele tinha problemas respiratórios e precisava de oxigênio", explica a filha, que o viu o pai pela última vez no dia 30 de março.

Larrea lembra como a média de plantão disse que se preparasse porque o paciente “não passaria dessa”, ainda que tivesse entrado caminhando e consciente. "Nunca fizeram exame de Covid-19, apesar de eu ter insistido", afirma.

Desde a notificação do falecimento, Larrea começou a percorrer todos os cemitérios em busca do corpo. “Não me deram nem o atestado de óbito, que não só preciso para resolver questões burocráticas pessoais, como também tenho o direito de ter.”

Dez dias depois da morte, recebeu uma ligação do hospital avisando que o corpo estava em um contêiner do cemitério Parque da Paz. Por conta das restrições no sistema de transporte, Larrea terá que esperar até segunda-feira para poder ir de carro ao cemitério, conferir a informação.

Repercussão política

A situação levou as autoridades locais e nacionais a acusarem-se mutuamente de politizar a questão.  A prefeita da cidade, Cynthia Viteri, se referiu à questão ao responder no sábado a críticas do vice-presidente, Otto Sonnenholzner, e disse que “quando ele disser aos familiares onde estão o corpos perdidos dos seus entes queridos, ela responde”.

O responsável pela força-tarefa conjunta para a crise funerária, Jorge Wated, indicou nesta domingo (12) que a página do governo identificou 600 sepultados em dois cemitérios da cidade.  O restante dos mortos, tanto os que morreram em hospitais quanto em residências particulares, estão distribuídos "em pontos logísticos criados por conta da lotação dos necrotérios".


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